Após matança na Vila Cruzeiro, PM culpa o STF pela migração de criminosos para o Rio de Janeiro

 
A operação policial deflagrada na madrugada desta terça-feira (24) na favela de Vila Cruzeiro, na zona norte do Rio de Janeiro, terminou com 22 mortos. A ação visava prender lideranças criminosas que estariam escondidas na região.

De acordo com informações da Polícia Militar (PM), as vítimas seriam 21 suspeitos e uma moradora da comunidade, Gabriele Ferreira da Cunha, de 41 anos, que foi vítima de bala perdida. Outras sete pessoas, entre elas um policial, ficaram feridas e foram levadas para hospitais na região.

A operação conjunta do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF) realizada na comunidade, uma das 13 favelas do Complexo da Penha, visava prender lideranças da facção criminosa Comando Vermelho, que estariam escondidas na região.

Entre os suspeitos líderes criminosos de outras comunidades como Mangueira, Jacarezinho, Salgueiro e Providência e alguns vindos de outros estados, como Bahia, Pará e Alagoas.

A PM afirma que os agentes se preparavam para dar início à operação quando foram atacados por traficantes. O confronto teria ocorrido próximo a uma área de mata.

“Realidade trágica”

A PM informou que foram apreendidos na operação 11 fuzis, quatro pistolas, motocicletas e seis automóveis que teriam sido usados pelos criminosos.

O tenente-coronel Ivan Blaz, porta-voz da Polícia Militar fluminense, disse que a organização criminosa é responsável por mais de 80% dos confrontos armados do Rio de Janeiro e que realiza uma “campanha expansionista” no estado.

O militar afirmou que a morte da moradora de Gabriele Ferreira da Cunha é uma “realidade trágica”. “Esse resultado logo no início da operação já nos desestimula. Ele já é um fato lamentável, muito lamentável, uma família impactada por um resultado desse, da violência”.

As mortes na Vila Cruzeiro ocorreram poucas semanas após a data que marcou um ano do massacre no Jacarezinho, a operação policial mais letal da história do Rio de Janeiro, que deixou 28 mortos.

 
Incompetência oficial

A ausência do Estado, que já dura décadas, abriu caminho para o crime organizado se instalar em diversas regiões do Rio de Janeiro. É importante salientar que não apenas traficantes de drogas agem nessas comunidades, mas também milícias, onde alguns policiais militares ocupam postos de comando na estrutura criminosa.

No momento em que a política de segurança pública fracassa, o Estado opta pela matança como forma de combater a criminalidade. Há uma sensível diferença entre suspeitos de envolvimento com o crime organizado e a cabal comprovação dessa relação.

Causa espécie alguns profissionais de imprensa noticiarem que a PM matou criminosos, sem que até o momento não há a identificação completa das vítimas. Mesmo que os mortos fossem criminosos, o Estado tem o dever de prendê-los, não sair atirando, sabendo que a maioria dos moradores da região é formada por pessoas honestas e trabalhadoras.

Além disso, uma ação policial com tamanha violência jamais seria levada adiante em locais nobres da capital fluminense. Ações desse tipo têm ocorrido com certa frequência em comunidades pobres, onde os moradores são alvo da pasteurização do entendimento das autoridades, que consideram todos como criminosos.

É preciso que o poder público assuma de vez o seu papel, garantindo aos moradores de comunidades condições minimamente dignas de vida, o que significa proporcionar segurança, saúde, educação, emprego e transporte. Do contrário, esse contingente de pessoas ficará eternamente refém das facções criminosas.

Ademais, o crime organizado não se combate com tiroteios em locais densamente povoados, mas com inteligência policial e estrangulamento financeiro dos criminosos.

Terceirização da responsabilidade

Emparedada pela incompetência, o comando da Polícia Militar do Rio de Janeiro culpou o Supremo Tribunal Federal (STF) pela migração de criminosos de outras comunidades e até mesmo de outros estados (Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Pará e Rio Grande do Norte).

“A gente começou a reparar essa movimentação, essa tendência deles de migração para o RJ, a partir da decisão do STF [que limitou operações policiais em favelas durante a pandemia de Covid-19]”, disse em entrevista o secretário da corporação, coronel Luiz Henrique Marinho Pires.

“Isso vem acentuando nos últimos meses. Esse esconderijo deles nas nossas comunidades é fruto basicamente dessa decisão do STF. É o que a gente entende, a gente está estudando isso, mas provavelmente deve ser fruto dessa decisão do STF”, concluiu.

A declaração do coronel é descabida e serve apenas para engrossar os constantes ataques do presidente Jair Bolsonaro ao STF. É importante lembrar que Bolsonaro tem nas polícias militares parte considerável da sua base de apoio, por isso declarações desse naipe serão repetidas quando ocorrerem massacres como o desta terça-feira.