Saída de Dallagnol da Lava-Jato é “cereja” de indigesto bolo político fermentado na “cozinha” do MPF

 
O anúncio de que o procurador da República Deltan Dallagnol está deixando o comando da força-tarefa da Operação Lava-Jato em Curitiba acontece em meio à queda de braços entre o grupo de representantes do MPF que atuam na capital paranaense e a Procuradoria-Geral da República (PGR). Além disso, Dallagnol viu aumentar o processo de desgaste que lhe foi imposto na esteira de um histrionismo desnecessário e que muitas vezes comprometeu investigações e denúncias contra corruptos.

O MPF informou por meio de nota que Deltan Dallagnol deixa a coordenação da Lava-Jato em Curitiba para se dedicar a problemas de saúde no âmbito familiar. Se de fato essa é a razão da saída do procurador amante do “Power Point”, que tudo se resolva com brevidade e sucesso.

Apesar dos nossos votos, entendemos que a saída de Dallagnol é a “cereja” de um bolo elaborado, entre “tapas e beijos”, na “cozinha” do Ministério Público Federal e fermentado após a decisão dos procuradores curitibanos de não compartilhar com a PGR dados sobre a Lava-Jato. O enfrentamento entre as partes ganhou contornos mais evidentes quando a subprocuradora-geral Lindôra Araújo, em viagem a Curitiba, tentou acessar dados da Operação Lava-Jato. A partir de então, a temperatura no MPF subiu, como se a Lava-Jato fosse um órgão acima da PGR.

Negar acesso aos dados da Lava-Jato sob a alegação de que o compartilhamento seria uma devassa e colocaria em risco a operação é discurso de encomenda de quem defende o “lavajatismo” como a derradeira solução para os problemas existentes na política nacional. A exemplo do que sempre afirma o UCHO.INFO, a Lava-Jato foi instituída para investigar casos de corrupção envolvendo a Petrobras e outros órgãos em situações correlatas, não para ser a palmatória moralizadora do País.

Prova maior de que a Lava-Jato foi transformada em central dos casos de corrupção investigados no País é o “imbroglio” envolvendo o governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), cujas suspeitas de fraude em licitações da saúde foram apuradas por integrantes da operação na capital fluminense. Não há qualquer relação entre o caso que levou ao afastamento de Witzel e o esquema criminoso que derreteu os cofres da Petrobras. Por isso é possível falar em “lavajatismo”.

Ademais, se dados da Lava-Jato não poderiam ser compartilhados com a PGR como forma de evitar uma “devassa”, como alegou a força-tarefa de Curitiba, alguém precisa explicar os motivos que levaram a subprocuradora Lindôra Araújo a assinar e encaminhar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) petição do MPF que resultou no afastamento do governador fluminense.

Esse repentino armistício entre as forças-tarefas estaduais da Lava-Jato e a PGR causa estranheza, mas pode ser explicado pela possibilidade de a operação, que foi além dos objetivos iniciais, não ser renovada por mais um ano a partir do próximo dia 10 de setembro.

 
Além desse detalhe, há nos bastidores um amontoado de interesses políticos que exige explicação. Procurador-geral da República, Augusto Aras tem agido em algumas ocasiões para atender aos interesses do presidente Jair Bolsonaro, postura questionável que mereceu diversas críticas deste portal. Esse movimento de Aras se deve ao seu inequívoco interesse em ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF), mais precisamente a do ministro Celso de Mello, que se aposentará compulsoriamente em 1º de novembro.

Caso Aras seja indicado ao Supremo, a subprocuradora Lindôra Araújo assumirá o comando da PGR até o final do biênio, em setembro de 2020, com direito a ser reconduzida ao cargo pelo presidente da República, caso concorde em rezar pela cartilha do Palácio do Planalto.

Tomando por base o fato de que Wilson Witzel, por inexperiência política, decidiu comprar briga com Bolsonaro, nada melhor do que requerer o afastamento do governador do Rio de Janeiro para fazer um agrado ao presidente da República, que vem trabalhando para esparramar seus tentáculos nos domínios fluminenses e blindar a família contra as investigações de escândalos dos mais diversos.

Esse quebra-cabeças jogado às pressas sobre a mesa poderá garantir à Lava-Jato mais um ano de vigência, como solicitou a força-tarefa de Curitiba, ao mesmo tempo em que sela as pazes entre Dallagnol e Aras, que nesta terça-feira afirmou nada ter contra o histriônico procurador.

Nesse enxadrismo político que emoldura a saída de cena de Deltan Dallagnol há alguns pontos a serem esclarecidos. Se o capítulo fluminense da Lava-Jato identificou que o esquema de corrupção envolvendo Witzel açambarcou também o vice-governador e governador em exercício Cláudio Castro e o presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), André Ceciliano (PT), causa espécie o fato de Lindôra Araújo não ter requerido o afastamento de ambos, que permanecendo nos respectivos cargos, podem comprometer as investigações. Isso posto, não é errado afirmar que está em marcha uma acomodação política, ao arrepio da lei, para não contrariar os inquilinos do Palácio do Planalto.

Resumindo, Dallagnol deixa a força-tarefa na esteira de evidente desgaste, que começou com a divulgação de diálogos nada republicanos pelo site The Intercepet, e de ruidosas reações nas coxias do MPF, além do público enfrentamento com Aras.

Sabem os leitores que o UCHO.INFO não tem político de estimação, assim como não tem procurador-geral de estimação, mas Augusto Aras, detentor da principal caneta da PGR, poderia, como ainda pode, decidir pela não prorrogação da Lava-Jato. Em outras palavras, a melhor saída foi sacrificar o inconveniente. A partir de agora, Deltan Dallagnol encontrará tempo para reavaliar os próprios atos.

Se você chegou até aqui é porque tem interesse em jornalismo profissional, responsável e independente. Assim é o jornalismo do UCHO.INFO, que nos últimos 20 anos teve participação importante em momentos decisivos do País. Não temos preferência política ou partidária, apenas um compromisso inviolável com a ética e a verdade dos fatos. Nossas análises políticas, que compõem as matérias jornalísticas, são balizadas e certeiras. Isso é fruto da experiência de décadas do nosso editor em jornalismo político e investigativo. Além disso, nosso time de articulistas é de primeiríssima qualidade. Para seguir adiante e continuar defendendo a democracia, os direitos do cidadão e ajudando o Brasil a mudar, o UCHO.INFO precisa da sua contribuição mensal. Desse modo conseguiremos manter a independência e melhorar cada vez mais a qualidade de um jornalismo que conquistou a confiança e o respeito de muitos. Clique e contribua agora através do PayPal. É rápido e seguro! Nós, do UCHO.INFO, agradecemos por seu apoio.