O presidente Jair Bolsonaro conseguiu adiar a decisão sobre o depoimento que deve prestar à Polícia Federal no âmbito do inquérito que apura suposta interferência no órgão. A investigação foi aberta após o então ministro Sérgio Moro (Justiça) acusar o chefe do Executivo de tentar interferir na PF, com nomeações para postos considerados estratégicos no escopo da corporação.
Após o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinar que Bolsonaro prestasse depoimento presencialmente, a PF intimou o presidente e disponibilizou três datas para a oitiva – 21, 22 e 23 de setembro.
Diante do recurso apresentado pela Advocacia-Geral da União, caso foi distribuído ao ministro Marco Aurélio Mello, uma vez que o decano da Corte está de licença médica e em novembro próximo se aposentará de forma compulsória.
No recurso, o advogado-geral da União, José Levi, requereu que a Bolsonaro fosse concedido o mesmo tratamento a que teve direito o então presidente Michel Temer por ocasião do caso envolvendo a JBS. À época, os ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Edson Fachin permitiram que Temer depusesse por escrito. No documento, Levi solicitou que o caso fosse analisado pelo ministro Marco Aurélio, o segundo mais antigo da Corte.
Ao determinar o depoimento presencial, o ministro Celso de Mello afirmou que a Lei Orgânica da Magistratura (LOM) permite que ele decida sobre o caso mesmo estando em licença. A manobra capitaneada pela AGU teve como objetivo procrastinar a decisão sobre o depoimento, uma vez que o ministro Marco Aurélio decidiu submeter o caso ao escrutínio do Plenário do STF. Com essa decisão, Bolsonaro ganha tempo e passa a apostar na possibilidade de o indicado para a vaga de Celso de Mello herde o processo em questão e eventualmente o beneficie.
Em rede social, Bolsonaro se pronunciou a respeito do recurso: “Não se pede nenhum privilégio, mas, sim, tratamento rigorosamente simétrico àquele adotado para os mesmos atos em circunstâncias absolutamente idênticas em precedentes recentes do próprio STF”.
Em 2 de junho, durante entrevista concedida à porta do Palácio da Alvorada, o presidente da República disse que poderia prestar depoimento de forma presencial, “sem problema nenhum”.
“A PF vai me ouvir. Estão decidindo se vai ser presencial ou por escrito. Para mim, tanto faz. O cara, por escrito, eu sei que ele tem uma segurança enorme na resposta, porque ele não vai titubear. Ao vivo, pode titubear. Mas não estou preocupado com isso. Posso conversar presencialmente com a Polícia Federal sem problema nenhum”, disse Bolsonaro.
O que o presidente, por meio da AGU, está a requerer é um privilégio que contraria o disposto no Código de Processo Penal (CPP), artigo 221, parágrafo 1º, que prevê o depoimento por escrito de autoridades, entre as quais o presidente da República, nos casos em que não figurem como investigados.
Na decisão que definiu o depoimento presencial de Bolsonaro, o relator do caso, ministro Celso de Mello, foi claro: “O senhor presidente da República –que, nesta causa, possui a condição de investigado– deverá ser inquirido sem a prerrogativa que o art. 221, § 1º, do CPP confere, com exclusividade, apenas aos chefes dos Poderes da República, quando forem arrolados como testemunhas e/ou como vítimas”.
Reza a Constituição Federal em seu artigo 5º (caput) que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, mas como escreveu o britânico George Orwell na obra satírica “Revolução dos Bichos”, também conhecida como “Triunfo dos Porcos”, “todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que outros”.
Ao ser empossado na Presidência da República, Jair Bolsonaro assumiu o compromisso de respeitar o conjunto legal vigente no País, assim como fizeram todos seus antecessores, mas a depender da necessidade do dono da caneta a promessa vai pelos ares. Quando um presidente ignora a lei por mera conveniência, não se pode falar em futuro melhor para os cidadãos.
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