Estado de Emergência Moral

(*) Gisele Leite

Entre os inúmeros relatos de mulheres(funcionárias) assediadas pelo ex-presidente da Caixa Econômica Federal, o que dói ouvir é a respeito do medo que sentiam. E, ao ver a atriz Klara Castanho tão exposta e condenada em rede social por ter sido estuprada e engravidado, providenciando legalmente a adoção do filho recém-nascido é doloroso.

Parece incrível que em pleno século XXI, dotado das mais sofisticadas tecnologias e métodos científicos, que pessoas adultas e aparentemente saudáveis recorram ao assédio sexual, ao assédio moral e ao estupro para lograr êxito em ter uma vida sexualmente ativa.

O diagnóstico deve ser de masculinidade patológica.

O que faz uma pessoa razoavelmente civilizada, adotar tais práticas criminosas e, ainda supor que pode restar impune? Depois da queda do então Presidente da CEF, em seguidilha, caiu também o Vice-Presidente também reiteradamente acusado de acobertar tais práticas… A imagem da instituição bancária federal literalmente sai maculada, não acredito que nenhum compliance vai consertar.

Com a nova presidente da instituição, Daniella Marques, esperemos que se consiga sanear o ambiente e o comportamento interno da instituição bancária. Tomara que pelo fato de ser mulher e contar com apoio e indicação do Ministro Paulo Guedes, possa finalmente resgatar o nome da empresa desse lodaçal.

É doloroso perceber que a mulher ainda nos dias correntes é vista como objeto, como mercadoria, ou até menos, e seus temores e lutas não diminuíram, apesar do patamar galgado pela civilização humana. Quando será que a cultura machista e misógina terá seu fim?

Quando será que ao olhar uma mulher, iremos identificar um ser humano que merece ter sua dignidade preservada? Quando será que ao enxergar uma mulher, lembraremos que poderia ser sua irmã, sua filha, sua mãe, sua avó e, até uma colega que merece todo respeito e, que está no mercado do trabalho por seus méritos profissionais e não por seu gênero ou funcionalidades sexuais?

São questionamentos dolorosos que o silêncio reinante só faz agravar. O Presidente da República tão íntimo do assediador acusado não mencionou nenhuma sílaba… Talvez porque como já revelou, quando se refere a sua única filha, como uma “fraquejada”? Enfim, tudo é muito traumático.

Em paralelo, o Senado brasileiro aprovou estado de emergência por sessenta e sete votos a um, em dois turnos, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que ampliou programas sociais e criou benefícios tanto para caminhoneiros e taxistas. Conveniente assinalar que apesar da lei eleitoral proibir a criação de benefícios sociais em anos de eleições, a referida PEC contorna tal regra ao reconhecer o estado de emergência.

Assim, toda a despesa será viabilizada e admitida através de créditos extraordinários, que estão de fora do teto de gastos. Para os ministros do TSE o referido estado de emergência é mero expediente burlando a legislação, portanto, o desvio de finalidade é violador da lei, além de ferir de morte princípios constitucionais.

O estado de emergência viabilizou o uso da máquina pública de forma abusiva. A aprovação da referida PEC de forma célere em dois turnos, no mesmo dia, sem passar pelas comissões, demonstra que o Legislativo pátrio rompeu o compromisso com a seriedade e legalidade tão necessárias ao Estado Democrático de Direito.

Acredito que a referida PEC aprovada com celeridade ímpar também decretasse o estado de emergência moral…

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

As informações e opiniões contidas no texto são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo obrigatoriamente o pensamento e a linha editorial deste site de notícias.


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