Em 22 de abril de 2020, durante a fatídica reunião ministerial que culminou com o pedido de demissão de Sérgio Moro, então ministro da Justiça, o presidente Jair Bolsonaro, disse, em meio a um festival de palavrões, que de alguma maneira interferiria na Polícia Federal (PF) porque não poderia ser surpreendido com notícias sobre investigações e ações policiais contra familiares e amigos mais próximos.
“Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meus, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”, disse Bolsonaro
Moro não aceitou a tentativa de interferência na PF e saiu atirando contra o governo e o chefe do Executivo, não economizando, nos meses subsequentes, adjetivos contundentes para referir-se a Bolsonaro, de quem tornou-se aliado recentemente.
O grotesco episódio envolvendo o ex-deputado federal Roberto Jefferson, no domingo (23), com direito a tiros de fuzil e lançamento de granadas contra os policiais federais que foram à cidade de Comendador Levy Gasparian, no interior fluminense, para cumprir mandado de prisão expedido pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), provou que Bolsonaro interfere criminosamente na PF.
Depois do ataque aos policiais, Bolsonaro divulgou vídeo nas redes sociais afirmando que havia determinado ao ministro da Justiça, Anderson Torres, que fosse ao local do evento para tentar uma solução negociada. Informado de que qualquer tentativa de impedir o cumprimento do mandado de prisão caracterizaria prevaricação, Torres preferiu conversar com o ex-deputado pelo telefone.
Na parte interna da residência de Roberto Jefferson estava um policial federal que, durante conversa com o ex-deputado, gravada em vídeo, diz: “O que o senhor precisar a gente vai fazer.”
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Jefferson feriu a agente Karina Miranda e o delegado da federal Marcelo Vilela. Uma viatura da Polícia Federal teve o vidro da frente atingido por tiros de fuzil, mas por sorte não havia qualquer pessoa no veículo.
A conversa foi presenciada pelo ex-candidato à Presidência pelo PTB, o autodenominado padre Kelmon, que estava ao lado de Roberto Jefferson, que já presidiu a legenda.
No vídeo, Roberto Jefferson diz que, no momento do ataque, tinha um fuzil nas mãos. O policial diz ao ex-parlamentar que “os meninos estão bem, no hospital”, ao se referir aos colegas feridos pelo ex-deputado. “Foi um machucado, foi tranquilo”, tranquiliza o policial.
De acordo com Roberto Jefferson, um integrante da equipe da PF que deveria prendê-lo ficou três vezes na mira de seu fuzil. “Não atirei neles”, disse. Sorrindo, o policial responde: “Agradeço.”
Os mais radicais apoiadores de Bolsonaro insistem em afirmar que a relação do presidente com Roberto Jefferson já não é a mesma de antes, mas causa espécie o fato de o chefe do Executivo ter determinado ao ministro da Justiça que fosse ao local do entrevero para dar guarida a um cidadão que sequer tem foro privilegiado.
Em suma, a ligação entre Bolsonaro e Jefferson é a mesma de sempre e a ópera bufa dominical foi “missa encomendada”. O resultado não fugiu ao roteiro e o “tiro saiu pela culatra”, principalmente porque o presidente referiu-se a Jefferson como “bandido”, enquanto o policial federal se colocava à disposição de alguém acusado de quádrupla tentativa de homicídio.
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