Governo federal anuncia contenção de gastos, mas em uma só tacada libera R$ 26,6 bilhões

Discurso duplo – As queixas contra a liberação de recursos pelo governo federal, previstos no Orçamento Geral da União, não são poucas e não devem terminar tão cedo. Desde 2007, por exemplo, o Espírito Santo recebe menos de 10% do que é previsto. Do orçamento para investimentos, aprovado pelo Congresso em 2008 para 2009, a União só pagou ao estado R$ 4 milhões, dos R$ 168 milhões.

Ao usar outros critérios, entretanto, o Palácio do Planalto autorizou o pagamento de R$ 32 bilhões através de Medidas Provisórias entre 2010 e 2011. Foram nove MPs que abriram crédito extraordinário de R$ 35 bilhões para diversas áreas do governo. Desse total, R$ 32 bilhões (91,4%) não obedecem ao critério constitucional que estabelece recursos extraordinários apenas em situações imprevisíveis, como guerra, comoção interna ou calamidade pública.

De acordo com levantamento da assessoria técnica do PPS revelado ontem (14), as liberações passam por cima da Constituição, que só admite Medida Provisória de crédito extraordinário em casos urgentes e imprevisíveis, como de guerra, comoção interna ou calamidade pública. O caso mais gritante de desrespeito verificado pelo PPS refere-se a MP 515/2010, editada em 28 de dezembro de 2010, e que ainda precisa ser apreciada pelo Congresso Nacional. Nela, em uma canetada, o governo libera créditos extraordinários de R$ 26,67 bilhões. O Planalto simplesmente reuniu todos os projetos (PLNs) enviados por ele e não apreciados pelo Legislativo em 2010.

Líder do partido na Câmara, Rubens Bueno (PR) critica o governo que há uma semana anunciou cortes de R$ 50 bilhões. “Está claro que o governo promoveu uma verdadeira farra com o dinheiro público e descumpriu a Constituição com o apoio de sua base no Congresso. Agora, quer posar de austero e anuncia cortes no Orçamento como se não tivesse nenhuma culpa da situação em que chegamos”.

Nove Medidas Provisórias suspeitas

MP 480/2010 – total R$ 1,37 bilhão, dos quais R$ 394 milhões são para obras preventivas de desastres, socorro às vítimas e restabelecimento da normalidade.Portanto, R$ 976 milhões são para ações que não contemplam, principalmente, o requisito de imprevisibilidade;

MP 485/2010 – total R$ 1,6 bilhão. Os recursos deveriam ser solicitados ao Congresso por meio de Projeto de Lei de Crédito Suplementar ou Especial – PLN. Não se carecteriza relevância, urgência e imprevisibilidade concomitantemente;

MP 486/2010 – total R$ 1,43 bilhão, dos quais R$ 530 milhões são para obras preventivas de desastres, socorro às vítimas e restabelecimento da normalidade. Portanto, R$ 900 milhões são para ações que não são imprevisíveis;

MP 490/2010 – total R$ 1, 28 bilhão. Nesse caso também a totalidade dos recursos deveria ser solicitada por PLN, uma vez que não estão caracterizadas a relevância, a urgência e a imprevisibilidade concomitantes;

MP 498/2010 – total R$ 1,97 bilhão, dos quais R$ 1,04 bilhão é para obras preventivas de desastres, socorro às vítimas e restabelecimento da normalidade. Portanto, R$ 930 milhões são para ações que não são imprevisíveis;

MP 506/2010 – total R$ 210 milhões. Esse é o caso em que realmente há relevância, urgência e imprevisibilidade. Os recursos foram destinados ao aporte no Fundo Garantia-Safra para atender aos pequenos agricultores que tiveram quebra na safra de 2009/2010. Situação totalmente imprevisível;

MP 508/2010 – total R$ 968 milhões. Nesse caso também a totalidade dos recursos deveria ser solicitada por PLN, já que não estão caracterizadas a relevância, a urgência e a imprevisibilidade concomitantes;

MP 515/2010 – total R$ 26,67 bilhões. Essa MP deve ser analisada em especial. Trata-se de um crédito extraordinário que reúne todos os PLN’s não apreciados pelo Congresso em 2010. O Governo pode até argumentar que as ações contidas na MP foram objeto de PLN, contudo, tais projetos tramitaram no Congresso Nacional até o final da Sessão Legislativa passada, 22/12/2010, e não foram apreciados pela Casa, o que importa em rejeição tácita pelo Poder Legislativo das matérias em questão;

MP 522/2011 – total R$ 780 milhões. Outro exemplo em que realmente há relevância, urgência e imprevisibilidade. Os recursos foram destinados para ações de obras preventivas de desastres, socorro às vítimas e restabelecimento da normalidade nas áreas atingidas pelas chuvas no estado do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, etc. Situação totalmente imprevisível.