Vice-presidente da República, o general da reserva Antônio Hamilton Martins Mourão ressuscitou o estilo “morde e assopra”, que entrou em cena novamente na esteira da polêmica envolvendo a vacina chinesa contra a Covid-19.
Depois de afirmar, em entrevista à revista Veja, que “é lógico” que o Brasil comprará a Coronavac, imunizante produzido pela farmacêutica chinesa Sinovac, apesar de Bolsonaro já ter descartado em diversas ocasiões essa possibilidade, a temperatura palaciana foi às alturas. Isso porque no desenvolvimento da vacina a Sinovac é parceira do Instituto Butantan, órgão vinculado ao governo de São Paulo.
Mourão disse nesta terça-feira (3) não existir qualquer atrito entre ele e o presidente da República por causa do imbróglio que surgiu no entorno da Coronavac. “Aqui não há briga. Existem opiniões que ora coincidem e ora não, mas quem decide é o presidente e ele foi eleito para isso”, disse o vice-presidente quando questionado por jornalistas.
“Não conversei com o presidente (sobre o assunto), o que eu quis colocar ali é que é o seguinte, a vacina é uma vacina brasileira. Qualquer vacina vai ser produzida aqui no Brasil e, óbvio, o presidente vai tomar a decisão que for melhor para o conjunto da população brasileira, que é essa a responsabilidade dele”, afirmou Mourão.
Desde a campanha de 2018, Mourão vem adotando esse estilo que mescla avanços e recuos, mas agora a questão que o levou a esse confronto é diferente e passa obrigatoriamente pelas Forças Armadas, mais precisamente pela alta cúpula do Exército.
Considerando que desmoralizar e desacreditar militares publicamente tornou-se o passatempo predileto de Jair Bolsonaro, assim como endossar os que fazem o mesmo, o generalato palaciano decidiu reagir à altura, em clara demonstração de que a relação entre a ala ideológica do governo e os militares caminha na direção de um perigoso embate.
A queda de braços entre os graduados oficiais do Exército e Bolsonaro tende a aumentar, pois o presidente não se movimenta para buscar um cenário de consenso que garanta ao governo doses rasas de tranquilidade para seguir começar a solucionar o amontoado de problemas que tira o sono dos cidadãos. O mais recente exemplo da pasmaceira de Bolsonaro diante do ataque da ala ideológica aos militares foi o ataque do ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) ao chefe da Secretaria de Governo da Presidência, ministro Luiz Eduardo Ramos, também general da reserva.
Bolsonaro limitou-se a criar uma cortina de fumaça, dando a entender que o assunto estava solucionado, quando na verdade essa não é a realidade dos fatos. Ademais, a fala de Mourão sobre a vacina chinesa é prova maior da continuidade do clima de tensão que domina a sede do governo.
Se no âmbito do “estica e puxa” que tomou conta do governo há alguém com chances de sair prejudicado, esse é Jair Bolsonaro. Até porque, Mourão é muito mais preparado que o presidente da República e foi transformado pelos militares como líder da mais nova frente de oposição ao presidente.
Os militares, que discordam de muitas das decisões de Bolsonaro, sabem que um eventual processo de impeachment contra o presidente da República abrirá caminho para Mourão assumir o posto. Esse quadro explica a disposição da caserna de não distensionar o cabo de guerra que subiu a rampa do Palácio do Planalto, pelo contrário.
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