Vila Cruzeiro: em países sérios, não é o caso do Brasil, secretário de Polícia Militar do RJ já estaria preso

 
Em matéria anterior afirmamos que a declaração torpe do secretário de Polícia Militar do Rio de Janeiro, coronel Luiz Henrique Marinho Pires, culpando o Supremo Tribunal Federal (STF) para justificar a matança na Vila Cruzeiro serviu para fazer eco ao discurso delinquente do presidente Jair Bolsonaro, que ataca diariamente o Judiciário e defende o massacre da população pobre em nome de uma suposta política de segurança pública.

De acordo com o militar, o Rio de Janeiro passou a receber criminosos de todo o País após decisão do STF que impôs limites às operações policiais no estado durante a pandemia do novo coronavírus.

“Começamos a reparar a migração dessas lideranças de uns tempos pra cá. E isso foi acentuando após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Fazer daqui o esconderijo deles é fruto dessa decisão. Estamos estudando essa questão, mas tudo nos leva a crer que isso se deve à decisão que limitou a ação das polícias nas comunidades”, disse Pires em entrevista coletiva.

Horas depois da publicação da matéria, Bolsonaro parabenizou os policiais que participaram da matança na comunidade que integra o complexo de favelas da Penha. Até o momento, o saldo da operação é de 25 mortos e sete feridos.

“Parabéns aos guerreiros do Bope e da Polícia Militar do Rio de Janeiro, que neutralizaram pelo menos 20 marginais ligados ao narcotráfico em confronto, após serem atacados a tiros durante operação contra líderes de facção criminosa”, afirmou Bolsonaro. A Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal também participaram da ação.

Nas redes sociais, o presidente da República disse que a operação foi planejada durante vários meses. Afirmou que os agentes de segurança monitoravam os passos de chefes do tráfico de drogas com o objetivo de prendê-los fora da comunidade, mas que o ataque de criminosos inviabilizou o plano inicial, “fazendo-se necessário o uso da força para conter as ações”.

 
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Em decisão no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635 (ADPF 635), conhecida como “ADPF das Favelas”, o ministro Luiz Edson Fachin vetou o uso de helicópteros como plataforma de tiro, restringiu operações policiais em perímetros escolares e hospitalares, determinou a preservação dos vestígios da cena do crime e evitar remoções de corpos para a realização de perícia.

Contudo, os ministros do STF não formaram maioria para obrigar o estado do Rio de Janeiro a elaborar um plano de redução de letalidade policial e de controle de violações de direitos pelas forças de segurança fluminense.

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, também usou as redes sociais para justificar o injustificável. “Quem aponta uma arma contra a polícia está apontando uma arma contra toda sociedade”, escreveu o governador no Twitter.

“Essa gente ruim quer matar o futuro do povo fluminense. Fora do império da lei e da ordem estão a barbárie e o banditismo. Não vamos permitir a anarquia no nosso estado. Vamos seguir investindo em inteligência, na preparação de nossas tropas e, sobretudo, acreditando que um futuro de paz é possível”, completou.

Falar em inteligência policial depois da segunda mais letal operação da história recente do Rio de Janeiro é no mínimo um deboche. Caso os envolvidos na operação tivessem recorrido de fato à inteligência policial, os criminosos estavam presos. Não importa se os mortos tinham envolvimento com o crime organizado ou passagens policiais. O papel do Estado é investigar, prender, julgar, condenar se for o caso e recuperar o apenado. Quando a matança serve de cortina de fumaça para uma fracassada política de segurança pública é porque o Estado ruiu.

A ação na Vila Cruzeiro representa um flagrante desrespeito à decisão do Supremo que impôs limites às ações da polícia no Rio de Janeiro. É importante ressaltar que ao tomar posse no cargo, em 27 de agosto de 2021, o coronel Luiz Henrique Marinho Pires prometeu investir em tecnologia e inteligência policial. Não foi o que se viu na Vila Cruzeiro.

Em qualquer minimamente sério, não é o caso do Brasil, os responsáveis já estariam presos, a começar pelo coronel que tentou transferir ao STF a responsabilidade pela barbárie.