Cada vez mais preocupados com o avanço das investigações da Operação Lava-Jato e outras operações de combate à corrupção, deputados e senadores estão decididos a oficializar o Brasil como uma “cleptocracia”, onde a roubalheira sistêmica é contemplada com a impunidade generalizada.
Depois do entrevero que resultou no adiamento da decisão sobre o futuro do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que foi afastado do mandato parlamentar por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e alvo de outras medidas cautelares, como, por exemplo, recolhimento domiciliar noturno, parlamentares decidiram se antecipar, enviando à Corte novo parecer sobre as medidas impostas ao ainda presidente licenciado do PSDB.
No documento enviado ao STF, a advocacia do Senado argumenta que qualquer medida cautelar a congressistas é inconstitucional, afirmando que nenhum parlamentar pode ser suspenso por decisão do Poder Judiciário. Isso significa que o Congresso Nacional está disposto a alargar a crise institucional que chacoalha a República, pois o documento em questão mostra a indisposição de senadores e deputados para respeitar o que determina a legislação.
Em manifestação anterior, o Senado afirmou por meio de sua advocacia que apenas as medidas cautelares que resultam em afastamento do mandato eletivo deveriam ser submetidas ao Congresso em até 24 horas. Agora, com o desespero tomando conta da classe política, o Congresso quer ampliar o entendimento da lei máxima do País para beneficiar corruptos.
Na próxima quarta-feira (11), o plenário do STF julgará Ação Direta de Inconstitucionalidade que pede que a Corte considere a possibilidade de o Congresso rever, em até 24 horas, qualquer medida cautelar, que não a prisão em flagrante de congressistas por crime inafiançável, como prevê a Constituição.
Com ao menos treze senadores na mira de investigações e ações penais decorrentes da Operação Lava-Jato, o Senado tenta criar uma blindagem para evitar que medidas cautelares, como as impostas a Aécio Neves, alcancem novos congressistas. O novo parecer foi elaborado a pedido do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e teve as bênçãos do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O papel do Congresso é legislar, não interpretar a lei de acordo com o interesse ou a necessidade da classe política. A interpretação da lei é incumbência do Judiciário. Mesmo que o Congresso invoque a tese da inconstitucionalidade para tentar intimidar o STF, a decisão da Primeira Turma da Corte, tomada por 3 votos a 2, que impôs medidas cautelares a Aécio Neves encontra respaldo no artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).
Ademais, apelando à máxima do Direito que garante que “aquilo que não consta da lei é permitido”, as medidas cautelares são absolutamente legais. Por outro lado, o caso de Aécio não é passível de arguição de inconstitucionalidade, pois o recolhimento domiciliar noturno não é prisão, como pregam os congressistas tomados pelo desespero.
Se o Supremo ceder à pressão do Congresso, o caos instalado no País, que não é pequeno, há de se agigantar, mandando a democracia brasileira pelos ares. A opinião pública não pode permanecer silenciosa diante de mais um escárnio gestado pela classe política, pois em jogo está a liberdade dos cidadãos e o futuro da nação.