Em vez de dar nota zero para a Vai-Vai, Tarcísio deveria fazer um mea culpa no campo da segurança

 
Em tese o Carnaval acabou, mas a folia delirante tende a seguir ano afora, como é de praxe no Brasil, o “país da piada pronta”, como diz o jornalista José Simão (Folha e BandNews FM). No último dia 12, antes da apuração dos desfiles das escolas de samba de São Paulo, delegados da Polícia Civil paulista divulgaram nota criticando uma ala da Vai-Vai, que levou para o Sambódromo do Anhembi uma ala (Sobrevivendo no inferno) com integrantes vestidos como policiais com chifres e asas de demônio.

Na nota, o sindicato dos delegados, que representa a categoria, afirmou que a Vai-Vai “tratou com escárnio a figura de agentes da lei”. “Com direito a chifres e outros itens que remetiam à figura de um demônio, as alegorias utilizadas na ala Sobrevivendo no Inferno, demonizaram a polícia — algo que causa extrema indignação.”

“Em nome do que chama de ‘arte’ e de liberdade de expressão, [a escola] afronta as forças de segurança pública, desrespeita e trata, de forma vil e covarde, profissionais abnegados que se dedicam, dia e noite, à proteção da sociedade e ao combate ao crime, muitas vezes, sob condições precárias e adversas, ao custo de suas próprias vidas e famílias”, destacou o sindicato.

Como esperado, após o desfile da Vai-Vai surgiram informações, repercutidas pela imprensa, sobre um cidadão supostamente ligado ao PCC que em 2022 teria emprestado R$ 300 mil à escola de samba do bairro da Bela Vista. Investigação da Polícia Civil aponta que Luiz Roberto Marcondes Machado de Barros, conhecido como Beto Bela Vista, era diretor financeiro da Vai-Vai antes de fazer o mencionado empréstimo. Pois bem, é preciso questionar indignados delegados sobre o que foi feito para elucidar o que por enquanto está no campo da suposição, das suspeitas e dos indícios.

O UCHO.INFO não tem procuração para defender a Vai-Vai nem Beto Bela Vista, algo que jamais faria, mas faz-se necessário ressaltar que é dever do policial impedir que situações como a relatada permaneçam no campo da impunidade. Se Beto Bela Vista é ligado ao PCC e a escola de samba é um reduto da facção, como afirmam, que todos sejam punidos com base na lei, garantido o direito à ampla de defesa.

Para reforçar a polêmica, o governador Tarcísio de Freitas, um turista acidental em São Paulo, resolveu abordar o tema. Nesta quinta-feira (15), o governador disse: “Achei de péssimo gosto porque a polícia é uma instituição a que se deve respeito. Esse tipo de deboche não é legal, é ruim, é agressivo, de péssimo gosto. Nota zero para eles”. Governador, procure se inteirar do que acontece nos escaninhos da segurança pública.


 
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Como se sabe, Tarcísio de Freitas não é julgador de desfiles de escolas de samba, mas deveria dar nota zero à pífia política de segurança pública do seu governo. Quando o governador escolhe um secretário de Segurança Pública que há anos disse ser “vergonhoso” para um policial não ter ao menos “três ocorrências” por homicídio no currículo, não se pode esperar um cenário diferente do extermínio institucional.

Tarcísio cobrou providências do secretário de Segurança, Guilherme Derrite, ex-comandante da Rota, que para mostrar serviço transferiu temporariamente o próprio gabinete para a Baixada Santista, onde a matança cresce sem freio.

Em viagem à Europa, Tarcísio disse a empresários que a Operação Escudo, da Polícia Militar, tem como objetivo combater o crime organizado no litoral paulista. Na verdade, a operação busca vingar a morte de policiais por criminosos sem qualquer ligação com o crime organizado. Desde o último dia 2 de fevereiro até esta quinta-feira, o número de mortos pela PM na Baixa Santista chegou a 22. Combate ao crime organizado não se faz com matança indiscriminada, mas com inteligência policial.

O combate ao crime organizado na região é vergonhoso, algo que os bastidores explicam com excesso de clareza. Quem conhece os verdadeiros policiais que enfrentam os barões do crime na Baixada Santista sabe o que realmente acontece.

Em vez de dar nota para a escola de samba Vai-Vai, Tarcísio de Freitas deveria se preocupar com a segurança pública. O tráfico de drogas na chamada Cracolândia corre solto por motivos óbvios. Estabelecimentos comerciais da região da Santa Efigênia têm sido alvo dos dependentes químicos, que saqueiam de forma recorrente lojas de produtos eletrônicos, causando enormes prejuízos aos proprietários. A polícia de Tarcísio e Derrite nada faz para coibir esse tipo de ação.

No Morumbi, bairro da zona sul da capital paulista, a recorrência e a violência de assaltos preocupam comerciantes e moradores da região. O bairro teve a maior alta de roubos (37%) de toda a capital no último ano, de acordo com dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado. Na tentativa de se proteger, empresários têm encerrado as atividades mais cedo e contratado segurança particular, medida adotada também por edifícios residenciais.

Fosse corajoso e firme, Tarcísio de Freitas demitiria o secretário de Segurança Pública e cobraria “os profissionais abnegados que se dedicam, dia e noite, à proteção da sociedade e ao combate ao crime, muitas vezes, sob condições precárias e adversas”.


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