As razões que a razão desconhece

(*) Carlos Brickmann –

O depoimento atribuído a Marcos Valério deveria ser sigiloso, por fazer parte de investigações que estão longe de terminar. Mas vem vazando que é uma beleza! E não é difícil saber quem viola a lei, ao vazá-lo: quem o guarda, com o compromisso de mantê-lo íntegro, e quem se beneficia com o vazamento.

Quem se aproveita do episódio Marcos Valério 2 – a nova versão?

Também não é difícil apurar se alguns fatos são ou não verdadeiros. O depósito que Marcos Valério diz ter feito na conta bancária de Freud Godoy é rastreável. Ou foi feito (e Valério diz a verdade, e Freud Godoy mente) ou não foi feito (e Freud Godoy diz a verdade, e Marcos Valério mente).

Marcos Valério diz ter encontrado um empresário que estaria chantageando o Governo no Hotel Pullman, em São Paulo, por volta de 2003. Só que o hotel foi inaugurado pelo menos quatro anos mais tarde.

Marcos Valério diz que o pecuarista José Carlos Bumlai, empresário de posses, contribuiu para uma caixa especial de gastos ilegais e, para dificultar o rastreamento, buscou um empréstimo de algo como R$ 5 milhões no Banco Schahin. O principal executivo do Banco Schahin negou ter feito esse empréstimo. Os arquivos do banco podem comprovar ou desmentir essa história.

Mas, se as histórias podem ser confirmadas ou desmentidas por documentos, por que não pesquisá-las?

Há várias hipóteses possíveis e uma terrível: a melhor maneira de esconder uma mancha na roupa é cobri-la com uma mancha maior.

Reincidência específica

Há alguns anos, Marcos Valério citou pessoas a quem disse ter dado dinheiro. Foi conciso e preciso: hotel tal, tal hora, tal pessoa. Uma das entregas, veja só, teria sido “num hotel de luxo, de cujo nome não se lembrava”. OK: um hotel de luxo tem gente no saguão, com frequência tem câmeras. O cavalheiro a quem o baixinho careca, conhecidíssimo, teria entregue o dinheiro, tem 1m90 de altura, bem mais de cem quilos de peso, um beiço de dar inveja a caciques botocudos. O dinheiro, que teria sido entregue num saco, no saguão, pesava algo como 50 kg. E, no saguão lotado, ninguém notou nada!

A história fazia parte de uma tentativa de inocentar um político cujo apoio era necessário a um determinado Governo. O alvo da denúncia se livrou, mas o tal político nesse caso nem sequer foi acusado.

Fumaça nos olhos

Há grupos políticos com a ideia fixa de pegar Lula em algum malfeito, algo de que nem ele, com toda sua habilidade, consiga se livrar. Para este pessoal, o caso Rosemary Noronha é o que há de bom: ela é próxima a ele e, acreditam, há provas abundantes de que manipulava a máquina pública. As novas acusações atribuídas a Marcos Valério, que supostamente podem atingir o ex-presidente, podem também dividir os holofotes e diluir as pressões contra ele – especialmente se, na hora da verificação do que de fato ocorreu, caírem no vazio.

Passado, presente, futuro

Do jornalista Josias de Souza (http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/):

“O mensaleiro de ontem é um presidiário de amanhã”

Em defesa de Alckmin

Chovem críticas contra o governador tucano de São Paulo, Geraldo Alckmin, por ter ido com a esposa ao Aeroporto de Guarulhos, no helicóptero do Estado, para buscar o filho, a nora e dois netos. O helicóptero pousou no Pátio Vip, onde Sua Excelência reencontrou Suas Excelencinhas, que assim puderam chegar com mais rapidez e conforto a seu destino em São Paulo.

Não pode haver críticas a um senhor tão extremoso. Vovô Geraldo nem pensava no conforto de seus parentes, mas na segurança deles. Afinal, como governador, ele sabe direitinho o risco de voltar por terra do aeroporto para casa, numa cidade dominada por bandidos e onde os celulares que melhor funcionam estão instalados nos presídios. Onde nem a Polícia tem segurança, que segurança haverá para a população? O Governador Geraldo Alckmin negou até cansar a existência do crime organizado, mas o Vovô Geraldo sabe que ele existe. É melhor proteger-se – usando, claro, dinheiro público. Quem pode criticá-lo?

Top chic

Onde é que o ex-presidente Lula e a presidente Dilma Rousseff se reuniram para botar os assuntos em dia? Em Paris, claro. Num excelente hotel, o Bristol, onde a presidente se hospeda e recebe seus convidados. Longe da imprensa enxerida, nada vazou da conversa.

Mas ficou claro que, quando alguém deixa o poder, perde prestígio. O ministro Aloízio Mercadante e o assessor especial Marco Aurélio Garcia, antes lulistas desde criancinhas, protegeram-se de qualquer possibilidade de encontrar o ex-presidente indo juntos a uma livraria.

Sapopemba, nem pensar

Do prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad, no programa Roda Viva, TV Cultura, sobre o trem-bala: “Você sai de casa na Barra Funda de chinelo e vai tomar sol no Leblon”.

A julgar pelo ritmo de implantação do trem-bala, que até hoje não tem projeto mas tem orçamentos cada vez maiores, Haddad vai sair de casa de chinelo, sim. E bengala. E uma manta para cobrir os joelhos.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.