UCHO20: Jornalista raro e dos bons, Carlos Brickmann, o mestre, escreve sobre os 20 anos do UCHO.INFO

“Faz tempo, muito tempo. Mas lembro-me do local: o tradicionalíssimo restaurante Gato que Ri, no Largo do Arouche, em São Paulo. Um amigo jornalista há pouco tempo vindo de Brasília, Ruy Nogueira, naquela época já com tendências petistas, bem menos profundas, entretanto, do que hoje. Tema da conversa, o mundo e suas implicações; e, circulando pelo papo inteiro, alguns escândalos que envolviam capital nacional e estrangeiro, banqueiros não-tradicionais, manobras que levavam muito tempo para mostrar-se em sua totalidade. A zona de hoje, enfim; mas não era coisa com que os jornalistas da época estivessem acostumados.

A folhas tantas, o Ruy me conta que um dos melhores repórteres do país, há muito radicado com sucesso nos Estados Unidos, voltaria em breve ao Brasil, e iria dar uma grande mexida nos escândalos da época, que vinha acompanhando desde que tinha resolvido se estabelecer fora do país.

Quem? Ucho Haddad. Quem? Nada mais normal do que não conhecer pessoalmente um repórter, em especial quando vive em outro país, mas não ter sequer, até então, ouvido falar dele?

Nos dias seguintes, o Ruy Nogueira me mandou material do Ucho. Não, eu não poderia conhecê-lo. Ele percorria uma área mais técnica, em que os protagonistas não tinham votos. Sua arma era o dinheiro, muito dinheiro. E ele circulava por essas áreas mostrando conhecimento.

Quando Ucho voltou ao país (sua alternativa era continuar no Exterior, integrando a equipe de um diplomata brasileiro que iria ao Timor Leste), e eu o conheci, ficamos amigos. Várias de suas características me chamaram a atenção: olhava governos, milionários, lobistas, com grande desconfiança, fosse qual fosse sua tendência política ou ideológica; tinha enorme capacidade de arregimentar inimigos e de não ter o menor interesse por eles. Pagou caro por isso: poucas vezes vi gente levar tanta pancada por problemas tão pequenos. Foi acusado de ser anticomunista, antipetista, quando simplesmente encarava governos com desconfiança. Foi acusado de ser contra as privatizações, quando simplesmente tinha reconhecido piratas atuando nos vários lados de cada caso (e como desmascará-los sem uma estrutura de apoio, que incluísse bons advogados?). Foi acusado até de usar nome falso: seu nome não era Ucho, mas Evaldo. Verdade: coisas de criança, creio. Evaldo, Evalducho, Ucho. E daí? João de Barro jamais se chamou João de Barro, Pixinguinha nunca foi Pixinguinha, Gal é Gal de apelido, não de registro.

Bom repórter, inegavelmente. Seu Ucho.info completa agora 20 anos, sem patrocínio, sem lado fixo, sem gentilezas – seu texto é duro, machuca. Com tantos anos, com tantos leitores, Ucho não tem propriedades, não tem nem seguro-saúde. Mas não abre mão da independência.

Parabéns, Ucho! Comemoremos juntos os 40 anos de Ucho.info.

Carlos Brickmann”

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.


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