Procuradoria contesta lei que reconhece a profissão de motoboy e mototaxista

A Procuradoria-Geral da República resolveu comprar uma briga com milhares de motoboys e mototaxistas e um exército de políticos que apoia a categoria em todas as partes do Brasil. Em 2007, a Câmara dos Deputados chegou a criar a Frente Parlamentar Mista pela Regulamentação da Profissão de Mototaxista e Motoboy com a participação de 240 parlamentares.

Sob o argumento de que o transporte de pessoas gera grave prejuízo à saúde, o procurador-geral Roberto Gurgel, entrou com ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra a Lei 12.009. A Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) informa que 31% das mortes no trânsito são de motociclistas. Outros 41% das vítimas são pedestres, e 24%, passageiros de carro.

A lei de 2009 regulamenta o exercício das profissões de motoboy, mototaxista e profissionais de serviço comunitário de rua. No mês passado começaram a valer este mês os cursos de mototaxistas e motoboys exigidos pelo Conselho Nacional de Trânsito para as cidades que regulamentaram as profissões. Os motociclistas já fazem aulas em São Paulo e no Rio Grande do Sul, onde o número de acidentes diminuiu.

A ação pede a concessão de medida cautelar em razão do perigo na demora em seu julgamento e será analisada pelo ministro Ricardo Lewandowski, relator da matéria no STF.

De acordo com a ação, os dispositivos questionados ferem artigos da Constituição Federal e os princípios constitucionais da razoabilidade e da proibição de proteção deficiente. Na Câmara dos Deputados há vários projetos que reconhecem e ampliam as atividades desses profissionais.

Um deles regulamenta curso especializado para profissionais em transporte de passageiros (mototaxista) e em entrega de mercadorias (motoboy). Em outro, o deputado Celso Russomanno (PP-SP), que obriga as empresas que utilizam serviço de motoboy – próprio ou terceirizado – a contratarem seguro de vida e de invalidez permanente por acidente para os motociclistas

Na ação do Ministério Público Federal, Gurgel e a vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, pedem que as expressões “em transportes de passageiros, mototaxista, constante do artigo 1º, e “ou com as normas que regem a atividade profissional dos mototaxistas”, presente no artigo 5º, sejam impugnadas. A ação ainda questiona o inciso II, do artigo 3º, da lei em questão.

Prejuízo à saúde pública

Em texto elaborado pela assessoria de imprensa, a Procuradoria Geral da República afirma que “a regulamentação do transporte de passageiros em motocicletas representou grave prejuízo no campo da saúde pública, por quase nada dispor sobre a prática de uma atividade sabidamente perigosa, permitindo, ao contrário, que o risco de acidentes aumente, inclusive, fatais”. Ela explica que não foram observados o direito fundamental à saúde (artigo 6º da Constituição Federal) e o dever do Estado de adotar medidas que visem à redução do risco de agravos à saúde (artigo 196 da CF).

A ação destaca que as normas impugnadas também violam o princípio constitucional da razoabilidade (artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal), na sua dimensão substantiva. “A falta de razoabilidade ainda decorre da constatação de que, no tocante à atividade de transportes de mercadorias – “motofrete” -, foram estabelecidos critérios muito mais rigorosos do que em relação ao mototaxi, o que gera um especial contrassenso: admite-se maior proteção no transporte de coisas do que no de pessoas”, ressalta.

A PGR também cita o princípio da vedação à proteção deficiente de bens jurídicos constitucionais tutelados. Esse princípio representa uma das facetas do princípio da proporcionalidade e, portanto, o Estado tem o dever de agir na proteção de bens jurídicos de índole constitucional. “A doutrina vem assentando que a violação à proporcionalidade não ocorre apenas quando há excesso na ação estatal, mas também quando ela se apresenta manifestamente deficiente”, explica.

A ADI ainda destaca que “a violação à proporcionalidade, na sua faceta de proibição à proteção insuficiente, materializa-se, no caso, pela regulamentação ineficaz, ou ao menos insuficiente, da prestação de um serviço de altíssimo risco para a saúde, e até para a própria vida de seus usuários”.