Faço minhas as palavras do saudoso Leonel Brizola: “A política ama a traição e odeia o traidor”

 
(*) Waldir Maranhão

Único brasileiro a ser eleito para governar dois estados distintos – Rio Grande do Sul (1959-1963) e Rio de Janeiro (1983-1987 | 1991-1994) –, o gaúcho Leonel de Moura Brizola cunhou certa feita uma frase que traduz com impressionante precisão a nossa realidade política.

“A política ama a traição e odeia o traidor.” Eis a profecia de Brizola, que ganha força extra em ano de eleições, ou seja, a cada dois anos.

No meu estado, o Maranhão, assim como em todas as unidades da federação, a traição corre solta e contra o tempo no campo da política, já que o prazo para troca de partido e filiações termina em 2 de abril próximo. Em outras palavras, o cronômetro foi acionado tanto para os políticos interessados nas eleições quanto para os traidores de plantão.

Com a formação de federações partidárias, alianças político-eleitorais e acordos de bastidores, os traidores saíram das catacumbas para protagonizar um golpe contra a coerência. Situacionistas migraram para a oposição e vice-versa. Quem tinha alguma contrapartida ficou de mãos abanando, quem nada tinha acabou recompensado.

Reconheço que eleições, candidatos e eleitos dependem de acordos, mas trair a própria consciência é algo que aponta na direção do que o país terá pela frente. Trair aliados é pior ainda.

Aos atores da política, em sua maioria, pouco importa o conjunto de necessidades da população ou as propostas dos partidos e seus candidatos, desde que seus objetivos sejam alcançados – chegar ao poder ou nele permanecer.

O melhor exemplo desse movimento de traição sistêmica pode ser conferido no governo de Jair Bolsonaro, que após muitos discursos “demonizantes” cooptou o Centrão, bloco informal de parlamentares que em outros tempos apoiou as gestões petistas. Hoje, o Centrão não só ignora o fato de ter sido aliado do PT, mas ataca a pré-candidatura do ex-presidente Lula.

Sei que o presidencialismo de coalizão tem suas compensações, freios e contrapesos, mas não se pode atacar o que um dia foi útil. E como foi!

A política brasileira, infelizmente, tem essa incompreensível mecânica, a qual precisa ser modificada para que o sonho de um país melhor se torne realidade. Do contrário, continuaremos andando de lado por causa de forças que ora se unem, ora se opõem.

Ex-governador de Minas Gerais e ex-senador da República, José de Magalhães Pinto disse certa vez: “A política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou.”

Mudar é preciso, sempre, até porque a sociedade anseia por mudanças, mas é primordial que a lealdade impere sem qualquer justificativa malemolente.

O grande entrave na política, que compromete as mudanças almejadas, é a vaidade de quem frequenta esse universo. Ninguém aceita abrir mão de um projeto político em nome do país e de seu povo. Falta civismo, falta compromisso com a nação, falta desprendimento.

Esse quadro ficou evidente nas eleições de 2018, quando cada presidenciável fora da polarização Bolsonaro-Haddad presidenciáveis só aceitava a ideia de chapa única – hoje chamada de terceira via – e fosse cabeça de chapa. Em outras palavras, a vaidade política de alguns colocou a democracia à beira do abismo.

É chegada a hora da mudança, de salvar o que muito nos custou para ser construído – a democracia. E de novo estamos presenciando a vaidade impedindo a formação da tão anunciada candidatura de terceira via. Não estou a desdenhar esse ou aquele candidato, mas clamando por responsabilidade, já que não devemos ignorar a possibilidade de continuidade do status quo, ou seja, a continuidade do que hoje condenamos diariamente com todas as forças.

Se há traição em elevada potência, essa é a da classe política relação aos eleitores, que permitem a cada um de nós existir no terreno da coisa pública. Os eleitores brasileiros não podem ser traídos, os eleitores maranhenses menos ainda.

Repetindo Leonel Brizola, se a “política ama a traição e odeia os traidores”, é melhor o brasileiro começar a odiá-los também.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

As informações e opiniões contidas no texto são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo obrigatoriamente o pensamento e a linha editorial deste site de notícias.

Se você chegou até aqui é porque tem interesse em jornalismo profissional, responsável e independente. Assim é o jornalismo do UCHO.INFO, que nos últimos 20 anos teve participação importante em momentos decisivos do País. Não temos preferência política ou partidária, apenas um compromisso inviolável com a ética e a verdade dos fatos. Nossas análises políticas, que compõem as matérias jornalísticas, são balizadas e certeiras. Isso é fruto da experiência de décadas do nosso editor em jornalismo político e investigativo. Além disso, nosso time de articulistas é de primeiríssima qualidade. Para seguir adiante e continuar defendendo a democracia, os direitos do cidadão e ajudando o Brasil a mudar, o UCHO.INFO precisa da sua contribuição mensal. Desse modo conseguiremos manter a independência e melhorar cada vez mais a qualidade de um jornalismo que conquistou a confiança e o respeito de muitos. Clique e contribua agora através do PayPal. É rápido e seguro! Nós, do UCHO.INFO, agradecemos por seu apoio.