Hezbollah quer jogar o Líbano no conflito entre Hamas e Israel; premiê quer “estabilidade e segurança”

 
O conflito entre o Hamas, grupo de resistência palestina que controla a Faixa de Gaza, e Israel, que já deixou mais de 1.500 mortos e milhares de feridos, precisa ser estancado urgentemente, antes que se estenda a outros países da região.

Uma das forças políticas que integram o Parlamento do Líbano, o Hezbollah, que reúne muçulmanos xiitas, declarou apoio ao Hamas logo após o ataque do grupo de resistência palestina que atacou Israel. O Hezbollah foi além e, a partir do Sul do Líbano, atacou posições israelenses. Israel, por sua vez, revidou o ataque, atingido localidades libanesas. O primeiro-ministro do Líbano, Najib Mikati, condena a manobra do Hezbollah e diz que o país quer “estabilidade e segurança”.

O Hezbollah, que detém quinze das 128 cadeiras do Parlamento do Líbano, não conta com a confiança da maioria dos libaneses, que não enxerga o grupo liderado por Sayed Hassan Nasrallah como garantia da estabilidade política no país.

Além das fronteiras do Líbano, a conexões do Hezbollah permitem visualizar um enxadrismo político perigoso. Criado em 1982, após a invasão do Líbano pelos israelenses, o Hezbollah sempre contou com o apoio financeiro e militar do Irã, que há muito abastece o Hamas com recursos e armamentos, além de treinar os integrantes do grupo.

O Hezbollah tem fortes ligações com Bashar al Assad, ditador sírio, que desde 2011 está na proa de uma guerra civil sanguinária contra opositores. A Síria está praticamente destruída em todos os sentidos, tanto física quanto economicamente, mas continua mantendo laços questionáveis com o Hezbollah, que chama para si a responsabilidade de ter expulsado o Estado Islâmico dos domínios de Assad.

O Irã, como escreveu o editor do UCHO.INFO em recente artigo, usa terreiros para se contrapor às investidas de Israel na região. A Guerra do Líbano de 2006, por exemplo, resultou de ataques do Hezbollah a Israel. Na ocasião, oito soldados israelenses foram mortos e dois sequestrados. O confronto provocou a morte de 121 militares e 49 civis israelenses. Do outro lado, morreram cerca de 270 combatentes do Hezbollah, além de 50 soldados e policiais libaneses. Cerca de 1.200 libaneses, principalmente civis, morreram no contra-ataque israelense.

Agora, a decisão do Hezbollah de declarar apoio ao Hamas e atacar localidades israelenses decorre do interesse do grupo de Nasrallah em ampliar o poder político no Líbano.

O Hezbollah não está preocupado com a situação econômico-social do Líbano, onde 82% dos libaneses vivem na pobreza, de acordo com dados de 2021 da Organização das Nações Unidas (ONU). Para se ter ideia da tragédia social que se instalou no país, entre 2019 e 2020, apenas, a taxa de empobrecimento saltou de 28% para 55% no Líbano.

 
Tabuleiro complexo e alvo de cobiça

O Oriente Médio é uma região que desperta o interesse de vários países do Ocidente, como, por exemplo, Estados Unidos e França. Enquanto os EUA apoiam deliberadamente o governo de Tel Aviv, apesar de a Casa Branca ter recuado alguns passos no cenário do conflito deflagrado pelo Hamas, a França tenta aumentar seu protagonismo na região. Prova disso é o empenho do Palácio do Eliseu, sede do governo francês, para fazer o próximo presidente do Líbano, que está órfão de um chefe de Estado o fim do mandato de Michel Aoun, em outubro de 2022.

A persistir a decisão do Hezbollah de atacar o território israelense a partir do Sul do Líbano, sob o argumento de que os disparos (três até o momento) são mera advertência, os libaneses devem estar preparados para o pior, pois o conflito entre Hamas e Tel Aviv terá ingredientes suficientes para se transformar em guerra local.

O Hezbollah tenta desestabilizar politicamente o Líbano com essas incursões, a exemplo do que fez em 2006, quando Israel percebeu que o conflito tinha duas frentes de batalha, uma delas com o Hamas. Na ocasião, o Hezbollah pretendia a maioria do Parlamento libanês, contrária ao regime do ditador sírio Bashar al-Assad.

É importante ressaltar que a Síria esteve envolvida no assassinato de do primeiro-ministro libanês Rafik Al-Hariri, vítima da explosão de um automóvel em fevereiro de 2005, na capital Beirute. O atentado ficou a cargo do serviço secreto sírio no Líbano, à época comandado por Ghazi Kanaan, que se suicidou dias antes da divulgação do relatório da ONU sobre o crime.

No início de 2023, representantes da França, Estados Unidos, Arábia Saudita, Egito e Qatar reuniram-se em Paris para discutir a eleição do próximo presidente libanês. O encontro não teve resultado prático, pois a Arábia Saudita se opôs à candidatura de Sleiman Frangieh, sob a justificativa de que o candidato tem relações próximas com o Hezbollah e o regime do ditador sírio Bashar al-Assad.

No contraponto, a Arábia Saudita, que tenta esconder as barbáries cometidas pela ditadura comandada pelo príncipe Mohammad bin Salman, reatou em abril passado as relações diplomáticas com o Irã. A retomada efetiva se deu em setembro, quando ambos os países intercambiaram embaixadores. Acontece que a Arábia Saudita deu início a conversações com Israel, sob o patrocínio dos EUA, que inimigo do Irã, que está por trás do Hamas, mesmo que o regime dos aiatolás negue o fato.

É importante salientar que o Hezbollah é um filhote da Revolução Islâmica, que teve lugar no Irã e foi liderada pelo aiatolá Ruhollah Khomeini, culminando com a deposição do xá Mohammad Reza Pahlavi em fevereiro de 1979.

Em outro vértice da crise regional está o presidente da Rússia, Vladimir Putin, que a reboque de um plano de dominação continua destruindo a Ucrânia, que resiste aos ataques com a ajuda dos países que integram a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Putin também é um dos artífices da guerra civil que devastou a Síria de Assad.

O conflito entre Hamas e Israel joga uma cortina de fumaça sobre a guerra na Ucrânia, em tese permitindo que Putin aja com mais violência contra os ucranianos. Por outro lado, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, acusa o Kremlin de colaborar com o Hamas no ataque a Israel. Isso porque os drones utilizados pelo Hamas são parecidos com os que o governo russo emprega na invasão à Ucrânia.


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