E no entanto é preciso cantar

(*) Carlos Brickmann

Estamos quase no Carnaval – e a tristeza que a gente vê não dá sinais de acabar. Um cavalheiro se defende numa CPMI insultando uma repórter de prestígio – e só agiu desse jeito porque achou fácil ofender uma mulher. E o pior vem em seguida: o presidente da República com piadinhas de duplo sentido, também atacando a repórter como mulher. Janaína Pascoal, que é do partido de Bolsonaro e deputada mais votada do país, acusou-o de “inegável grosseria”. Janaína foi uma das proponentes do impeachment de Dilma. Outro, o jurista Miguel Reale Jr., foi mais fundo: acha que, por ferir o decoro, Bolsonaro já está sujeito a impeachment. O tal River do Rio ofender, Sua Excelência brincar com o tema, e há ainda pior: a militância bolsonarista mobilizada para também ofender a repórter. Como diz Janaína, bolsonaristas são petistas com sinal trocado. Lula preso, Lula livre, e quem pacifica o país?

Na clássica Marcha da Quarta-Feira de Cinzas, Vinícius de Moraes e Carlos Lyra lembram que é preciso cantar – e não se limitar a xingar – para alegrar a cidade. Com gente “que nem se sorri, se beija ou se abraça”, como se vai fazer um país? Um presidente que se propõe a ser “conservador nos costumes” se dá ao desfrute de ofender mulheres, só porque mulheres são? E, nos intervalos, fazer brincadeiras de cunho sexual com pessoas orientais?

Lula também gosta dessas brincadeiras – como a que fez com sua mais fiel seguidora, Clara Ant. Decoro, senhores! Há crianças e senhoras na sala.

Amigas, amigas

Janaína, advogada que não aceita essas brincadeiras, disse que não é bolsonarista: aliou-se a Bolsonaro por achar que era quem tinha chance de derrotar o lulismo. Joga duro: disse a Bolsonaro, na convenção do PSL, que era fiel ao Brasil, não a ele, e que em sua opinião os bolsonaristas não passavam de petistas ao contrário. “Disse isso há um tempão”. E disse-o a Bolsonaro na convenção, olhos nos olhos. “Jamais menti ao então candidato e agora ao presidente”. O perigo é que ela age quando acha que deve.

Moro, na filosofia

Mas, se o clima não é de confraternização, de Carnaval, há frases que, nos velhos filmes carnavalescos da Atlântida, se encaixariam com perfeição. Em Brasília, no dia 11, a deputada federal Carla Zambelli se casou com o coronel Antônio Aginaldo de Oliveira, diretor da Força Nacional de Segurança.

Sérgio Moro a saudou: disse que ela, mesmo sem ter feito curso de PM, mereceria ostentar um caveirão – aquele símbolo do Bope, uma caveira com uma faca enterrada no cocoruto. Carla Zambelli retribuiu a gentileza: dançou a valsa (La Vie en Rose) com Moro, enquanto o noivo dançava com a esposa de Moro, Rosângela.

Um caveirão, quem diria, dando resultado tão meigo.

Deixa a moça trabalhar

É difícil encontrar gente mais chata que a turma do politicamente correto: agora, valem-se da Internet para atacar a atriz Alessandra Negrini por estar fantasiada de índia no bloco em que desfilou em São Paulo. Acusam-na, veja, de “apropriação cultural”. Odeiam aquilo que sempre marcou o Carnaval: a liberdade de pular com a fantasia que lhe der vontade. No caso, a coisa ainda é mais engraçada: ela visitou há pouco uma aldeia em Caraíva, Bahia, e quis homenagear os pataxós da aldeia.

Para a turma do politicamente correto, a Terra pode ser redonda ou plana, tanto faz: eles querem é que seja bem chata.

BNDES, fica assim?

O presidente Bolsonaro, durante toda sua campanha, prometeu a abertura da “caixa preta” do BNDES. Agora é presidente há um ano… e o BNDES surgiu com uma auditoria externa que analisou oito dos negócios do banco e concluiu que neles não há caixa preta. Claro que o BNDES não realizou apenas oito negócios nos 13 e poucos anos dos governos Lula e Dilma, os alvos preferenciais de Bolsonaro; nem isso significa que, nos governos mais antigos, tudo tenha ocorrido sem qualquer irregularidade. Três delas estão documentadíssimas no livro Caixa Preta do BNDES, de Cláudio Tognolli e Bernardino Coelho.

São três casos exemplares: aplicações financeiras em que empresas amigas teriam se beneficiado, em troca daquelas ideias de construir “campeões nacionais”; e um bom exemplo, documentadinho, em que o BNDES é acionista de uma empresa privada que se destinava a ser a maior fabricante de pás para energia eólica do mundo, e à medida que a firma perdia posição a parcela de capital do BNDES aumenta e a dos sócios privados se reduz. A empresa fechou, e quem é seu acionista majoritário?

Boa notícia

O 6º Batalhão de Engenharia de Construção constrói estrada de 7 km na Amazônia, num pântano pantanoso, mole e de alta umidade, utilizando uma novidade que buscou em Israel: coloca pentágonos de material especial no chão, enchendo-os em seguida com areia. Depois completa-se a estrada. No local, que liga o 4º Pelotão Especial de Fronteiras e a pista de pouso, a 7 km, o tráfego será possível durante todo o ano. A duração prevista é de dez anos.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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