(*) Carlos Brickmann –
Em quatro capitais, São Paulo, Rio, Goiânia e Natal, houve manifestações e tumultos contra o aumento das tarifas de transporte público. Em São Paulo, vândalos misturados a militantes de partidos radicais puseram fogo em bancas de jornais na Avenida Paulista, que dá acesso, entre outros equipamentos urbanos, a nove hospitais, e ficou interditada por algumas horas; quebraram lixeiras, depredaram estações de Metrô, chutaram carros de quem nada tinha com isso, invadiram um shopping. A tropa de choque dissolveu o tumulto com gás lacrimogêneo.
Há alguns fatos curiosos a examinar. O primeiro é que Movimento Passe Livre, que organizou a manifestação, foi criado pelo Fórum Social Mundial, onde se reúnem bolivarianos de várias partes do mundo por conta do nosso dinheiro, canalizado pelo Governo gaúcho. O segundo é que a tropa de choque paulista estava nas ruas na véspera da manifestação. Aparentemente, sabia de tudo, e apenas esperava a oportunidade de, bem postada, dissolver o eventual tumulto.
O fato é que há vários indícios de crise, muitos com origem na ação ou inação do Governo Federal. Há dois anos, ninguém, exceto meia dúzia de saudosistas, pensava em militares. Hoje, com a ação nem sempre equânime das comissões da verdade, há em organização até um Partido Militar, e antigos torturadores voltam a ser ouvidos – por poucos, sim, mas que buscam articular-se. A inflação ficou livre por muito tempo, o crescimento é baixo, a dívida das famílias é alta.
Para o clima tornar-se explosivo, faltava a baderna. Não falta mais.
Mais um pouco
1 – A agência de classificação de riscos Standard&Poor’s rebaixou as notas do Brasil, em vista do baixo crescimento econômico, do investimento declinante do setor privado e da deterioração da política fiscal do Governo. Prevê a SP um terceiro ano seguido de baixo crescimento e a redução no consumo das famílias.
2– A revista britânica The Economist brinca com o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Referindo-se às informações de que Mantega se fortalecera após ter recebido críticas da revista, a Economist fez-lhe elogios, dizendo que agora o Governo brasileiro pode demiti-lo sem parecer que está cedendo a pressões.
3 – A balança comercial brasileira teve déficit de US$ 5,4 bilhões de janeiro a maio. Comparada a igual período do ano passado, quando o superávit foi de US$ 6,26 bilhões, a queda é de US$ 11 bilhões. É o pior resultado já obtido pelo país.
E que temos a ver com isso? Tudo: os estrangeiros estão avisados de que é arriscado trazer dinheiro. Os negócios com o Brasil ficam mais caros. E, como dizia o ministro Mário Henrique Simonsen, inflação aleija e crise cambial mata.
Resumo geral
O problema é que o PIB é pequeno e o buraco é grande.
Transporte gratuito
A tese do transporte gratuito, que os manifestantes dizem defender, surgiu de um estudo de Lewis Mumford, grande especialista de planejamento urbano dos EUA, condecorado pelo presidente Ronald Reagan. Dizia ele que, como num prédio, em que o transporte por elevadores é custeado pelos condôminos, uma cidade deveria ter transporte público custeado pelos contribuintes.
Em São Paulo, a prefeita Luiza Erundina, do PT, propôs a tarifa zero, mas dois problemas fizeram com que a ideia fosse rejeitada: primeiro, o caráter partidário que a cercou; segundo, o que fazer com pessoas que quisessem passar o dia inteiro no ônibus, como se fosse sua casa, indo e voltando, indo e voltando. A ideia é defensável. Mas não é preciso botar fogo em nada nem jogar pedras para defendê-la.
Agora vai
Crise nenhuma, caro leitor. Seus problemas acabaram. Numa decisão histórica, a Justiça paulista determinou padrões de roupas adequadas para homens e mulheres. Quem estiver fora desses padrões pode ser barrado na entrada do Fórum Regional de Santana. Vejamos o must da moda forense: estão proibidos “decotes profundos a ponto de deixarem mais da metade do colo dos seios visíveis” (o português é mambembe, mas que fazer?), e roupas “transparentes a ponto de permitir entrever-se partes do corpo ou de peças íntimas”.
Homens não podem usar “camisetas com gola ‘U’ ou ‘V’ que deixe mais da metade do tórax exposto”. Saias têm de cobrir dois terços das coxas. Blusas sem alças, ou gente descalça, não. E pobres que andam sem sapatos? Dependerão do que o juiz determinar, se conseguirem entrar para fazer o pedido.
Também, quem manda ser pobre?
Tá faltando uma
A Agência Nacional de Aviação Civil, ANAC, abriu processo administrativo para apurar se Flora, esposa do ex-ministro Gilberto Gil, esteve durante o voo na cabine de comando de um jato da Azul. Flora postou fotos no Instagram em que aparece na cabine, sentada, com cinto afivelado e usando radiocomunicador, ao lado de piloto ou copiloto. Se o avião estivesse em terra, parado, tudo bem; em movimento, é proibido (e por isso a TAM teve problemas quando o cantor Latino postou fotos da cabine durante o voo). OK, lei é lei, é para ser cumprida.
Mas a presidente Dilma Rousseff, que abertamente interfere na rota do avião e dá ordens ao piloto, tudo bem? Manda quem pode, obedece quem tem juízo?
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.