Encontro entre Lula e FHC causou ruídos políticos, mas foi em nome da preservação da democracia

 
(*) Waldir Maranhão

O recente encontro entre os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso agitou o universo político e provocou conjecturas das mais diversas. Para muitos brasileiros que não se interessam verdadeiramente pela política, FHC errou ao afirmar que em eventual segundo turno, em 2022, votará em Lula caso o petista chegue à reta final da corrida ao Palácio do Planalto.

Teorias conspiratórias de todos os matizes surgiram para desqualificar o encontro e a declaração de FHC, mas é preciso reconhecer que o Brasil não pode continuar em um movimento político marcado pelo retrocesso, ameaças à democracia e flertes com o autoritarismo.

Desde a primeira disputa entre PT e PSDB pela Presidência da República, ambas as legendas trocam farpas políticas, mas isso não significa que Lula e FHC devam ser inimigos. Aliás, em tempos remotos os dois cerraram fileiras contra o autoritarismo, o que voltam a fazer agora.

O objetivo político do momento é a criação de uma frente pluripartidária capaz de derrotar Jair Bolsonaro, que com a queda nos índices de popularidade e aprovação redobrou o radicalismo com o intuito de agradar aos seus fiéis e descontrolados apoiadores.

Como já mencionei em artigo anterior, há décadas ouço que o Brasil é o país do futuro, sem que até agora esse futuro tenha se apresentado aos brasileiros. Na verdade, o Brasil caminha a passos largos na direção do atraso, algo que precisa ser contido com a máxima urgência. Do contrário, os danos serão quase irreversíveis ou demandarão muito tempo para serem revertidos.

Quando o assunto é discurso político, muito se fala em patriotismo e defesa dos interesses e das necessidades do cidadão, mas na prática isso dificilmente sai do campo das promessas.

Em 2018, quando o movimento antipetista cresceu rapidamente na carona da Operação Lava-Jato, Jair Bolsonaro apresentou-se ao eleitorado como a única solução para os muitos problemas nacionais e versão tropical de Don Quixote à frente de uma cruzada contra a corrupção. Apenas esses discursos falaciosos foram suficientes para garantir sua vitória nas urnas.

Se há quase três anos a economia brasileira estava em situação de preocupante dificuldade, agora o cenário é de quase paralisia, sem que o atual governo tenha tomado alguma medida para reverter o caos. Reconheço que a pandemia recrudesceu a crise e mostrou a cada cidadão a realidade de um país corroído pela tragédia social, mas de nada adianta culpar o vírus pela pasmaceira econômica.

Como já citei, o que se busca em termos políticos é uma candidatura de coalizão capaz de derrotar o retrocesso, as ameaças à democracia, o populismo barato, o desrespeito contumaz aos mais pobres.

O momento exige equilíbrio e maturidade política em nome de um país que precisa desvencilhar-se da crise múltipla que aflige os cidadãos e ameaça o futuro.

É importante que cada ator político reconheça a própria responsabilidade, sem devaneios ideológicos ou pessoais. O Brasil não pode repetir 2018, quando a vaidade dos então presidenciáveis impossibilitou a criação de uma frente capaz de frear uma candidatura que era tragédia anunciada.

Naquele momento, quando a campanha presidencial estava em marcha, faltou humildade aos demais candidatos tanto no primeiro turno, quanto no segundo. Não se tratava de eleger a esquerda ou a direita, mas de evitar que o Brasil enfrentasse o que temos assistido todos os dias: bravatas, negacionismo, ameaças aos Poderes constituídos, ataques à democracia, populismo desmedido, pirotecnia oficial, desrespeito à liturgia do cargo, incompetência.

A manifestação de domingo (23), no Rio de Janeiro, é prova incontestável desse cenário. Bolsonaro sabe que a reeleição começa a lhe escapar entre os dedos, por isso age dessa maneira. O presidente da República não age assim apenas porque é da sua essência, mas porque precisa de uma polarização cada vez maior para tentar evitar o pior.

Esse movimento tem por objetivo amedrontar os brasileiros de bem com a possibilidade de uma guerra civil, o que tira das ruas aqueles que estão sem paciência em com o grito entalado na garganta. Essa impossibilidade de manifestação decorre da pandemia, por isso Bolsonaro é contra as medidas de combate à Covid-19, pois sabe que quanto pior a situação da crise sanitária, menos chance o povo tem de sair às ruas para protestar. Com isso, o presidente vende a falsa ideia de que tem aprovação popular e sua reeleição se faz necessária, o que não é verdade.

O Brasil regrediu muito nos últimos dois anos e alguns meses. Esse retrocesso avançou rapidamente no vácuo da crise de Covid-19. É preciso estancar esse processo obscurantista e virar o jogo. Isso exige um candidato capaz de derrotar Bolsonaro, que, gostem ou não seus apoiadores, faz eco aos gestos fascistas de Mussolini.

Nós brasileiros precisamos urgentemente de um governo de transição que devolva ao a cada cidadão a esperança de dias melhores e encerre um período de constantes ameaças à democracia.

Até prova em contrário, Lula é o único capaz de derrotar Bolsonaro. Por isso é importante que o patriotismo de todos os outros pré-candidatos fale mais alto e abra passagem para um projeto político de resgate da dignidade cidadã.

Minha proposta é que Lula, caso vença a eleição de 2022, subirá a rampa do Palácio do Planalto com 77 anos e assuma os compromissos de não tentar a reeleição e preparar o país para uma sucessão pacífica e democrática, sem ameaças descabidas e outros golpes rasteiros.

Até porque, como profetizou o dramaturgo irlandês George Bernard Shaw (1856-1950), “a democracia muitas vezes significa o poder nas mãos de uma maioria incompetente”. Bolsonaro é prova disso!

(*) Waldir Maranhão – Médico veterinário e ex-reitor da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), onde lecionou durante anos, foi deputado federal, 1º vice-presidente e presidente da Câmara dos Deputados.

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