Muito trovão, pouca chuva

(*) Carlos Brickmann

Nestas eleições, uma antiga definição de Republicanos e Democratas (de quem será? Não consegui localizá-la) deixa de ter valor: a de que os dois partidos são como garrafas iguais, com rótulos diferentes, ambas vazias. Trump é diferente dos democratas (e, embora hoje os lidere, também de boa parte dos republicanos). Trump governa por conflito, adora ter inimigos, não sonha com união nacional. Mas, ganhe Biden ou Trump, não haverá grandes mudanças mundiais. Há pesos e contrapesos no governo americano. Como um enorme porta-aviões atômico, o país é grande demais para manobrar bruscamente. Cada presidente influi na rota, mas só um pouquinho.

Trump fez muito barulho, confrontou a China, ameaçou a Coreia do Norte com armas atômicas, prometeu um muro entre EUA e México, a ser pago pelo México, negou a pandemia e pregou a cloroquina. Mas, quando se viu doente, não falou mais em cloroquina, e mandou milhões de comprimidos de presente para quem acreditava nela. Negou a pandemia, mas fechou as fronteiras dos EUA. Fez um pedaço do muro e convenceu o México a bloquear a passagem de centro-americanos. Ameaçou a Coreia do Norte, mas foi o primeiro presidente americano a pisar lá. Movendo todo o aparato militar, está terminando seu mandato sem guerras. Biden sempre foi mais guerreiro do que ele. Enfim, o eleitor americano já decidiu e falta apenas saber quem é o eleito.

Seja qual for, fiquemos frios: a vida continua.

E?

Trump foi um bom presidente? Na minha opinião (de longe, sem contato com a realidade americana), não. Mesmo medidas corretas como a de fechar fronteiras, da maneira como foram tomadas, apresentaram amplo grau de ineficiência. Estimular movimentos alucinados como os que acreditam numa conspiração internacional de banqueiros comunistas, com apoio do papa e de uma rede mundial de pedófilos satanistas, visando criar um governo único para todos os países, com apoio chinês e sob o comando direto do Camarada Belzebu, definitivamente não é coisa que se faça. Ameaça desafiar a lei se perder. Mas sua eventual reeleição não provocará nenhum cataclisma.

O Brasil?

Para o Brasil, a eleição de Joe Biden não deverá criar tantos problemas, apesar de Bolsonaro ter declarado apoio à reeleição de Trump (o que deve ter provocado uma sacudida nas Bolsas, de tanto rir), Biden é um político profissional, hábil, que costuma (em geral, com êxito) criar consensos. Sabe que um país não tem amigos nem inimigos, tem interesses. É interesse americano ter boas relações com seu maior concorrente na produção de alimentos. Haverá, sem dúvida, jogo para a torcida, sobre o meio-ambiente –Pantanal e Amazônia, aquecimento global, Acordo de Paris sobre redução de carbono na atmosfera. O Brasil pode lucrar com isso: venda de créditos de carbono, exportações de produtos sustentáveis, venda de etanol para substituir em parte o petróleo. E, especialmente, preservar a “rainforest” tem um custo: a não-exploração de jazidas minerais (inclusive uma grande, de bauxita, dos noruegueses).

O Brasil pode faturar para não tocar nesses recursos. Biden falou em US$ 20 bilhões. Até onde pode chegar? E haverá um extraordinário ganho para o Brasil: com Biden, sem Trump, ninguém mais pensará no Bananinha como embaixador do Brasil em Washington.

A nossa política

O vice-presidente general Mourão fez seguidas declarações desmentindo o presidente Bolsonaro. Primeiro, disse que o Governo iria comprar a vacina Coronavac, desenvolvida pelos chineses da Sinovac e o Instituto Butantan, o que Bolsonaro tinha descartado. Depois, ao criticar a decisão de fazer despesas adiáveis, foi atacado por Bolsonaro, que o acusou de desconhecer a Constituição. Agora, embora tenha declarado que seu preferido nos EUA é Trump, disse que se Biden ganhar, Brasília e Washington continuarão a se entender do mesmo jeito.

Anote: talvez esteja em gestação uma nova crise.

Boa notícia

Num ano ruim para o investimento estrangeiro, em que R$ 84,5 bilhões deixaram o Brasil, algo de bom: outubro foi positivo em movimentação de investimentos, com entrada líquida de R$ 3,1 bilhões. Operadores dizem que, com a desvalorização do real, os papéis brasileiros ficaram baratos. Mas ninguém garante que essa entrada de dinheiro tenha tendência a se repetir.

Explicando as novas notas

Terminado o temporal do senador do cofrinho, torna-se possível mostrar detalhes da nova nota de R$ 200,00, a do lobo-guará. A nota tem foco na sensibilidade: marcas táteis no canto inferior direito, tamanho que facilita a identificação por quem tenha problemas visuais. Segundo a especialista Mariana Chaimovich, era preciso criar a nova nota, por causa da pandemia: ficou mais fácil fazer com que o dinheiro chegasse a todos, em todo o país.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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