Compreender o comportamento da classe política brasileira é um hercúleo desafio, talvez missão impossível. Longe dos discursos populistas que servem apenas e tão somente para enganar a opinião pública, em época de eleições os políticos perdem o pudor e ingressam sem cerimônia na seara da incoerência.
Quando surgiu na cena política como candidato à prefeito da maior cidade brasileira, São Paulo, o gazeteiro João Agripino da Costa Doria Junior não economizou palavras para condenar o envolvimento do Partido dos Trabalhadores em rumorosos e bilionários escândalos de corrupção. Naquele momento, em 2016, Doria tinha como principal adversário o petista Fernando Haddad, que tentava a reeleição e foi derrotado no primeiro turno.
Ignorando a promessa de cumprir até o fim o mandato de prefeito da capital paulista, Doria, que dedicou-se a fazer “espuma” no período em que permaneceu à frente da administração da cidade de São Paulo, decidiu concorrer ao Palácio dos Bandeirantes. Tal decisão causou constrangimentos no núcleo duro do PSDB, que estava focado em criar bases sólidas para a candidatura de Geraldo Alckmin à Presidência da República.
Mais rica e importante unidade da federação, São Paulo não precisa de um gazeteiro profissional, mas de alguém que passe longe do histrionismo recorrente, assunto que João Doria domina com invejável maestria. Mesmo assim, para infelicidade geral da população, Doria lidera as pesquisas eleitorais.
Longe das duras críticas aos escândalos de corrupção que derrubou o PT, Doria está disposto a aceitar o apoio do PP, que já admite abandonar o governador Márcio França (PSB), que tentará a reeleição. Então vice de Alckmin, o atual governador não decola nas pesquisas de intenção de voto.
Sem o apoio do PP, a difícil situação de Márcio França não sofrerá mudanças, mas seu plano eleitoral pode fracassar por conta da perda do tempo de televisão. Pouco conhecido, França aposta em maior exposição pública para levar a candidatura adiante.
O grande problema que surge na esteira do apoio do PP à campanha de João Doria é o fardo de escândalos de corrupção que o partido traz na bagagem. Afinal, o PP ostentou durante meses a fio o status de partido com o maior número de políticos investigados no escopo do Petrolão, esquema criminoso criado pelo finado deputado federal José Janene, filiado à legenda.
A negociação com o ex-prefeito paulistano está sob a responsabilidade do diretório estadual do PP, mas não será novidade se o presidente da legenda, senador Ciro Nogueira (PI), endossar a reviravolta. E o conturbado currículo de Ciro Nogueira dispensa maiores apresentações.
O apoio do PP a Márcio França, que ainda está de pé, não é de graça. O partido recebeu a promessa do governador de, em caso de vitória nas urnas, indicar o chefe da Polícia Civil paulista. Uma promessa estranha, se considerado o fato de que nos últimos anos o PP se notabilizou por escândalos de corrupção. Resta saber o que Doria prometerá para ter o apoio do PP, que, se confirmado, será estendido à campanha presidencial de Geraldo Alckmin.