Até o advento da pandemia do novo coronavírus, a palavra “negacionismo” vivia nas entranhas dos dicionários da língua portuguesa, nas redações jornalísticas e no universo científico. Desde que o vírus SARS-CoV-2 começou a fazer estragos em território brasileiro, a população incorporou o vernáculo na linguagem do cotidiano.
Contudo, o negacionismo, que tem na figura do presidente Jair Bolsonaro seu melhor (sic) representante, não fica circunscrito ao terreno das epidemias. Tudo indica que o negacionismo saiu da seara do novo coronavírus e desembarcou no Ministério da Economia.
Ainda ministro, Paulo Guedes, como afirmamos desde a campanha presidencial de 2018, é um teórico conhecido que tem sérias dificuldades para levar suas ideias ao terreno da prática. Quando o então candidato Jair Bolsonaro apresentou Guedes ao eleitorado como “Posto Ipiranga”, o UCHO.INFO afirmou que se tratava de mais um embuste daquele que sairia das urnas como presidente da República.
No último domingo (12), no programa Canal Livre, da TV Bandeirantes, Paulo Guedes agarrou-se ao negacionismo ao afirmar que não prometeu crescimento econômico em “V”. “Nunca disse que o Brasil ia continuar em ‘V’. Colocamos o Brasil de pé, isso é ‘V’. Vamos entrar no futuro”, declarou.
Acostumado a recorrer a metáforas absurdas para justificar o fracasso da política econômica do governo, Guedes, que já afirmou estar a economia em “pleno voo”, se valeu de declarações preconceituosas, colocando na mira empregadas domésticas e filhos de porteiros, mas não consegue tirar o Brasil do atoleiro da crise.
“Não tem negócio de câmbio a R$ 1,80. Vamos exportar menos, substituição de importações, turismo, todo mundo indo para a Disneylândia, empregada doméstica indo para Disneylândia, uma festa danada. Pera aí. Pera aí, pera aí. Vai passear ali em Foz do Iguaçu, vai passear ali no Nordeste, está cheio de praia bonita. Vai para Cachoeiro do Itapemirim, vai conhecer onde o Roberto Carlos nasceu, vai passear o Brasil, vai conhecer o Brasil. Entendeu? Está cheio de coisa bonita para ver”, disse o preconceituoso ministro.
Ao fazer críticas ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), criado no governo Lula, o ministro da Economia mirou sua verborragia no filho do porteiro do prédio em que mora, no Rio de Janeiro. “Houve excessos no Fies. É verídico. O porteiro do meu prédio um dia me falou ‘doutor Paulo, meu filho fez vestibular para uma faculdade privada, e olha a carta que recebi’. A carta dizia ‘parabéns, o senhor foi aprovado com média…’ e tinha um espaço. Era uma carta padronizada. E no espaço a média zero. Então claramente houve excessos”, declarou.
Paulo Guedes pode negar que tenha afirmado que a economia brasileira estava em V, mas em setembro passado, ou seja, há três meses, o ministro fez clara e inequívoca declaração nesse sentido.
“Diziam que eu estava em universo paralelo quando eu dizia que Brasil ia voltar em V. (…) A economia voltou em V, estamos crescendo novamente. Hoje saiu um dado [PIB], é praticamente de lado. Como foi -0,05%, arredondou para -0,1%. Se fosse -0,04% era zero”, afirmou.
O titular da Economia talvez esteja a enfrentar problemas com a chamada memória curta, mas a tal “economia em V” é mais uma parolagem de Paulo Guedes. Com a taxa básica de juro em 9,25% ao ano, a inflação acumulada em 12 meses acima de 10%, a produção industrial em baixa, o setor de serviços registrando recuo e a indústria da construção prevendo forte desaceleração em 2022, Guedes deveria ter um lampejo de hombridade e pedir para sair.
Como se não bastasse, a PEC dos Precatórios, que oficializa o calote do governo federal, deverá gerar um passivo de quase R$ 700 bilhões, valor a ser pago a partir de 2027. Mesmo assim, Guedes continua acreditando que é a personificação do “Posto Ipiranga”.
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