Companhia chata, comida ruim

(*) Carlos Brickmann

Estranho jantar, esse de Bolsonaro com bilionários. Bilionários? Da lista da Forbes, havia cinco – entre eles, claro, não estava o anfitrião, Washington Cinel, empresário de segurança patrimonial. Mora numa esplêndida casa, que foi de Antônio Ermírio de Moraes e fica em frente à casa de Paulo Maluf. É rico, mas longe de ser bilionário. A propósito, Cinel anunciava para este fim de semana grande número de demissões em sua empresa. Conforme apurou a revista Época, estes empresários de primeiro time devem uns R$ 200 milhões em impostos federais e Previdência.

Havia coisas esquisitas no jantar. Por exemplo, juntos, lá estavam Paulo Guedes e Roberto Campos – sendo que Campos é apontado como Plano B no caso de Guedes sair do cargo. Pìor, no meio da aglomeração, Campos fez o possível para ficar sem máscara.

Havia mais ministros do que bilionários; mais, o presidente levou seu filho Eduardo “Bananinha” Bolsonaro. E, dos sete ministros, deve ser descontado Roberto Campos, que não é ministro. Quanto à comida – quando conheci Washington Cinel, ele comia bem, sem frescuras. Mas, quando o pessoal enrica, muda a comida: certa vez, na casa de um empresário de porte, contrataram uma discípula de Ferran Adriá, o cozinheiro espanhol; e ela precisava explicar prato por prato. Por exemplo, uma desconstrução de ouriço. Na saída, todos com fome, o empresário que foi homenageado nos levou ao McDonald’s.

Não é do que gosto, mas que fazer?

Não foi bem assim

Havia alguns bilionários – mas faltou, por exemplo, o trio da AB-Inbev, Jorge Paulo Leman, hoje o homem mais rico do Brasil, Marcel Telles, Carlos Alberto Sicupira. Itaú, Moreira Salles? Não. Faltou gente. E com um detalhe: Luiza Trajano trabalha para auxiliar o Governo na busca por vacinas e na correção de falhas de infraestrutura. Abram Szajman, da Federação do Comércio, altamente representativo, não estava lá. Quem estava aproveitou a chance para, digamos, aproximar-se de Roberto Campos – quem sabe ele não acaba ocupando o lugar de Paulo Guedes, mais dia, menos dia?

Quem?

O mais tranquilo dos ministros foi o novo chanceler, Carlos França. Como ninguém o conhecia, pôde circular tranquilo, sem responder a perguntas.

A caminho de ser ex

Um dos ministros, ao menos, corre o risco de perder o cargo, acusado por países estrangeiros de nada fazer em prol do meio ambiente: Ricardo Salles. Até agora ele tem se mostrado especialmente resistente. Mas a última briga ambiental pode criar-lhe problemas: o Ibama apreendeu vinte mil toras de madeira ilegalmente abatidas, e Salles, procurado pelos acusados, até agora vem lhes dando razão – e batendo de frente com o Ibama. É uma atitude que agrada a Bolsonaro, mas pode levar a represálias às exportações do Brasil.

Lembranças

O ministro Luís Barroso usou um argumento forte para determinar que o Senado instale a CPI da Covid: todos os requisitos exigidos para a CPI já foram cumpridos, e a instalação não se fazia apenas porque o presidente da Casa não tomou a iniciativa de iniciá-la. É verdade: mas a CPI da Lava Toga, para investigar o comportamento de ministros do STF, está no mesmo caso – todos os requisitos exigidos foram cumpridos. Até agora ninguém mandou instalá-la. Talvez falte só algum parlamentar que cobre do STF a decisão.

Investigando o massacre

O fato é que, além de estar tudo equacionado para a implantação da CPI, há algo que não pode ser esquecido: os 350 mil mortos, enquanto Bolsonaro falava de gripezinha, conversinha de segunda onda, excesso de mimimi. Foi gente demais que já morreu. E as piadinhas de Bolsonaro com a morte dos outros definitivamente não podem ser toleradas, nem tratadas como humor.

CPI, sim ou não

Que é que se espera de uma CPI? Talvez não muito: o Governo tem apoio do Centrão e esse apoio é suficiente para evitar que as investigações atinjam o presidente. Mas tudo pode acontecer- especialmente se lembrarmos que ninguém compra o Centrão – no máximo, o aluga. Uma CPI pode despertar em parte do Centrão a vontade de cobrar mais caro e, se suas reivindicações não forem aceitas, podem se irritar. O Centrão apoiava Dilma Rousseff até que deixou de apoiá-la. Ela caiu.

Os limites de cada um

Uma dúvida sobre a CPI da Covid: até onde vai o limite da investigação? Esquecer de comprar vacinas, esquecer que vacina exige seringa e agulha, esquecer que nenhum dos produtores de imunizantes conseguiria produzir doses suficientes é uma coisa; furar o teto das despesas é outra e pode levar ao impeachment. A luta para ignorar o teto da despesa, como quer o Centrão, fará com que o Governo perca boa parte de sua equipe econômica, já que todos estariam no alvo das investigações, correndo riscos pessoais.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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