À toa. E com a Década de 10 à frente

    (*) Marli Gonçalves –

    Estava à toa na vida. Meio à toa, porque a gente jornalista não para de pensar nem quando dorme e sonha misturando tudo. Alguém pode me dizer por quais cargas de água eu sonhei uma noite inteira com a Erundina se casando? Pois foi.

    Sonhei que ela se casava, com direito a uma festa grande, em algum lugar que não reconheci, mas onde havia, entre outras, duas casas de veraneio (ou inverneio) de advogados criminalistas que disputavam entre si a recepção. Non sense total, mas não me perguntem dos detalhes reais do casório, que não lembro; muito menos com quem ela casava. Recordo-me só que ela estava com tailleur nude. Meio rosáceo “Boto”. E o cabelo era o tal cabelo de mãe de noiva, que eu nem sabia que era uma categoria de penteado. No meu sonho, Erundina parecia com a Dilma, e temo que possa ter sido alguma premonição. E antes que me perguntem também, digo que sempre gostei muito da Luiza Erundina, uma das primeiras mulheres no poder, embora ache que de vez em quando ela pise seriamente na sua trajetória. Também afirmo que não bebo. Portanto, não foi ressaca.

    “Queridos brasileiros e brasileiras”…Claro que o ocorrido foi na noite de sábado, dia 1º de janeiro, para domingo, depois da overdose da posse da primeira mulher presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e de ter passado a tarde meio de bobeira, dando risadas com as tiradas e fatos e fotos da cobertura. Vou dizer, recomendo para o fígado. Toda vez que ocorrer um fato grande assim, com cobertura, faça isso: corra para o Twitter. É como se você estivesse numa sala de visitas com um monte de gente. Sabe aqueles comentários que a gente faz na frente da tevê? – Nem vem que você faz também! – e que são quase chulos ou bobos? Tipo a roupa de uma, o cabelo da outra, o terninho apertado do Alan Severiano, a gafe daquele, os quilos a mais daquela, e as boquitas e expressões, ou o lapso do outro. Vai ver como é verdade, como a gente pensa igual, ou repara igual a todo mundo, o que todos acham, transmitido do sofá.

    Nada escapa. Eles estarão no Twitter, que reúne o maior numero de gaiatos que já encontrei. Aprendi isso durante a Copa do Mundo, com aqueles jogos chatos e durante a apuração das eleições. Para isso servem os tais 140 caracteres. Para nocautear. “Celso Kamura eh um hibrido de Yoko Ono e Clodovil”; “Onde o Sarney comprou essa tinta de cabelo num tinha pra bigode?”; (@claudiotognolli). “Encontrei algo em comum com o Michel Temer. Adivinhem!” (@FGaristo). “Sabia que o Temer teria alguma coisa boa! À direita dele, de marrom” (@mauro_beting) – para citar algumas, as republicáveis.

    Enfim, a overdose total veio depois de ouvir os discursos do óbvio, três Hinos Nacionais, e muita gente passando rodo no Palácio, enxugando o Planalto, e dizendo “foi com muita emoção”, ou “a presidente eleita se emocionou” (e a própria lá, com uma cara só, que agora inventou e grudou na face); depois de ver um monte de canhões, puxa-sacos, gente que era para ter ido e voltou, e do selinho dela na bandeira (que aquilo não foi bem um beeeijo). Claro: depois de não ter mais nada em que reparar. Não admira que tenha sonhado aquilo. E que já implore: é mínimo nosso interesse pela Bulgária, ok?

    Assim passou o primeiro dia da Década de 10. Indo para a de 20. Quantas transformações reais ocorrerão? Quais os desafios? Décadas a gente olha sempre depois que elas passam. E precisamos pensar muito, prestar atenção para reparar o que mudou e a gente nem viu. O que e quem entrou e o que saiu. Inclusive da sua própria vida. Pequenas e grandes coisas. O tamanho do cream-cracker, por exemplo, diminuiu. Os rolos de papel higiênico aumentaram. Continuamos, contudo, sem saneamento básico para todos.

    As plásticas e os plásticos foram discutidos. A China está chegando lá. A Internet se instalou em nossas vidas, fazendo rebolar todos os meios de comunicação. As energias renováveis ainda engatinham, enquanto o futuro é içado das profundezas. O global não impede as pendengas religiosas, e fanatismos específicos se alastram. Uma nova sexualidade, com um cardápio repleto de opções, está em campo, sendo que ainda não resolvemos nem as dúvidas advindas da recente liberação feminina.

    Continuamos com mais de 30 um monte de coisas, inclusive ministros, enquanto esse número diminui onde se desenvolvem as potências. Nossa corrupção continua com aquela imagem ladina e latina, preservada pela verdade dos fatos, agora gravados em imagens e sons digitais, em canetas, botões, relógios – sem a graça do Sherlock Holmes de cem anos atrás.

    Década de 10, 100 anos atrás, teve a Primeira Guerra Mundial, a Revolução Russa. Os automóveis se desenvolveram, enquanto o Titanic afundava. Grandes movimentos artísticos cresceram, registrando, denunciando, fantasiando ou não. Apenas pirando, como o jazz, o cubismo, o dadaísmo. Pragas também chegaram – a mais marcante, a Gripe Espanhola.

    Por aqui, 100 anos depois, o que esperamos nos próximos 10? A cura para a outra praga que nos dizimou, a AIDS; que a arte floresça, por sua incrível capacidade de denúncia e difusão. Que haja mais justiça e fraternidade, levando em conta a cidadania; que a vida volte a valer alguma coisa.

    Pronto, começou. São os primeiros dias dos nossos próximos dez anos. Que a Década seja de ouro, como proclamou o Rio de Janeiro. Mas que os garimpeiros deste brilho se controlem, para não deixar nenhuma Serra Pelada pelo caminho.

    São Paulo, semi-férias, já em 2011. Na verdade, só um dia depois de outro. E eu estou prometendo dar uma chance.

    (*) Marli Gonçalves é jornalista. A vida é um punhado de desejos, que saímos buscando, esperando encontrar. Há quem consiga. E isso é bom.

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