Confira o conteúdo dos novos pedidos de inquérito contra Lula, o dramaturgo do Petrolão

Responsável pelo período mais corrupto da história nacional e réu em cinco ações penais que tramitam na primeira instância da Justiça Federal, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva está prestes a transformar-se em alvo de seis inquéritos criminais, fruto das bombásticas delações de dirigentes e ex-executivos do grupo Odebrecht, cujo sigilo foi levantado na última terça-feira (11). Os novos pedidos de investigações surgem em momento complexo para o petista, que tenta articular candidatura à Presidência nas eleições de 2018.

Sem direito a foro privilegiado desde janeiro de 2011, quando desceu a rampa do Palácio do Planalto, as seis petições foram encaminhadas pelo ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), para a Justiça Federal do Paraná, mas precisamente ao juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos resultantes da Operação Lava-Jato.

Em 2016, o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato, em bisonho espetáculo midiático, definiu Lula como “maestro da orquestra criminosa” e “grande general do esquema”. Em Curitiba, Lula é réu em duas ações penais por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Os novos pedidos de inquérito versam sobre suspeitas já conhecidas, como o recebimento de favores da empreiteira, incluindo a reforma do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia (interior de São Paulo), que de acordo com os investigadores é de propriedade do ex-presidente, algo que ele nega de forma recorrente. É possível que alguns dos inquéritos sejam integrados às investigações correspondentes ou a processos que já tramitam na capital paranaense.

A abertura de um inquérito é o primeiro passo de uma investigação criminal, que pode culminar em novos depoimentos e produção de provas. Isso significa que as autoridades envolvidas nas investigações poderão solicitar diligências, com direito a mandados de busca e apreensão ou condução coercitiva, caso o investigado não atenda às intimações para prestar esclarecimentos.

Ao comentar os novos pedidos de inquéritos, a defesa do ex-presidente disse que as “acusações são frívolas” e repletas de “falas, suposições e ilações e nenhuma prova” e que “as fantasiosas condutas atribuídas não configuram crime”. Em entrevista à Rádio Metrópole, em Salvador, Lula classificou a delação de Marcelo Odebrecht de “inverossímil e irreal”.

Lula deveria, antes de qualquer comentário esdrúxulo, explicar aos brasileiros como consegue custear uma numerosa equipe de advogados, que tem na proa o conceituado criminalista José Roberto Batochio. Fora isso, o petista contratou o advogado australiano Geoffrey Robertson, especialista em direitos humanos e com elegante escritório em Londres, para representá-lo junto à Organização das nações Unidas (ONU), em Genebra.

Os defensores de Lula têm o compromisso de evitar o pior, até porque foram contratados para tal, mas é impossível fugir à realidade. Enquanto o advogado Cristiano Zanin Martins insiste em rodopiar na mesma tese, de que seu cliente é inocente e vítima de perseguição política, os tranquilos delatores da Odebrecht prestam depoimentos devastadores e repletos de detalhes impressionantes, o que compromete cada vez mais o ex-metalúrgico.

Apenas para lembrar, os advogados do goleiro Bruno Fernandes de Souza, acusado de ser o mandante de Eliza Samudio, também alegavam ausência de materialidade do crime. Bruno foi condenado à sombra de um inquérito pirotécnico, com base apenas e tão somente em depoimentos de outros acusados.


Confira abaixo os detalhes dos pedidos de inquérito referentes ao ex-presidente Lula:

Petição 6.662 – Lobby em favor da Odebrecht para mudar legislação

Dois delatores relataram que, em 2015, a Odebrecht articulou com Lula e com o então ministro Jaques Wagner (Casa Civil) a elaboração de uma Medida Provisória que beneficiaria o grupo empresarial baiano, que à época já tinha sido alcançado pela Operação Lava-Jato.

A MP 703, assinada por Dilma no mesmo ano, abria a possibilidade de celebração de acordos de leniência diretamente com a então Controladoria-Geral da União, sem a participação do Ministério Público. Além disso, a empresa que assinasse um acordo poderia manter contratos com o governo.

Não ficou claro nas delações se a atuação de Lula e Wagner envolveu diretamente valores. A MP acabou perdendo efeito em maio de 2016, após não ter sido votada pelo Senado, em meio à turbulência do processo de impeachment de Dilma Rousseff.

Petição 6.664 – Lobby para beneficiar a Braskem

Em depoimento, Emílio Odebrecht e Alexandrino de Alencar, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, narraram que o governo Lula agiu em várias ocasiões para viabilizar a expansão da Braskem, braço petroquímico do grupo, que acabou atropelando a família Gorentzvaig, acionista da Petroquímica União, que acabou incorporada pelo grupo baiano. Em troca, milhões de reais teriam sido repassados para campanhas eleitorais do PT.

“Hoje compreendo que a nossa presteza e o nosso volume de pagamentos feitos a pretexto de contribuição para campanhas eleitorais […] contribuíram para a continuidade da privatização do setor petroquímico e nas decisões que tanto o ex-presidente Lula quanto outros integrantes do quadro do PT, que foram coincidentes com os nossos interesses”, disse Emílio.

Esse lobby teria feito com que Lula interferisse em negócios da Petrobras. Em 2005, por exemplo, ele teria convencido a Petrobras a não comprar parte da Petroquímica União, no Rio Grande do Sul. Dois anos depois, a Braskem tinha o terreno livre para adquirir a empresa gaúcha em um negócio espúrio e que vem sendo discutido intensamente na Justiça.

O lobby também teria contado com a participação dos ex-ministros Antonio Palocci Filho e Guido Mantega. Ambos teriam atuado para que a Braskem fosse beneficiada com a criação de um programa de refinanciamento de dívidas (Refis), que acabou salvando a empresa da falência. Em troca, a Odebrecht concedeu um crédito de R$ 50 milhões que poderiam ser usados em campanhas do PT.

Petição 6.738 – Lobby para beneficiar a Odebrecht em Angola

O pedido trata especificamente da atuação do ex-presidente em Angola, onde a Odebrecht estava à frente de várias obras de grande porte. O caso já rendeu a Lula um processo na Justiça Federal do Paraná.

Emílio Odebrecht afirmou às autoridades da Lava-Jato que, entre 2008 e 2009, várias dessas obras foram paralisadas por causa da crise financeira na ex-colônia portuguesa. Foi quando o grupo recorreu a ajuda Lula para a liberação de linhas de crédito do BNDES para os angolanos.

Na sequência, segundo depoimento de Marcelo Odebrecht, o ex-ministro Paulo Bernardo da Silva – Planejamento (Lula) e Comunicações (Dilma) – procurou a empresa por indicação do ex-presidente para pedir a bagatela de US$ 40 milhões.

“Veio o pedido solicitado por Paulo Bernardo, que veio por indicação do presidente Lula, para que déssemos uma contribuição de 40 milhões de dólares e eles estariam fazendo a aprovação de uma linha de 1 bilhão de dólares de exportação e crédito”, disse Marcelo.

Ao mesmo tempo, a Odebrecht também contratou a empresa Exergia Brasil, de Taiguara dos Santos, sobrinho da primeira esposa de Lula, que não possuía funcionários e nenhuma experiência na área de obras. Na verdade, Taiguara era um vidraceiro que atuava em Santos, onde se dedicava ao fechamento de varandas em edifícios da importante cidade portuária. Segundo o Ministério Público, a Odebrecht repassou R$ 30 milhões para a Exergia ao longo de cinco anos.

Petição 6.780 – Sítio e outros “presentes”

Os delatores da Odebrecht afirmaram que o grupo custeou despesas do ex-presidente, como a reforma do sítio em Atibaia, no interior de São Paulo, “a aquisição de imóveis para uso pessoal, instalação do Instituto Lula e pagamentos de palestras”. De acordo com o Ministério Público Federal, são “condutas que poderiam funcionar como retribuição a favorecimento da companhia”.

Em seu depoimento, Emílio Odebrecht, presidente do Conselho de Administração do grupo empresarial, disse que a reforma do sítio custou à empreiteira cerca de R$ 700 mil. O empresário afirmou que foi a ex-primeira-dama Marisa Letícia quem pediu ajuda para concluir as obras, em 2010, quando Lula estava prestes a deixar o Palácio do Planalto.

Lula já é réu em ação penal em Curitiba que o acusa de receber propina da Odebrecht na forma da compra de um terreno (avaliado em R$ 12,5 milhões), que seria usado para a construção do Instituto Lula.

Petição 6.841 – Mesada da Odebrecht para o irmão de Lula

O delator Alexandrino de Alencar detalhou como funcionava o esquema que viabilizou o pagamento de mesada a Frei Chico, sindicalista e irmão do ex-presidente Lula. Ele afirmou que, antes de 2002, o sindicalista prestou diversas consultorias na área sindical para a Odebrecht. Depois da posse de Lula como presidente, Frei Chico passou a receber uma mesada fixa, que variou de R$ 3 mil a R$ 5 mil reais ao longo dos 13 anos do PT no poder. Na planilha da Odebrecht, Frei Chico era chamado de “Metralha”. Sua filha tornou-se funcionária da Odebrecht.

O pedido de inquérito não detalha qual teria sido o papel de Lula no caso, mas o delator afirmou que o ex-presidente sabia de tudo. “Mantive uma mesada para ele [Chico] durante esses últimos 13 anos. Pelo fato de ser irmão do Lula, sem dúvida nenhuma”, disse Alexandrino.

Na entrevista concedida à Rádio Metrópole, de Salvador, Lula não negou o pagamento da mesada ao irmão, mas visivelmente nervoso afirmou que se isso de fato aconteceu é problema da Odebrecht.

Petição 6.842 – Lobby junto a Dilma em troca de ajuda para o filho

Os delatores relataram que Lula, após deixar a Presidência da República, teria se comprometido a atuar para melhorar a relação entre a Odebrecht e a então presidente Dilma Rousseff. Em troca, o grupo apoiaria a atividade empresarial desenvolvida pelo filho do ex-presidente, Luís Cláudio Lula da Silva. À época, Luís Cláudio desenvolvia o projeto “Touchdown”, iniciativa para popularizar o futebol americano no Brasil.

Emílio Odebrecht disse que patrocinou o projeto por três anos, com o pagamento de 50 mil reais mensais. Ele afirmou ainda que deu orientações e conselhos de empreendedorismo para Luís.

“Procurei dar, como meu filho fosse, um processo de formação e de empreendedorismo para que ele pudesse montar aquilo que desejava e tivesse sucesso”, disse. Segundo Emílio, o acordo rendeu frutos. “Marcelo [então presidente da Odebrecht] continuou e realmente passou a ter uma relação muito positiva com a Dilma.”

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