Por falar em amor

    (*) Marli Gonçalves –

    Amor que mata e morre. Amor que morre e mata. Um perigo esse negocinho, quando a gente tem, quando a gente não tem. De qualquer forma sempre saímos picadinhos dele, pensa bem. Arrastamos nossas malas para fora da vida de alguém.

    Estou muito preocupada com essa moça que acaba de estragar toda a sua vida por ter matado, e bem matado, o homem que devia amar. Se ela não está mentindo fez o serviço completo: pediu uma pizza antes, deu um tiro certeiro, botou para secar, cortou e embrulhou. Levou para passear em malas com rodinhas para nem ter que carregar mais esse peso e jogou fora, no mato, esperando certamente que os bichos comessem, e eles não completaram o serviço. Se eu li direito, depois disso ainda foi comprar uma bolsa de boa marca, talvez para disfarçar; talvez para se distrair; talvez para comemorar.

    Não deu bandeira, mas deixou muitas pistas como se quisesse ser descoberta, na simplicidade de pensamento do extermínio que fez de certa forma de sua própria vingança. Esqueceu que um bilionário não pode ficar sumido tantos dias assim. Sempre terá alguém atrás dele; talvez até a(s) amante(s) que estão dizendo seria o motivo descoberto pela esposa. Ou da empresa, para que acabasse de assinar a transferência bilionária da empresa para os americanos.

    Ela ficou quietinha, dias, esperando, e a meu ver se preparando para ser presa.

    Não há muita, ou melhor, não há nenhuma complacência quando mulheres matam, perceba só. Quando é um homem sempre tem alguém a murmurar que deve ter sido para lavar a honra, forte emoção, até o velho “ela provocou isso”. Há dias apenas ouço falar de uma mocinha cruel, que matou um “bom” e ainda mais rico depois da venda de sua empresa, japonês. Ouvi falarem dela, de sua cara de “má”, dos cabelos descuidados, o diabo a quatro. Fizeram com que ela não fosse nada: não é advogada, apenas bacharel; fez enfermagem, atirava bem, e armas eram um hobby, e dos dois, talvez? Usava sacos plásticos de lixo azuis, da mercearia da esquina. Usou uma faca Ginsu, de precisão? Uma faca chinesa que não era, certamente, porque essas quebram até cortando pudim.

    Não ouvi falarem nada do jeito de sonso do marido morto. Não ouvi comentarem que parece que levavam uma vida muito, mas muito espartana, para o padrão financeiro que dispunham – econômico até. Talvez a avareza esteja nesse caso?

    Até agora ninguém contou o outro lado da história – o que ela teria aguentado até explodir e que poderia ser usado como atenuante para um ato tão frio e forte como esse. Ninguém mata e pica por pouco. Não há seguro de 600 mil reais que não pudesse esperar que ela, por exemplo, o envenenasse; ou o jogasse pela janela. O atropelasse sem querer. Ter a ameaça de ser separada da filha pequena, sim; saber que o que não tinha era dado a “outras” ( o moço gostava da “coisa”, parece), tenho dúvidas. Mulheres não são – acreditem – tão susceptíveis assim a esse tipo de traição. Coisa mais séria foi. Certeza.

    Daqui, de longe, me condôo, porque essa história deve ter muitas pontas, todas dignas de um romance. Um amor normal, um casal tranquilo, nessa felicidade média que apenas entedia quem o vive externamente, para efeito de imagem. Quando explode vem com tudo o que é reprimido. Sempre tive horror às coisas aparentemente normais. Ao senso comum.

    Enquanto isso, há semanas, para onde eu olho vejo que pululam corações vermelhos e mensagens doces instando o comércio frenético de um dia inventado aqui no Brasil como o Dia dos Namorados. Na tevê falam até em beijo de língua para vender confecções. Haverá noites promocionais em tudo quanto é canto, e as pessoas farão aquela pose de casal feliz e que torna esse dia um dos mais irritantes do ano. E, dependendo de como você vê o mundo, se está sozinho e não queria, traz em si uma daquelas noites de cortar o pulso ouvindo os dramas cantados pela Adele.

    O amor, em si, despedaça. Tenho vários pedaços meus picados largados ao longo da vida. Devo ter feito fatias de muitos também, que essa verdade sempre tem duas vertentes. Quando a gente sai dele – do tal amor descrito com alguém com jeito de anjo e cara marota atirando flechas – às vezes não carrega nada. Ou tem que esperar secar os rios de lágrimas, mágoas, desaforos e ressentimentos. Nem todos conseguem.

    E quando honra está em jogo, isso pode acabar ficando ainda muito mais difícil.

    Talvez a moça loira que matou, picou e refrigerou só se dê conta do que fez quando esquentar de novo sua cabeça.

    São Paulo, com amor para dar e vender, 2012

    Marli Gonçalves é jornalista – Acaba de tomar um verdadeiro banho de amor. Mas daquele amor vindo de amigos, de leitores, de pessoas que passaram pela minha vida, neste meu meio século e um pouco mais. Centenas de mensagens, lindas, espontâneas, e o que é melhor, descompromissadas. Por falar em saudades, onde anda você…

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