Cachês milionários de sertanejos pagos por prefeituras precisam ser investigados além da polêmica

 
O universo da música sertaneja está em polvorosa por causa dos milionários cachê pagos com dinheiro público, assunto que veio à baila depois que alguns artistas apoiadores de Jair Bolsonaro decidiram fustigar a cantora Anitta em razão de tatuagem em partes íntimas.

Os sertanejos bolsonaristas elegeram Anitta como alvo para atacar os artistas que legalmente captavam recursos a partir da Lei Rouanet, mas acabaram descobertos com a mão no butim. A polêmica começou com o cantor Zé Neto, que faz dupla com Cristiano, durante show realizado em maio no estado de Mato Grosso. O sertanejo aproveitou a apresentação para atacar Anitta, mas o tiro saiu pela culatra.

“Nós somos artistas que não dependemos de Lei Rouanet. Nosso cachê quem paga é o povo. A gente não precisa fazer tatuagem no toba para mostrar se a gente está bem ou mal. A gente simplesmente vem aqui e canta, e o Brasil inteiro canta com a gente”, disse Zé Neto, em declaração machista e recheada de falso moralismo.

Com a repercussão do caso, em cena surgiu o uso de verbas públicas de prefeituras com shows de cantores sertanejos. Em 25 de maio, o Ministério Público do Estado de Roraima abriu investigação para apurar a contratação do cantor Gusttavo Lima pela Prefeitura de São Luiz (RR), com cachê fixado em R$ 800 mil.

A população do município é estimada em 8.232 pessoas. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dividindo o cachê cobrado por Gusttavo Lima pelo número de moradores de São Luiz, cada munícipe pagaria R$ 97 pelo show.

Gusttavo, que na segunda-feira (30) usou as redes sociais para afirmar que é alvo de injustiça e pensa em “jogar a toalha”, entrou na mira das autoridades em virtude de um show, no valor de R$ 1,2 milhão, contratado pela Prefeitura de Conceição do Mato Dentro (MG), cidade a cerca de 164 km da capital mineira. O contrato, assinado em 11 de abril, faz parte das festividades do município e agora é alvo de investigação do Ministério Público de Minas Gerais.

 
O show foi cancelado após a divulgação do valor pago pelo show, sendo que a Prefeitura da cidade mineira alegou que o motivo do cancelamento seria a tentativa de “guerra política e partidária que não tem nenhuma ligação com o município e nem tampouco com a tradicional festa” do Jubileu do Senhor Bom Jesus de Matosinhos.

Muitos dos shows sertanejos contratados por órgãos públicos, sem a devida licitação, têm valores algumas vezes acima do praticado em situações normais, por isso é importante que as autoridades fiquem atentas a possíveis ilegalidades nessas contratações.

A dupla Zé Neto e Cristiano recebeu cifras absurdas por shows contratados pelas seguintes prefeituras: Extrema (MG), R$ 550 mil; Sebastianópolis do Sul (SP), R$ 403 mil; e Aruana (GO), R$ 320 mil. Dinheiro público, é claro.

Pré-candidato à Presidência da República pelo Avante, o deputado federal André Janones destinou R$ 7 milhões, por meio de emenda parlamentar, à Prefeitura de Ituiutaba (MG), sendo que R$ 1,9 milhão será usado na feira agropecuária Expopec, com direito a show de Gusttavo Lima e outros artistas. Coincidência ou não, a Expopec acontecerá dias antes das eleições de outubro.

Sobre o desejo de “jogar a toalha”, Gusttavo Lima deveria, de chofre, tomar ciência da gravíssima situação que atravessa o País, muito diferente do ufanismo tosco que recobre sua carreira. Cobrar R$ 800 mil por um show em município com pouco mais de 8 mil habitantes é clara demonstração de abuso de quem finge desconhecer os mais básicos conceitos aritméticos.

Quem deseja passar ao largo de polêmicas, como a iniciada por Zé Neto, o típico “macho alfa” de camelô que abunda no bolsonarismo, que aja com coerência e se negue a fazer shows custeados com o suado dinheiro do cidadão brasileiro. Afinal, recursos públicos devem ser destinados inicialmente para as necessidades básicas da população – saúde, educação, segurança pública e infraestrutura. Havendo sobra, que seja investida em eventos culturais e de lazer.

Considerando que o Brasil está repleto de aproveitadores do dinheiro público, por isso a nossa situação se aproxima da calamidade, se Gusttavo Lima e seus quejandos aposentarem os microfones farão um monumental favor ao País e aos brasileiros. Em suma, o mercado de shows entrou em crise e caiu no colo do Ministério Público. A partir de agora é como montaria em rodeio: segure-se quem puder.