Falemos de Plínio Marcos

(*) Regina Helena Paiva Ramos

Não tenho dúvidas de que o teatro é uma das artes que mais abre janelas. Uma boa janela revelando um dramaturgo que os jovens de hoje pouco conhecem está numa pequena sala da Barra Funda.

Estamos falando de “Eu fiz por merecer”. É teatro dos bons. Só que, à primeira vista, não parece. Parece sabe o quê? Talboa de tiro ao alvo? Não! Isso é samba de Adoniran. Parece uma conversa de amigos, dá vontade de dar palpites, me contive para ficar quieta. Vou voltar lá e acho que não vou resistir, sou capaz de sentar naquela mesa com os atores e participar da conversa.

É importante ver. Os mais entrados nos anos para recordar um dramaturgo que fez e aconteceu durante os anos de chumbo: Plínio Marcos. Os mais novos para conhecer a vida do distinto. Um dia brigamos e, entre ofensas mais graves o cara me chamou de “distinta”, deu discussão feia, eu no jornal em que escrevia, ele no dele.

Passou. O que aconteceu foi que Plínio Marcos não gostou de ser criticado, afinal era o garoto de ouro da crítica. E eu, a “distinta”, que não gostou de “Balbina de Iansã”. Passou, aliás foi há milhares de anos!

Dramaturgo criado em Santos, descoberto por Pagu – a famosa Patrícia Galvão – tem a seu crédito a peça “Navalha na Carne”, perfeita, doída, retrato de uma camada social que a sociedade não aceitava e não aceita e que a censura da época proibiu. Por ter palavrões. Palavrões, esses, que crianças de escola daquela época (nem se fale nas de hoje!) sabiam de cor e salteado. Quando liberou o fez, apenas, para maiores de 21 anos. Na época, em crítica, perguntei como os censores gostariam que uma prostituta e seu cafetão se tratassem, por vossa excelência?

O episódio da luta pela liberação desse texto teve a grande Cacilda Becker no comando. Enfrentando a ditadura ela fez encenar a peça em sua casa, no último andar de um prédio da Av. Paulista, para um público formado por uma centena de pessoas e a crítica paulistana, em peso. Foi uma ovação total! Palmas e vivas, a peça era – e é! – excelente, mostra personagens sofridos e reais. Vivendo a tortura de serem quem são.

Voltemos ao “Eu fiz por merecer”. Oswaldo Mendes fez o texto e ninguém melhor do que ele para fazê-lo, era amigo do distinto e até escreveu sobre ele: “Bendito Maldito”, um livro ótimo e necessário. O texto que está sendo apresentado na Barra Funda conta de Plínio garoto, que jogava futebol e trabalhava em circo, depois fala de suas peripécias com a censura e a ditadura, mas o distinto achava que tudo acontecera por que ele “fizera, mesmo, por merecer”.

No palco que é sala rodeada pelo público estão o autor, mais Walter Breda e Fernando Rocha, excelentes, dando conta do recado. Anotem o endereço: Rua Barra Funda, 519. Só às 3ª feiras. Contato para reservar lugar pelo WhatsApp (11) 99660.1111.

(*) Regina Helena Paiva Ramos é jornalista e escritora.

As informações e opiniões contidas no texto são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo obrigatoriamente o pensamento e a linha editorial deste site de notícias.


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