(*) Carlos Brickmann
Boris Casoy, ótimo jornalista, em geral tem razão: frases como “é preciso passar o Brasil a limpo” e “Isto é uma vergonha” são incontestáveis, tão corretas que muitos homens públicos brasileiros dedicam a vida a fingir que não é com eles – e, claro, a lutar contra essa história de passar o Brasil a limpo. Por algum motivo, sentem-se muito mal com essa possibilidade.
Mas Boris Casoy não é infalível. Comentando na CNN o desempenho do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, durante a pandemia, disse: “Ministro, o senhor tem um encontro marcado com Satanás. Não se esqueça disso. O senhor vai ter um diálogo longo, duro e penoso com Satanás devido às atitudes que o senhor tem tomado, inclusive de submissão, em vez de assessorar e esclarecer o presidente. O senhor obedece a desígnios políticos. Então, vai ser fogo, ministro.”
Engano, Boris: Sua Excelência está habituado a contatos com autoridades infernais, ao menos desde que se transformou no homem de confiança do presidente Bolzabu. Acredita na tradução do latim do nome de Lúcifer, “portador da luz”. Na sua tarefa de contribuir ao máximo para que a rapidez da vacinação seja mínima, tem a inestimável ajuda de hierarcas infernais, como Asnodeu, Capetão, Pazuzu (e dizem até que de outros demônios infiltrados na Terra, que se assemelham a seres humanos e só podem ser identificados por seu olhar diabólico).
Não, Boris: Satanás não assusta o ministro. Ninguém se assusta ao encontrar companheiros de luta.
Quem não deve…
Bolsonaro não compareceu à Polícia Federal para prestar depoimento no inquérito que apura o vazamento, numa de suas aparições, de dados sigilosos sobre adversários. Havia uma ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF, para que prestasse depoimento. E daí? Não se sabe: as interpretações variam. Meu palpite é de que as coisas vão ficar como estão, para evitar a crise. Há quem diga que desobedecer à ordem do STF é crime e seria o caso de conduzi-lo à força. E há quem diga, também, que como é investigado e não testemunha, Bolsonaro não é obrigado a depor. Depor como investigado faz parte da defesa, e ele poderia, portanto, preferir não falar.
Mas, como este é o país dos não-fatos (o blogueiro Allan dos Santos, por exemplo, está com prisão decretada e não aconteceu nada), é provável que tudo fique como está.
…não Temer
O ex-presidente Michel Temer, que redigiu a carta de desculpas assinada por Bolsonaro para pedir desculpas ao ministro Alexandre de Moraes (logo após o 7 de Setembro, quando o presidente ameaçou fazer e acontecer mas se aquietou em seguida), disse que sua tarefa já foi cumprida e que não tem nada a ver com os atuais problemas entre STF e Presidência.
Temer, no 7 de Setembro, esfriou uma crise. Mas não vai passar toda a sua vida escrevendo pedidos de desculpas para quem não consegue se comportar civilizadamente.
Anulou, e daí?
Bolsonaro anulou 25 decretos de luto oficial, cassando gente como o ex-ministro Roberto Campos (avô de seu diretor do Banco Central, Roberto Campos Neto), D. Hélder Câmara e Darcy Ribeiro. E daí? Daí, nada: os decretos foram cumpridos por ocasião das mortes e seus efeitos práticos já foram cumpridos. Por que a cassação? Com certeza, vontade de aparecer.
Moro, problema um
Se vai dar certo é outro problema. Mas tanto o Podemos quanto Sergio Moro acreditavam que, tão logo houvesse o lançamento de sua candidatura, o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro apareceria bem nas pesquisas. Não foi bem assim; e agora, levanta-se a possibilidade de Moro passar para a União Brasil, novo partido que deverá unir o PSL ao DEM. Está difícil, porém: o PSL tem uma grande verba para gastar, graças às bancadas eleitas na campanha de Bolsonaro em 2018, mas quem tem estrutura nacional é o DEM. O pessoal do DEM acha que embarcar na candidatura Moro só é bom para o cacique do PSL, Luciano Bivar, que quer se candidatar a vice.
Moro, problema dois
Mas, mesmo que o cacique do PFL fosse o mais beneficiado com Moro na cabeça de chapa, o DEM não teria vantagens com um candidato forte? Sim, mas poucos no DEM acreditam na força de Moro. De acordo com suas pesquisas, o principal tema eleitoral será a economia: fome e desemprego.
A corrupção, tema principal de Moro, estará em segundo plano. Importante, agora, é saber que os aluguéis com aniversário em fevereiro podem ser reajustados em 16,91%, acompanhando o IGPM. Quem teve 16,91% de aumento salarial no último ano? Pois é esta a preocupação do eleitor.
Voa, dinheiro!
Apenas para ilustrar o custo desta campanha eleitoral, paga com o nosso dinheiro: o valor do Fundo Eleitoral, de R$ 4,9 bilhões, equivale a pouco mais de sete vezes o que o Governo Federal gastou com a Anvisa em 2021, com pandemia e tudo. A Anvisa recebeu R$ R$ 663,5 milhões.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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