Democretinice

(*) Gisele Leite

A América Latina está experimentando uma tendência altamente perceptível de enfraquecimento da democracia e, consequentemente, para o fortalecimento dos traços autoritários nos governos.

Mas, de forma alguma se pode dizer que as instituições democráticas foram minadas apenas pelo governantes. Em todo o espectro de atores sociais e os políticos atendem a inclinações autoritárias e comportamentos não democráticos. Em muitos lugares existem forças anti-establishment em marcha.

O futuro será a América Latina caracterizada por democracias sem Democratas? Ou os “novos sujeitos sociais” desenharão um melhor curso para a democracia? Os governos de esquerda enfrentam a complexa tarefa de combater o fortalecimento do autoritarismo e da anti-política aumentando as chances de abstenção.

Conflitos internos, instabilidade político-econômica e, ainda, autoritarismo crescente caracterizam a situação em muitos países latino-americanos. Pouco mais de duas décadas, após o início da onda de democratização no sul do continente, um número considerável de democracias da região está em franca dificuldade.

Afinal, não podem resolver seus desacordos internos porque os cidadãos estão cada vez menos dispostos a se resignar à má gestão, à corrupção, à violação das normas democráticas, à crescente desigualdade na distribuição e às tensões excessivas de uma crise econômica permanente. Em muitos lugares, há clamor por soluções autocráticas de força, sendo ouvido novamente, brados de ordem à força e, ainda, observadores alertam contra o perigo de uma “regressão autoritária”.

O fato é que até, muito recentemente, a glorificada “resiliência e resistência à crise” das democracias latino-americanas não duraram muito: a democracia na região foi derrotada, suas instituições centrais estão erodidas e, muitas vezes, elas servem apenas como meras fachadas.

Em todos os lugares, o Executivo expande seu poder e busca reduzir a influência do Parlamento, eliminar controles independentes e, portanto, escapar totalmente da supervisão da Justiça.

Para esses fins, a posição tradicionalmente forte do Presidente nas constituições latino-americanas é extremamente útil. Em casos extremos, os regimes personalistas são estabelecidos com estruturas verticais de demanda, onde grupos de apoiadores do Governo se ajudam a escalar posições até usurparem os controles de todo o tecido institucional e, especialmente, das instituições estratégicas de poder como o Exército, a Polícia e as autoridades eleitorais.

Além disso, alguns governantes latino-americanos não consideram mais normal se aposentar quando seu mandato termina. Prorrogam-se no poder, explicitamente e sem o menor pudor.

Nos últimos anos, vários líderes em exercício conseguiram revogar as proibições constitucionais que impediam sua reeleição. Um deputado das fileiras do presidente venezuelano Hugo Chávez chegou a pedir a presidência vitalícia de seu chefe e que seja protegida pela Constituição. Alberto Fujimori tentou promover um projeto semelhante quando era presidente do Peru.

Os fenômenos mencionados acentuam uma tendência bastante perceptível de enfraquecimento da democracia e, consequentemente, de fortalecimento dos traços autoritários do sistema político na América Latina. Os protótipos das novas formas de governo, por vezes descritos como “híbridos”, vêm da década de 90 e, ainda estão associados aos nomes de Fujimori e Menem.

O peruano Alberto Fujimori, presidente de 1990 a 2000, respondeu por um autoritarismo personalista legitimado por meio de eleições; o argentino Carlos Saúl Menem, presidente de 1989 a 1999, pela colonização das instituições através do Executivo. Ambos os modelos estão encontrando cada vez mais imitadores e guarida, seja de forma secreta ou abertamente, entre o México, a América Central e a Terra do Fogo.

Em nossa aldeia tupiniquim, o mesmo se sucede, inclusive tendo em vista a intenção de reeleição presidencial que já propiciou abertamente a advertência de possível golpe de Estado, pois não aceita a eventual rejeição nas urnas.

Não há propriamente democracia, há a democretinice.

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

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