Interferência na PF: caso siga o que está na lei, Augusto Aras não tem como deixar de denunciar Bolsonaro

 
Após a exibição, na terça-feira (12), do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, na sede do Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal, às partes envolvidas no inquérito que apura as graves acusações de Sérgio Moro contra o presidente da República, o Palácio do Planalto deu início a uma guerra de versões. O objetivo dessa manobra oficial é fazer com que o bolsonarismo pressione o procurador-geral da República, Augusto Aras, a quem cabe decidir se oferece ou não denúncia contra Jair Bolsonaro, acusado por Moro de tentar interferir no comando da PF.

Enquanto Bolsonaro e assessores palacianos se esforçam para minimizar o conteúdo do vídeo sobre a fatídica reunião, investigadores que participaram da exibição garante que a gravação é “devastadora” e “muito ruim” para o presidente. Para piorar, os generais Augusto Heleno e Walter Braga Netto, em seus depoimentos à PF, deixaram Bolsonaro em má situação, pois acabaram contradizendo o presidente da República.

Até o momento o vídeo permanece sob segredo de Justiça, dependendo do ministro Celso de Mello, do STF, a liberação da íntegra ou de parte da gravação, mas por tudo o que foi vazado até o momento é possível afirmar, como já fizemos na edição de terça-feira, que Aras terá muita dificuldade para não denunciar Bolsonaro.

Mesmo que tenha sinalizado alguma disposição para o leguleio no caso em questão, Augusto Aras, que já enfrenta a pressão dos integrantes da cúpula da PGR, terá, na melhor das hipóteses, de concordar com o fato de que o presidente da República incorreu em pelo menos dois crimes previstos no Código Penal: “advocacia administrativa” e “coação no curso do processo”.

Advocacia administrativa

Art. 321 – Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário.”

Coação no curso do processo

Art. 344 – Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral.”

 
Fechar os olhos para ambos os crimes acima mencionados será um descalabro de Aras, que já começa a esticar o olhar na direção do STF. Em novembro próximo, o Supremo abrirá uma vaga em decorrência da aposentadoria compulsória do ministro Celso de Mello, relator do inquérito em questão.

Caso decida não denunciar o presidente da República, Augusto Aras deve se preparar para conviver com a pecha de “engavetador-geral”, já que somente o compadrio será capaz de explicar um eventual atentado contra o Código Penal.

Contudo, se Augusto Aras optar por denunciar Bolsonaro, uma eventual indicação ao STF irá pelos ares. Ato contínuo, a denúncia, por crime comum, não de responsabilidade, precisará ser submetida ao plenário da Câmara dos Deputados. Para que o STF tenha autorização para processar e julgar o presidente são necessários 342 votos a favor. Como Bolsonaro vem se aproximando cada vez mais do sempre ávido “Centrão”, não é garantido que a Câmara dê essa autorização.

Porém, como Jair Bolsonaro é tido no meio político como pouco confiável, pois não mantém o que fala, o “Centrão” começa a ficar com o pé atrás em relação aos cargos já cobrados e ainda não recebidos. Tomando por base que o presidente da República é uma pessoa que muda de opinião facilmente e não pensa duas vezes antes de jogar aliados na fogueira para salvar a própria pele, os “centristas” não estão fechados em relação ao incondicional apoio ao Palácio do Planalto.

No caso de a Câmara dos Deputados autorizar o Supremo a seguir com o processo e o julgamento, Bolsonaro será afastado do cargo por até 180 dias, período em que a Presidência da República ficará sob a responsabilidade do vice Hamilton Mourão.