Esperteza contra o esperto

(*) Carlos Brickmann

Bolsonaro prometeu dar aumento a todo o funcionalismo federal: com a tal emenda que dá um chega pra lá nos precatórios, sobra no Orçamento algum dinheiro. Um quarto, talvez um terço, paga a ajuda do Auxílio Brasil; e a maior parte será dividida entre verbas para os parlamentares amigos da casa e o funcionalismo. Jogar para algum dia no futuro dívidas que a Justiça já mandou pagar talvez seja ilegal, mas isso não preocupa o presidente: ele já informou ao funcionalismo que quer dar o aumento. Se não conseguir, tem em quem jogar a culpa: ou nos parlamentares de oposição ou no Supremo. E passará aos servidores a ideia de que os inimigos do presidente são também inimigos da categoria.

Parece brilhante: ou Bolsonaro consegue dar o aumento e ganha adeptos no funcionalismo ou não consegue e faz com que ministros do Supremo e parlamentares percam prestígio. Uma política de longo alcance: se algum adversário do presidente ganhar a eleição, terá muito mais dificuldades para governar, precisando pagar as dívidas passadas.

É um bom jogo para melhorar as chances de Bolsonaro. Ele não pode ficar sem cargo eletivo que lhe garanta foro privilegiado e outras vantagens. Sem cargo, logo verá que os antigos aliados lhe darão o mesmo tratamento que deu a seus seguidores que caíram em desgraça.

Mas, como ensinava Tancredo Neves, quando a esperteza é muita ela engole o esperto. E se Bolsonaro, que criou as dificuldades para seu sucessor, ganhar a eleição?

O sentido das palavras

Bolsonaro, que precisa de uma legenda para disputar eleições, brigou há dias com Valdemar Costa Neto, cacique do PL, partido que se ofereceu para abrigar o presidente. Mas em política o eterno pode durar pouco. Valdemar Costa Neto reuniu o PL e recebeu dos caciques estaduais uma carta branca para atrair Bolsonaro. OK, vamos imaginar que o cacique maior precise do voto dos caciques menores para fazer o que quiser. Imaginemos, também, que as promessas sejam cumpridas. Mas sempre será importante saber o que, de fato, foi prometido.

“Carta branca”, por exemplo, é o que foi oferecido por Bolsonaro para os ministros Sergio Moro e Paulo Guedes.

Quer dizer…

Bolsonaro não quer que o PL apoie, em São Paulo, o candidato de Doria ao governo. Mas 40 prefeitos do partido já fecharam com ele. Bolsonaro não quer que o PL apoie candidatos do PT. Mas será difícil romper o elo entre o PL e o PT no Piauí. Na Bahia, o PL fecha com ACM Neto, cacique supremo do DEM. No Pará, o PL fecha com o MDB do governador Helder Barbalho, numa aliança que já fez sete anos e traz bons resultados ao partido. Barbalho não gosta de Bolsonaro, Bolsonaro não gosta de Helder, mas o PL não leva nenhuma vantagem em romper com o governador. Em Pernambuco, o nome favorito de Bolsonaro é o de Gilson Machado, ministro do Turismo nas horas vagas, que destina boa parte do tempo a assassinar boas músicas na sanfona.

Em São Paulo, Bolsonaro quer o ministro Tarcísio de Freitas como candidato ao Governo (mas quem irá ensinar-lhe a diferença entre o Palácio dos Bandeirantes, a Rodovia dos Bandeirantes e a Ponte das Bandeiras?) O PL até tem boa vontade, mas a boa vontade não se estende a perder o que já tem.

O bom negócio

Quando Valdemar Costa Neto diz que um bom acordo é aquele que é bom para os dois, isso significa que tem de ser bom para o PL e para ele.

Bezerrão macaqueado

Luciano Hang, o véio da Havan, lançou moda: como ele, que plantou em suas lojas umas cópias terríveis da Estátua da Liberdade, a Bolsa de Valores (B3) colocou numa das ruas mais antigas de São Paulo a estátua de um touro, macaqueando o bicho (símbolo dos investidores que se esforçam para elevar o valor das ações) exposto em Wall Street, Nova York.

Mas o touro lembra mesmo o Bezerro de Ouro citado na Bíblia, cujos adoradores o Senhor condenou à morte. A diferença é que o da Bíblia era de ouro mesmo e dispensava maquiagem em cima de metal mais barato para parecer valioso.

Novo ninho

O general Santos Cruz, aquele que era amigo de Bolsonaro há mais de 40 anos e foi seu poderoso ministro até que Carluxo, o filho 02, implicou com ele, prepara sua entrada no Podemos – o mesmo partido de Sergio Moro, que foi superministro de Bolsonaro até que, sentindo-se descartado, pediu para sair. Santos Cruz deve ser candidato a algum cargo no Rio ou em Brasília.

Se ficar no Rio, o Podemos gostaria de vê-lo candidato a governador. Pelo jeito, o Podemos se transforma aos poucos no partido dos mais poderosos ex-amigos de Bolsonaro. Devem estar esperando a chegada de Paulo Guedes.

Pastore, sem jogadas

Affonso Celso Pastore, professor, ex-presidente do Banco Central, é o chefe da equipe econômica que assessora Sérgio Moro.

Mas Pastore não é Guedes: se o Governo fizer bobagem, sai na hora e diz por que saiu.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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