A (im) possível queda da globalização

(*) Gisele Leite

O atual cenário da Guerra da Ucrânia demonstra que o Ocidente priorizou a segurança em detrimento do mercado e, assim, nosso país terá dificuldades sinceras em manter cordiais vínculos com os polos opostos em beligerância.

Quando em 2014, a Rússia invadiu a península ucraniana da Crimeia, os líderes ocidentais impuseram ao invasor sanções resultantes de um compromisso para não deixar a anexação inteiramente impune, porém, foram cuidadosos o suficiente para não melindrar os interesses econômicos das nações europeias com ampla relação comerciar com a Rússia, comandada por Vladimir Putin.

E, tal comportamento, fez Putin acreditar que, quando invadisse o restante da Ucrânia, as potências como a Alemanha, tão dependente do gás russo para aquecer casas da população, certamente, se oporiam as medidas econômicas mais incisivamente punitivas.

E, antes mesmo de anunciar a invasão da Ucrânia em 24 de fevereiro do corrente ano, o ex-agente da KGB, ora presidente da Rússia, biscou aumentar sistematicamente a resiliência da economia contra eventual rodada de sanções econômicas do Ocidente.

Tanto que ampliou previamente as reservas internacionais do Banco Central Russo e, ainda selou parceria econômica e estratégica com a China. Após a invasão, restou evidente que Putin, no comando desde 199, cometera um erro de cálculo e gerou um terremoto político no Velho Continente.

Doravante, a maioria da população alemã teme que a Rússia possa mesmo atacar outros países europeus e, até defende o fim das importações de gás russo, com a prorrogação do uso de energia nuclear e a manutenção de usinas remanescentes na Alemanha (atualmente em processo de fechamento).

Enfim, a invasão russa na Ucrânia acionou mecanismo que muitos dos europeus haviam esquecido: quando as questões de segurança nacional entram em pauta, os interesses econômicos restam em segundo lugar.

Mais um pacote de sanções econômicas semelhante ao imposto à Rússia em 2014, os europeus decidiram punir os oligarcas russos e até mesmo o próprio presidente e seu chanceler, que não podem mais acessar seus bens situados na América do Norte e na Europa.

Enfim, a União Europeia realizou opções que até, recentemente, eram consideradas extremas e pouco prováveis. Bloqueou as reservas do Banco Central russo em moedas como dólar, euro e libra esterlina (quantia estimada em mais da metade do total do capital) e, excluiu uma série de bancos russos do sistema interbancário Swift.

E, assim, as armas financeiras de destruição em massa foram acionadas e, pretendem extinguir o conflito armado. A Rússia é punida e isolada, mesmo havendo o risco de um calote generalizado por parte da Rússia. O que impacta severamente a globalização e, com isso, reverbera diversas repercussões no mundo.

Essa inesperada reação do Ocidente demonstra a lógica do sistema internacional das últimas três décadas e, que foram marcados pela ausência de rivalidade rígida entre as grandes potências.

Desta forma, quando a Europa decidiu isolar a Rússia economicamente, priorizou a segurança em detrimento dos interesses econômicos do mercado. Mas, lembremos que não foram poucos os conflitos tais como a invasão norte-americana no Iraque, bem como os numerosos conflitos armados no Oriente Médio e na África que não produziram muito sofrimento humano, crises migratórias e, vieram positivamente reflexos na economia global, mas não frearam a violenta tendência de globalização cada vez mais profunda e catártica.

Enfim, reconheçamos que a beligerância não é restrita à Rússia e Ucrânia, há bem mais que isso. Parece que vivenciamos o retorno a geopolítica de tensões polarizadas, onde é improvável que as razões econômicas não ditem as regras do jogo.

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

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