(*) Ucho Haddad
“Nada faz realçar mais a autoridade do que o silêncio, esplendor dos fortes e refúgio dos fracos.” (Charles de Gaulle)
Quem conhece com certa intimidade a política nacional sabe que Jair Bolsonaro é um ignorante contumaz que zomba da democracia, flerta com o totalitarismo e defende ditadores e torturadores. Esse comportamento que solapa o Estado de Direito é no mínimo crime de lesa pátria, devidamente explicitado na Lei nº 7.170, de 14 de dezembro de 1983.
Em seu artigo 1º, inciso II, a menciona Lei define como crime o que lesa ou expõe a perigo de lesão “o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito”. E não há dúvida sobre o desejo quase psicótico do presidente da República de atropelar a democracia brasileira, como se as excepcionalidades que cultua fossem ao menos aceitáveis.
O apreço doentio de Bolsonaro pelo autoritarismo balizou desde sempre a educação dos próprios filhos, que hoje, como agentes políticos, atuam como propagadores das estultices paternas, as quais têm como alvo constante a democracia e os direitos constitucionais do cidadão.
Eleito ao Palácio do Planalto aparentemente dentro das regras, apesar das transgressões generalizadas que marcaram a corrida presidencial de 2018, Jair Bolsonaro, ao deixar o Parlamento, tornou-se dependente de escândalos e polêmicas de maneira continuada, como forma de jogar uma cortina de fumaça sobre o imbróglio do dia anterior.
É impossível não reconhecer que a reação descontrolada de Bolsonaro à notícia da citação do seu nome no caso do assassinato de Marielle Franco seria precedida por alguma declaração absurda contra a democracia. Que ninguém pense ser o Palácio do Planalto uma reunião de pessoas bem-intencionadas e devotas do patriotismo, pois as entranhas do poder são muito mais assustadoras e perigosas do que qualquer festa “hardcore” de Halloween.
Ciente dos estragos que a desastrada e encomendada declaração do filho Eduardo sobre o resgate do Ato Institucional nº 5 poderia provocar, Bolsonaro entrou em cena rapidamente para colocar água fria em fervura que dificilmente será contida, pois em jogo está a democracia, o direito à manifestação e a liberdade de cada brasileiro.
Pressionado pelo pai, que pode ver ruir o seu castelo de areia, Eduardo Bolsonaro concedeu entrevista em que pediu desculpas pelo devaneio ultradireitista, mas isso não anula qualquer tentativa de cassação do respectivo mandato parlamentar, com direito a inelegibilidade por alguns bons e necessários anos.
Jair Bolsonaro, em entrevista, disse ter sugerido ao filho um pedido de desculpas por ter dito algo que as pessoas “não interpretaram corretamente”. Bolsonaro tem o direito de proteger seus rebentos, mas que para tal deixe a Presidência da República, que está longe de ser playground de pessoas truculentas e que acreditam ser donas do País. Esse discurso malemolente e visguento de que a sociedade não interpreta adequadamente as declarações do clã e é conversa fiada de quem não tem coragem de assumir as responsabilidades pelos próprios atos.
“Eu fui eleito democraticamente, ele foi o deputado mais votado da história do Brasil. Falei para ele ‘se desculpa, pô, junto àqueles que porventura não interpretaram você corretamente’, falei ‘não tem problema nenhum, se desculpa, sem problema nenhum’. Agora, o que a gente fica chateado aqui? Qualquer palavra nossa, palavra, né, num contexto qualquer vira um tsunami. A gente lamenta, eles sabem disso, eu falo disso com meus filhos”, declarou o presidente da República.
Picado pela mosca da delinquência intelectual, Bolsonaro deveria ter um lampejo de coragem e abandonar o posto, antes que o pior aconteça no País. Se a família presidencial continuar apostando na radicalização do discurso como senha para a implantação de um regime de exceção, que coloque as barbas de molho, pois o poder de reação da sociedade é muito maior do que imagina o clã de milicianos.
Não custa ressaltar que Jair Bolsonaro, agindo como quase ditador de fato, governa de acordo com os interesses de uma minoria ignara que defende o retorno do autoritarismo para impedir a esquerda de existir e reagir, como se a Carta Magna não garantisse a liberdade ideológica.
Esse cenário de aviltamento constante da democracia por parte dos apoiadores e adoradores de Bolsonaro cabe com precisão em frase dita pelo facínora Adolph Hitler: “Que sorte para os ditadores que os homens não pensem”. E a patuleia bolsonarista simplesmente não pensa, o que explica o fato de agir como instrumento de repetição.
Aliás, por falar em Hitler, o presidente brasileiro deve ter pregado na porta do guarda-roupa, ao lado de uma fotografia do “führer tupiniquim” Carlos Alberto Brilhante Ustra, outra do nazista-mor e responsável pelo Holocausto.
Ademais, faz-se necessário lembrar que Bolsonaro, durante encontro com evangélicos no Rio de Janeiro, disse que o Holocausto pode ser perdoado, mas não esquecido.
“Fui, mais uma vez, ao Museu do Holocausto. Nós podemos perdoar, mas não podemos esquecer. E é minha essa frase: Quem esquece seu passado está condenado a não ter futuro. Se não queremos repetir a história que não foi boa, vamos evitar com ações e atos para que ela não se repita daquela forma”, afirmou Jair Bolsonaro na ocasião, sendo, em seguida, alvo do repúdio dos judeus.
Pois bem, se, de acordo com as palavras do próprio Bolsonaro, não se pode “repetir a história que não foi boa”, que o pífio presidente livre-se da frouxidão como pai e enquadre o quanto antes os próprios filhos, se é que isso ainda pode surtir algum efeito.
Como disse o jornalista e crítico norte-americano Ambrose Gwinnett Bierce (1842 – 1914), “ditador é o chefe de uma nação que prefere a peste do despotismo à praga da anarquia”. Sou contrário à anarquia, mas espero que o tosco rebento presidencial não tente colocar em prática aquilo que acredita e defende, pois o monstro adormecido quando desperta torna-se imparável.
(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, escritor, poeta, palestrante e fotógrafo por devoção.
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