Além de água, alimento, ar e moradia, a internet é considera como essencial para sobreviver

Perigo e doença – Do que um ser humano precisa para sobreviver? Sem ar, uma pessoa pode desmaiar em menos de dois minutos. Sem comida, morre em 45 dias. Sem um litro diário de água, não sobrevive mais do que sete dias. Os dados, da National Geographic, representam a estimativa para um homem adulto, com cerca de 68 kg. Agora, acredite: tem muita gente dando à internet o mesmo peso desses elementos essenciais para a vida.

O estudo Connected World Technology Report, encomendado pela Cisco (empresa líder do setor de redes), entrevistou 2,8 mil universitários e jovens trabalhadores (com até 30 anos) em 14 países diferentes; entre eles, o Brasil.

O resultado mostra que quatro em cada cinco pessoas dos dois grupos consideram a web um recurso tão fundamental como ar, água, alimento e moradia. O estudo investiga a relação do homem com a difusão das redes e oferece uma ideia do pensamento e das expectativas da próxima geração da mão de obra mundial.

Mais da metade dos entrevistados brasileiros (66% dos estudantes e 75% dos jovens que trabalham) se identifica com a situação e afirma não conseguir viver longe do mundo virtual. Se tivessem de optar entre o carro e a rede mundial, cerca de dois em cada três (63%) escolheriam a internet.

E mais: mundialmente, um em cada cinco universitários (21%) não compra um livro físico (com exceção dos escolares) há mais de dois anos. Dentre os brasileiros, 34% jamais fizeram essa aquisição.

De acordo com o doutor em psicologia Marcos Abel, a vida humana está transcorrendo em um mundo progressivamente artificial. O estudioso, que já trabalhou na área de informática por cerca de 10 anos, reconhece que a rede é importante tanto para o trabalho como o lazer. Mas problemas podem se manifestar quando o virtual substitui o real em grande medida ou inteiramente. Quando o amor ou o sexo virtuais têm preferência sobre os reais.

Para o psiquiatra e professor da Universidade de Brasília Rafael Boechat, o conceito de dependência psicológica é mais amplo do que a da química. E as pessoas devem se preocupar quando o uso da internet começar a interferir na socialização com outras pessoas. Os resultados são preocupantes. Os jovens estão colhendo frutos do marketing absurdo da web, analisa.

Nas redes sociais, onde a interação entre os usuários é totalmente mediada pela web, há mais relatos de vício. No fórum da comunidade Viciados em Internet Anônimos, no Orkut, a adolescente K. D. assume a mania de se manter conectada. “Já passei mais de 48 horas seguidas no PC. Quase todo fim de semana não durmo para ficar no computador. Deixo de fazer trabalhos e tiro notas ruins. Sei que me faz mal e que eu deveria maneirar, mas não consigo”, lamenta.

A amostra também revela outro hábito de quem não desgruda da vida virtual: a interrupção de atividades, como trabalhos, estudos e lições de casa, para atualizar o perfil em redes sociais, enviar mensagens instantâneas e fazer ligações. A cada 10 minutos, por exemplo, um em cada cinco universitários afirma interromper atividades pelo menos uma vez.

A professora de inglês Natasha Bennett, 29 anos, mantém-se conectada o tempo todo. Seja na sala de aula, consultando aplicativos de tradução; na rua, atualizando as redes sociais e dando check-in onde quer que esteja; ou em casa: a mania de ficar on-line não acaba. Quem reclama é o marido, o profissional em TI Humberto Silva. “A minha mulher acessa o Facebook até na cama”, revela. “Semana passada tivemos uma briga por causa disso”, reconhece Natasha, que descobriu a imensidão de possibilidades da computação nas nuvens há seis meses, quando ganhou o primeiro celular inteligente.

Apesar das inúmeras facilidades possíveis com a internet, como se comunicar em tempo real de graça, manter contato com pessoas distantes e consultar mapas, manter-se conectado o tempo todo pode atrapalhar as relações pessoais, o trabalho e a vida particular dos internautas.

Quando o vício atinge esse nível, é hora de rever o uso da internet e avaliar se o usuário precisa procurar ajuda. Nessas situações, ele pode sofrer de transtorno da internet. A doença é comprovada, mas ainda não reconhecida pelas instituições mundiais de psicologia.

A crescente procura pelo tratamento reflete a quantidade de hospitais e universidades que oferecem ajuda — a maioria, no Rio de Janeiro e em São Paulo. A Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, o Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, o Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática da PUC-SP, o Instituto Psicoinfo e o grupo de ajuda Jogadores Anônimos são algumas opções. As informações foram publicadas no “Correio Braziliense” e no “CorreioWeb”.