Bolsonaro transfere Coaf para o Banco Central; presidente do novo órgão é Ricardo Liáo

Editada pelo presidente Jair Bolsonaro, a Medida Provisória (MP) que transfere o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para o Banco Central foi publicada na edição desta terça-feira (20) do Diário Oficial da União (DOU).

Além da transferência, o nome do Coaf será modificado para Unidade de Inteligência Financeira (UIF). De acordo com o texto publicado no DOU, o órgão terá autonomia técnica e operacional e poderá atuar em todo o País.

Ao anunciar a medida, Bolsonaro disse que queria tirar o Coaf do “jogo político”. A MP, no entanto, não estabelece critérios para a composição da nova Unidade de Inteligência Financeira, o que permite que ocupantes de cargos comissionados possam fazer parte do órgão, ao invés de ser composto exclusivamente por servidores públicos efetivos, como é o caso do Coaf.

A MP abre a possibilidade de indicações políticas para a composição da UIF, algo impossível no Coaf, formado por servidores que integram órgãos como a Receita Federal, Banco Central, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, Polícia Federal, Ministério da Justiça, Controladoria-Geral da União, entre outros. A composição ficava a cargo do Ministério da Economia.

A UIF será formada pelo presidente do órgão e mais entre oito e 14 conselheiros, indicados pelo presidente do Banco Central.

Segundo o texto da MP, o novo conselho deliberativo deverá ser composto por “cidadãos brasileiros com reputação ilibada e reconhecidos conhecimentos”, mas não estabelece critérios para a comprovação de conhecimento. É nesse ponto que o País se deparará com mais um capítulo do “cavalo de pau” que Bolsonaro começa a dar na democracia.

Os conselheiros devem ser pessoas que saibam sobre “prevenção e combate à lavagem de dinheiro”, além de terem conhecimento sobre financiamento do terrorismo e da “proliferação de armas de destruição em massa”.


Após assumir a Presidência da República, Jair Bolsonaro, também através de MP, transferiu o Coaf do agora extinto Ministério da Fazenda para o Ministério da Justiça, como parte de uma série de medidas que visavam a reestruturação do governo.

A transferência foi rejeitada pelo Congresso, que deixou o Coaf sob a tutela do Ministério da Economia. Mesmo assim, a estrutura do Coaf permaneceu a mesma, definida pelo ministro Sérgio Moro, que vive momentos de constrangimento explícito na esteira da divulgação de mensagens trocadas com integrantes da força-tarefa da Operação Lava-Jato.

O presidente do Coaf, Roberto Leonel, indicado por Moro, viu sua permanência no cargo ameaçada após criticar uma decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, que suspendeu as investigações sobre movimentações financeiras suspeitas que se baseavam em dados compartilhados pelo Coaf sem autorização judicial, a pedido dos advogados do senador Flávio Bolsonaro.

As investigações levantavam suspeitas sobre Fabrício Queiroz, motorista de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, que movimentou de maneira atípica R$ 1,2 milhão entre 2016 e 2017. Após as críticas, aliados de Bolsonaro passaram a cobrar insistentemente a demissão de Leonel. O novo presidente do agora extinto Coaf é Ricardo Liáo.

Liáo ocupava a diretoria de Supervisão do Coaf e tem larga experiência no combate à lavagem de dinheiro. Entre 1998 e 2013, foi representante do BC no Conselho e depois também ocupou a secretaria-executiva do órgão. A escolha de Liáo era vista como solução natural para o imbróglio que se formou em torno do Coaf, além de garantir continuidade nos trabalhos do órgão.

O Congresso Nacional tem prazo de 120 dias para votar a MP, que ainda pode sofrer alterações. Se a medida não for aprovada nesse prazo, perde a validade. Ou seja, voltará a valer o cenário atual, com o Coaf.

A decisão de retirar o Coaf do Ministério da Economia é mais uma estocada em Sérgio Moro, que mantinha no órgão pessoas de sua confiança. Ao afirmar que a transferência do Coaf para o BC visa evitar que o órgão seja alcançado pelo “jogo político”, Bolsonaro dá sinais claros de que está incomodado com a atuação de Moro nos bastidores. Afinal, o ministro da Justiça, que à sombra do escândalo “Vaza-Jato” viu minguar a chance de ser indicado para o Supremo, agora flerta com a Presidência da República.