Mendonça ignora barbáries da ditadura e diz que democracia foi conquistada sem “sangue derramado”

 
Durante as quase nove horas de sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), André Mendonça, ex-advogado-geral da União e ex-ministro da Justiça, tentou se descolar da imagem do presidente Jair Bolsonaro, a quem serviu com estranha subserviência.

Na cerimônia de posse como ministro da Justiça, em abril de 2020, Mendonça afirmou que Bolsonaro “tem sido há 30 anos um profeta no combate à criminalidade” e, ao comandar a pasta, assumia o compromisso de “lutar pelos ideais de uma vida”. “O povo lhe elegeu pra isso, e eu serei um fiel missionário dessa mensagem”, disse Mendonça, dirigindo a palavra ao presidente da República.

Em 25 de junho passado, durante evento na cidade de Chapecó (SC), Bolsonaro declarou que indicaria para o STF “quem toma cerveja” com ele. “Não basta ter um bom currículo, mas tem que falar a minha linguagem”, acrescentou o presidente.

O sabatinado acabou destacando a afinidade com Bolsonaro quando afirmou que a democracia brasileira não foi conquistada com “sangue derramado”. Absurda, a declaração de André Mendonça desconsiderou mortes e tortura de opositores da ditadura militar (1964-1985).

Diante da repercussão negativa de sua fala, Mendonça afirmou ter feito referência às revoluções liberais nos países europeus no século 19. A Comissão Nacional da Verdade (CNV), instituído pelo governo federal em 2012 para apurar crimes cometidos na ditadura, apontou em seu relatório final que os mortos e desaparecidos foram pelo menos 434.

 
Questionado pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) sobre as declarações antidemocráticas do presidente Jair Bolsonaro e da apologia ao AI-5 (Ato Institucional nº 5), Mendonça tentou sair pela tangente, mas não convenceu.

“Eu disse na fala inicial: a democracia é uma conquista da humanidade. Para nós, não, mas, em muitos países, ela foi conquistada com sangue derramado e com vidas perdidas. Não há espaço para retrocesso. E o Supremo Tribunal Federal é o guardião desses direitos humanos e desses direitos fundamentais”, respondeu o indicado ao STF.

O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) contestou a fala de Mendonça sobre não ter ocorrido derramamento de sangue no Brasil para a conquista da democracia.

“Quatrocentos e trinta e quatro mortos, milhares de desaparecidos, 50 mil presos, 20 mil brasileiros torturados, 10 mil atingidos por processos e inquéritos, 8.350 indígenas mortos. O deputado federal Rubens Paiva, quando fez discurso em defesa do presidente João Goulart, teve seu mandato cassado, casa invadida. Foi preso e torturado até morrer. Nossa democracia, senhor André, também foi construída em cima de sangue, mortes e pessoas desaparecidas. É inaceitável negar a história”, rebateu Contarato.

Mais adiante, ao retomar a palavra, André Mendonça se desculpou e disse ter sido mal interpretado, o que não condiz com a verdade. “Primeiro, meu pedido de desculpas, por uma fala que pode ter sido mal interpretada e que não condiz com aquilo que eu penso. Vidas se perderam na luta para a construção da nossa democracia. Além do meu pedido de desculpas, o meu registro do mais profundo respeito e lamento pela perda dessas vidas”, afirmou.

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