Relações entre Judiciário e Legislativo no Brasil

(*) Gisele Leite

O Ministro Flávio Dino convoca audiência no STF para debater emendas e questiona se pagamento obrigatório poderá ferir a separação dos Poderes. Em nosso país, o Judiciário e o Legislativo possuem complexa relação, sendo crucial para o adequado funcionamento da democracia brasileira. O Legislativo é o responsável por criar as leis e normas jurídicas e, o Judiciário é o responsável por interpretá-las e aplicá-las, devendo, segundo a Constituição Federal brasileira vigente, os três Poderes serem independentes e harmônicos entre si. No entanto, na prática cotidiana, tal harmonia nem sempre é consistente e surgem conflitos e tensões severas.

O atual busílis refere-se as chamadas emendas impositivas do Legislativo. A discussão sobre a constitucionalidade de emendas parlamentares pode gerar conflito entre o Legislativo e o Judiciário, especialmente quando a decisão judicial limita o poder de escolha dos parlamentares. As emendas impositivas previstas no artigo 106 do atual texto constitucional brasileiro permitem ao Legislativo uma atuação direta sobre a execução do orçamento público.

As emendas parlamentares impositivas são aquelas que têm execução obrigatória pelo Poder Executivo e são previstas pelas Emendas Constitucionais (ECs) 86/2015, 100/2019, 105/2019 e 126/2022. Elas abrangem as emendas individuais de transferência especial (“emendas Pix”), as individuais de transferência com finalidade definida e as “de bancada”.

As Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 7.688, 7.695 e 7.697, das quais Dino é relator, foram apresentadas, respectivamente, pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), pela Procuradoria-Geral da República e pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).

Na ADI 7.697, o PSOL argumenta que a execução obrigatória das emendas reduz a discricionariedade do Poder Executivo na gestão do orçamento e subverte a independência dos poderes. Já as ADIs 7.695 e 7.688 questionam dispositivos que disciplinam a alocação de recursos federais a estados, Distrito Federal e municípios por meio das emendas individuais (“emendas Pix”).

O Legislativo pode questionar decisões judiciais, e o Judiciário pode analisar a constitucionalidade de leis aprovadas.

O Judiciário age como um contrapeso ao poder político, protegendo os direitos dos cidadãos e assegurando que as leis não sejam utilizadas de forma abusiva.

Porém, existem alguns pontos controvertidos presentes nas ADIs: obrigatoriedade das emendas parlamentares “individuais” e “de bancada” frente à separação dos Poderes e ao sistema presidencialista; cumprimento dos princípios da eficiência, economicidade e do planejamento na alocação orçamentária por meio de emendas impositivas, analisando os resultados em obras, bens e serviços públicos; compatibilidade do montante e do crescimento das emendas impositivas com a Constituição; e atendimento das emendas parlamentares às regras de responsabilidade fiscal.

Recordemos que no julgamento das Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) 850, 851, 854 e 1.014, o Plenário considerou inconstitucional o chamado “orçamento secreto”. Os processos questionavam o uso indevido das emendas de relator do Orçamento da União (identificadas pela sigla RP-9) para incluir novas despesas públicas ou programações no projeto de lei orçamentária anual da União.

A decisão seguiu o voto da relatora, da então ministra Rosa Weber (aposentada), para quem essa modalidade de emenda (anônima, sem identificação do proponente e clareza sobre o destinatário) viola os princípios constitucionais da transparência, da impessoalidade, da moralidade e da publicidade.

“Não é razoável supor que emendas parlamentares sejam alocadas a partir de dezenas de ofícios, sem que sejam assegurados dados abertos em sistema de registro centralizado que permitam a transparência ativa, a comparabilidade e a rastreabilidade por qualquer cidadão e órgãos de controle”, afirmou a ministra.

A propósito, o ministro Luís Roberto Barroso destacou que “em uma democracia e em uma república não existe alocação de recurso público sem a clara indicação de onde provém a proposta, de onde chega o dinheiro”.

Enfim, torna-se necessário que as relações entre Judiciário e Legislativo sejam, realmente harmônicas, pois como poderes da República apesar de possuírem funções distintas, estas são interconectadas.

Atualmente, o Legislativo assumiu protagonismo e, não para as causas positivas e assistimos um gradual esvaziamento do Executivo, depois, do Legislativo e, após, do próprio Judiciário em prol de pautas pouco significativas.

O Legislativo é responsável pela elaboração e aprovação das leis enquanto o Judiciário que se estende até o Supremo Tribunal Federal até os tribunais locais, possui a missão de interpretar e aplicar a legislação, julgando conflitos e dirimindo-os, garantindo a aplicação do direito e a concretização da justiça.

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

As informações e opiniões contidas no texto são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo obrigatoriamente o pensamento e a linha editorial deste site de notícias.

Se você chegou até aqui é porque tem interesse em jornalismo profissional, responsável e independente. Assim é o jornalismo do UCHO.INFO, que nos últimos 20 anos teve participação importante em momentos decisivos do País. Não temos preferência política ou partidária, apenas um compromisso inviolável com a ética e a verdade dos fatos. Nossas análises políticas, que compõem as matérias jornalísticas, são balizadas e certeiras. Isso é fruto da experiência de décadas do nosso editor em jornalismo político e investigativo. Além disso, nosso time de articulistas é de primeiríssima qualidade. Para seguir adiante e continuar defendendo a democracia, os direitos do cidadão e ajudando o Brasil a mudar, o UCHO.INFO precisa da sua contribuição mensal. Desse modo conseguiremos manter a independência e melhorar cada vez mais a qualidade de um jornalismo que conquistou a confiança e o respeito de muitos. Clique e contribua agora através do PayPal. É rápido e seguro! Nós, do UCHO.INFO, agradecemos por seu apoio.