(*) Waldir Maranhão
Como se a democracia brasileira fosse a Roma antiga, o presidente Jair Bolsonaro, no afã de levar adiante seu projeto totalitarista, comporta-se como o desvairado imperador romano Nero, ameaçando incendiar o ambiente democrático e desafiando de maneira teimosa as instituições e os Poderes constituídos.
Sempre carregando no bolso do paletó um discurso que atenta contra o Estado de Direito, Bolsonaro não se incomoda com promessas tão absurdas quanto relâmpagos, pois essas são disparadas para fazer a alegria de seus apoiadores – que de maneira ininterrupta flertam com o retrocesso e a supressão de liberdades – e para jogar uma cortina de fumaça sobre os escândalos que envolvem a própria família.
A mais recente e fracassada investida do presidente da República contra a democracia brasileira se deu na demissão do agora ex-ministro da Defesa, general da reserva Fernando Azevedo e Silva, e a renúncia dos três comandantes das Forças Armadas. O ato de insensatez de Bolsonaro surgiu em cena porque Azevedo e Silva não concordou com o uso político das forças militares, que na verdade são instituições do Estado, não de governo.
Ao presidente da República cabe a prerrogativa de fazer mudanças na estrutura do governo, mas não se pode aceitar que isso ocorra debaixo de um plano golpista, rascunhado ao longo dos últimos anos sem que a população percebesse a extensão do perigo.
É verdade que a alternativa buscada por Bolsonaro, a decretação do Estado de defesa, depende de autorização expressa do Congresso Nacional, porém é prudente não colocar a democracia brasileira debaixo da lâmina da guilhotina.
Diante de um cenário preocupante e perigoso, chama a atenção o fato de ao menos dois conhecidos políticos não terem se manifestado até então. Presidente nacional do Progressistas, o senador Ciro Nogueira (PI) insiste em estranho silêncio, mesmo com as recentes trapalhadas de Bolsonaro. O mínimo que se poderia esperar de um senador da República é um discurso duro e contundente contra as incursões de Bolsonaro, que não desiste de suas constantes ameaças.
Comandante de uma legenda que lidera o sempre ávido e inescrupuloso Centrão, Ciro Nogueira não permaneceria em silêncio caso não existisse por parte do Palácio do Planalto uma polpuda contrapartida. É importante lembrar ao leitor que presidencialismo de coalização é diferente de balcão de negócios, onde um projeto golpista consegue cooptar a submissão de aluguel de quem deveria se posicionar a favor da nação e dos cidadãos.
Em outro ponto desse emaranhado marcado pelo despotismo de Bolsonaro, outro Ciro não se manifestou até agora. Falo de Ciro Gomes, ex-governador do Ceará, cuja mudez causa enorme estranheza.
Crítico ácido e voraz do presidente da República, Ciro Gomes até o momento não soltou a voz, como já fez em outras ocasiões, para protestar contra a mais recente ameaça à democracia e às liberdades. Suficiente seria se o ex-governador cearense resgatasse a artilharia verbal usada na campanha presidencial de 2018, quando disputou a Presidência da República com Bolsonaro e demais candidatos.
Filiado atualmente ao PDT, partido pelo qual espera disputar em 2022 o direito de subir a rampa do Palácio do Planalto como inquilino da vez, Ciro Gomes é advogado de formação e sabe o que representa o desrespeito à lei e a violação do ambiente democrático.
É verdade que Ciro Gomes não carrega em sua essência o DNA da democracia, afinal seus rompantes falam por si, mas por ter convivido durante quatro anos (2007-2011) com Bolsonaro, enquanto deputado federal, é razão maior para um pronunciamento firme e direto contra mais uma aberração do chefe do Executivo.
A sociedade precisa compreender que o Centrão é o pilar de sustentação de um governo perdido e mal-intencionado e de um presidente que insiste no retrocesso.
Além disso, como alerta para os Ciros, recorro a uma célebre frase do cientista Albert Einstein: “O mundo é um lugar perigoso de se viver, não por causa daqueles que fazem o mal, mas sim por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer”.
Reza o dito popular que “é melhor um pássaro na mão do que dois a voar”, mas nesse caso o brasileiro está de mãos abanando, pois ambos os Ciros, o Nogueira e o Gomes, optaram por voos solos e calados. Em outras palavras, quem tem dois Ciros, como os citados, tem nenhum.
É do escritor e filósofo francês Joseph-Marie de Maistre (1753-1821) a frase “toda nação tem o governo que merece”, mas o brasileiro, além de não merecer o governo que aí está, não pode silenciar diante de um abilolado que está a agir como a versão moderna e tropicalizada do incendiário Nero. Democracia é bom e todos nós gostamos!
(*) Waldir Maranhão – médico veterinário e ex-reitor da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), onde lecionou durante anos, foi deputado federal, 1º vice-presidente e presidente da Câmara dos Deputados
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