(*) Carlos Brickmann
É simples entender o que está acontecendo no Brasil. No mundo inteiro, em situações de crise, quem sabe não fala, quem fala não sabe. Aqui, só fala quem não sabe. No mundo inteiro, um tribunal supremo é um conjunto de juízes, que têm título de ministros, e decidem incontestavelmente, por consenso ou maioria, o que está ou não de acordo com a Constituição. Aqui, o tribunal supremo permite que, individualmente, ministros tomem decisões, que podem ser contestadas por outro ministro, ou um grupo de ministros.
O ex-presidente Lula foi condenado após processos confirmados por tribunais hierarquicamente superiores. E inocentado, à espera de novo julgamento, porque deveria ter sido julgado em Brasília e não em Curitiba. Deve haver alguma lógica nesse raciocínio, mas por que, de acordo com a Constituição, o julgamento em Curitiba não vale e em Brasília vale?
Que é que este colunista acha da decisão? Nada: se nem os ministros do Supremo, que estudaram no Brasil e no Exterior, falam diversas línguas, todas elas em latim, se põem de acordo, que é um leigo pode dizer? Apenas, por conhecer o Brasil – e isso não envolve qualquer exame da culpabilidade ou não de Lula, nem vontade alguma vê-lo inelegível ou preso – que, a menos que a decisão seja revista agora, não vai haver outro julgamento. Sempre irá algum ministro sentar-se em cima da decisão, e o tempo passa.
E quem disser que sabe o que vai acontecer é certamente mal informado.
Pistom de gafieira
Culpa do Supremo? Talvez em parte. Mas, como ensina o mestre Billy Blanco, quando há confusão na gafieira a orquestra toma providências para a polícia não chegar. E a certa altura, como parte da rotina, o pistom tira a surdina e põe as coisas no lugar. O Brasil virou uma gafieira desorganizada, em que a orquestra erra na música e alguém chama a polícia – no caso, o Supremo. E não há nenhum pistom que possa pôr as coisas no lugar.
Data venia, ad aspera per astra, o STF manda. Não tem votos, não tem políticos de competência capazes de conversar e compor. O resultado é este.
Quem lucra?
Quando o ministro Edson Fachin anulou as condenações de Lula, muitos acharam que a decisão beneficiaria os dois extremos da política: Lula, que voltou a poder candidatar-se, e Bolsonaro, que estaria à vontade contra o adversário que supostamente preferiria. Quem quer se livrar de Bolsonaro vota em Lula, quem não quer Lula vota em Bolsonaro. Só que política é um pouco mais complicada. Lula fez um bom discurso paz e amor, dizendo o que acha necessário fazer (por incrível que pareça, nenhum outro candidato tinha se dado a esse trabalho). Bolsonaro começou a se mexer, tentando comprar vacinas. Não conseguiu, mas criou ótimas fake news: disse, como boa notícia, que a Fundação Oswaldo Cruz entregaria 30 milhões de vacinas em março (só que a previsão era de 48 milhões). Mas fez o que sabe.
O terceiro nome
É preciso ter cuidado com questões judiciais: e se o STF anular a decisão de Fachin? E se uma candidatura centrista decolar, contra Lula e Bolsonaro?
De acordo com a Paraná Pesquisas, quem se saiu melhor após a decisão do ministro Fachin foi o ex-juiz Sergio Moro. Não foi pesquisa eleitoral: foi sobre sua imparcialidade. E 59% disseram que Moro foi imparcial ao condenar Lula, contra 35% que o acharam parcial. Mas, mesmo não sendo pesquisa eleitoral, mostra algo interessante: se a maioria dos ouvidos considera que Moro foi imparcial, considera também que Lula é culpado.
Boa notícia
A GlaxoSmithKline, do Reino Unido, e a Vir Biotechnology, dos EUA, anunciaram um remédio contra a Covid 19 que, nos testes, reduziu mortes e dias de hospitalização em até 85% – um número espetacular. O VIR-7831 já está sendo levado à FDA, a rigorosa agência americana de supervisão, com pedido de autorização para uso emergencial. Dizem as empresas que grupos de cientistas independentes acompanharam o desenvolvimento e consideram desnecessários novos testes. É o terceiro remédio contra Covid: outros dois são produzidos pela Elly-Lilly e Regeneron Pharmaceuticals – o Regeneron foi utilizado no tratamento do então presidente Donald Trump.
O Instituto Butantan solicitou à Anvisa que autorize testes no soro contra Covid que acaba de desenvolver, mas ainda não recebeu resposta.
As notícias de sempre
O Governo Bolsonaro, apesar da decisão do presidente de usar máscara, e da ideia do filho 03 de que até se coloque máscara em outro local, continua mal em questões médicas. A Agência Nacional de Saúde Suplementar está há 16 meses sem presidente, informa Lauro Jardim, de O Globo. Há quase um ano sobram três cargos vagos na diretoria da agência. Será que faltam militares para Bolsonaro nomear? A ANS é quem cuida de seguros médicos e convênios e deveria acompanhar os brutais aumentos de preços do setor.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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