CCJ do Senado desafia o Supremo e aprova projeto do marco temporal; matéria é inconstitucional

 
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, nesta quarta-feira (27), o projeto de lei do chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas.

A tese, que havia sido derrubada há menos de uma semana pelo Supremo Tribunal Federal (STF), estipula que os povos indígenas tenham direito a reivindicar em processos de demarcação somente as terras que estivessem ocupadas até a data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.

Os senadores da CCJ aprovaram a tese por 16 votos a 10, mas o projeto ainda precisa ser levado ao plenário. Mesmo que o projeto venha a ser aprovado no plenário do Senado, a inconstitucionalidade da matéria é patente e com certeza será derrubada pelo STF.

A Câmara dos Deputados já havia aprovado o texto no final de maio com forte apoio da bancada ruralista – que representa os maiores interessados na aprovação do marco temporal – e do presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).

Ofensiva contra o STF

O relator do projeto no Senado, Marcos Rogério (PL-RO), rejeitou todas as mudanças sugeridas pelos senadores e manteve o texto original aprovado pelos deputados. Ele disse que o objetivo era evitar que o texto voltasse para a Câmara.

“Aí é uma escolha política. Nós estamos diante de um ambiente de insegurança, inquietação, intranquilidade no Brasil inteiro”, disse o relator, explicando o motivo pelo qual se recusou a aceitar as mudanças.

O avanço da tese no Legislativo é considerado como parte de uma ofensiva do Congresso contra o Supremo, que deve incluir também temas como aborto, imposto sindical e drogas.

 
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), avalia que o debate foi contaminado por ideologias, e não quis arriscar levar a votação ao plenário. “Essa discussão virou muito ideologizada”, observou.

Wagner disse que Lula deverá fazer “o que a sua consciência disser”, e que não há dinheiro suficiente para uma possível indenização da União a produtores rurais que adquiriram terras indígenas regularmente. “Vai virar tudo precatório? Vai virar tudo o quê? Não sei. Eu só estou querendo chamar atenção que nós não estamos no caminho da solução.”

Os governistas acreditam que, mesmo se a tese for aprovada em plenário, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá vetar trechos do projeto.

Pontos polêmicos

Na semana passada, O STF declarou inconstitucional a tese do marco temporal por 9 votos a 2. Movimentos indígenas argumentam que, em 1988, seus territórios já haviam sido alvo de séculos de violência e destruição, e que as áreas de direito dos povos não deveriam ser definidas apenas por uma data.

Os ruralistas, por sua vez, sustentam que o marco temporal deverá ser uma ferramenta para a resolução de disputas por terra e para garantir segurança jurídica e econômica.

Os governistas admitem que o texto do projeto vai além da tese, como nos artigos que permitem o contato com povos isolados para “prestar auxílio médico ou intermediar ação estatal de utilidade pública”.

A tese também abre caminho para indenizações aos antigos proprietários das terras demarcadas, além de proibir a ampliação de territórios já delimitados. Segundo o texto, os processos em andamento também devem considerar as áreas ocupadas em 1988.

O projeto viabiliza a retomada das terras demarcadas pela União se houver “alteração dos traços culturais da comunidade ou outros fatores ocasionados pelo decurso do tempo”.

 
Territórios indígenas sob ameaça

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) afirma que a adoção do marco temporal limitaria o acesso dos indígenas ao seu direito originário sobre suas terras e que há casos de povos que foram expulsos delas algumas décadas antes da entrada em vigor da Constituição.

“O direito de povos indígenas a seus territórios não começa e nem termina em uma data arbitrária”, justifica Maria Laura Canineu, diretora da ONG Human Rights Watch no Brasil. “Aprovar esse projeto de lei seria um retrocesso inconcebível, violaria os direitos humanos e sinalizaria que o Brasil não está honrando seu compromisso de defender aqueles que comprovadamente melhor protegem nossas florestas”.

Na avaliação do Ministério dos Povos Indígenas, o texto pode “inviabilizar demarcações de terras indígenas, ameaçar os territórios já homologados e destituir direitos constitucionais, configurando-se como uma das mais graves ameaças aos povos indígenas do Brasil na atualidade”.

Nossa opinião

Causa espécie a passividade da opinião pública diante dos escárnios que brotam do Congresso Nacional. O Brasil vive uma ditadura do Legislativo, sem que o cidadão reaja aos desmandos dos parlamentares, liderados por alguns especialistas em banditismo político.

Deixar que o Parlamento decida sobre questões polêmicas como, por exemplo, marco temporal, aborto e uso de drogas é empurrar o País na ladeira do retrocesso. Os brasileiros agora enfrentam os efeitos colaterais do pior governo da história, o de Jair Bolsonaro, que a reboque de um golpe malsucedido tentou romper a ordem democrática.

A bancada do agronegócio precisa ser enquadrada enquanto é tempo, pois do contrário a devastação dos biomas será inevitável. Em relação às terras indígenas ilegalmente ocupadas, vale ressaltar que posse não representa propriedade. Aqueles que compraram as referidas áreas o fizeram sabendo da ilegalidade. (Com agências de notícias)


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