“André do Rap” é problema do Judiciário, não da lei, diz o presidente da Câmara dos Deputados

 
A decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), que colocou em liberdade o narcotraficante André Oliveira Macedo, o “André do Rap”, um dos chefes da organização criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), continua rendendo declarações oportunistas e entendimentos absurdos da lei processual penal.

Como citou o UCHO.INFO em matéria anterior, a responsabilidade por esse “imbróglio” é do Congresso Nacional, que elaborou e aprovou projeto de lei a partir do “pacote anticrime”, enviado ao Parlamento pelo então ministro Sérgio Moro (Justiça), e do presidente da República, Jair Bolsonaro que na vetou trechos da respectiva lei, apesar de diversos pedidos de veto.

Nesta terça-feira (13), em entrevista à rádio CNN, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que o Congresso não deve discutir a revogação do artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP), que fixa prazo de 90 dias para revisão de prisão preventiva. Foi com base nesse artigo que o ministro do STF decidiu pela libertação de “André do Rap”.

Para Maia, a soltura do narcotraficante, não é um problema da lei, mas do Judiciário e do Ministério Público. “Não acho que a lei seja um problema, muito pelo contrário. O problema é a decisão. Não dá para transferir à lei um problema que é do Judiciário e do Ministério”, declarou. “A lei já existia, todos sabiam, e o próprio Ministério Público ontem em uma nota disse que pediu a revisão”, completou o parlamentar.

O presidente da Câmara afirmou que cabe ao Judiciário avaliar e refletir sobre suas decisões. “Tirando este caso, que é muito ruim e gera muita comoção da sociedade, tem milhares de casos de pessoas que ficam presas anos até, sem nenhum tipo de análise, principalmente as pessoas mais pobres que não têm advogado”, contrapôs, disse Maia.

Em ano eleitoral, esperar que Rodrigo Maia reconheça o erro do Congresso na elaboração e aprovação do citado projeto de lei é querer ser enganado. Ao Judiciário cabe cumprir as leis aprovadas pelo Congresso e sancionadas pelo presidente da República, que no caso em questão falhou, mesmo sendo alertado por alguns assessores.

 

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O artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP), inserido na esteira da aprovação do “pacote anticrime”, é claro ao determinar: “Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.”

Qualquer calouro de Direito sabe que decisão de ofício, mesmo que com exigência de fundamentação, independe de requerimentos acessórios. Ou seja, a primeira instância da Justiça, em especial a Vara de Execução Penal, falhou ao não cumprir o que determina o artigo do CPP em pauta. Além disso, o Ministério Público errou enormemente ao não se manifestar no âmbito da eventual manutenção da pena de “André do Rap”, ciente de se trata de um criminoso de alta periculosidade e com recursos financeiros suficientes para empreender fuga. Em suma, o juiz da vara de origem e o MP dormiram no ponto, mas agora fazem-se de rogados na tentativa de escapar à responsabilidade.

Para piorar um cenário que revela a deterioração da máquina estatal, o ministro Marco Aurélio Mello tomou decisão idêntica em aproximadamente 80 outros casos, aplicando a mesma tese que embasou a soltura de André do Rap, sem qualquer tipo de gritaria por parte da sociedade, de integrantes do Ministério Público e de representantes da classe política.

No contraponto, causou espécie a decisão do presidente do STF, ministro Luiz Fux, que revogou a decisão do colega de Corte, desrespeitando de forma flagrante o Regimento Interno do tribunal. Em seu artigo 13, o Regimento Interno do Supremo não concede ao presidente da Corte poder para “atravessar” decisões liminares em habeas corpus, amparadas pela tecnicidade jurídica. Foi o que o ministro Marco Aurélio fez no caso de André do Rap e nas outras dezenas de decisões semelhantes.

Uma eventual suspensão de liminar só é eventualmente aceita se a lei que serviu de base mostrar-se inconstitucional, mas não é o caso. Sendo assim, se a defesa do narcotraficante recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e teve negado pedido de habeas corpus, com liminar, o passo seguinte é, como de fato foi, recorrer ao Supremo. Não obstante, vale ressaltar que no escopo do Estado Democrático de Direito não há disposição que proíba a interpretação da lei “ao pé da letra”.

O Brasil assistiu nos últimos dias – e continua assistindo – a um espetáculo pífio envolvendo o STF, onde o presidente da Corte, com o intuito de jogar para a opinai pública, desrespeita o Regimento Interno e atravessa decisão liminar em habeas corpus. Tempos estranhos!

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