Na primeira investida contra o Supremo Tribunal Federal (STF) na segunda fase de sua campanha à reeleição, Jair Bolsonaro ameaçou aumentar o número de ministros da Corte com o intuito de controlar a mais alta instância do Judiciário nacional. Absurda e inconstitucional, a proposta ganha adeptos no Congresso Nacional.
A radicalização chegou a esse ponto porque o STF não teve pulso firme para barrar medidas eleitoreiras adotadas por Bolsonaro, como, por exemplo, a PEC Kamikaze, que à porta das eleições turbinou o valor do Auxílio Brasil e criou outros benefícios pontuais, e a redução do ICMS incidente sobre os combustíveis. Ambas as medidas são inconstitucionais e atropelam a legislação eleitoral.
O STF, que deveria ter se posicionado com firmeza e amparado na legislação vigente, preferiu fechar os olhos para o absurdo sob a alegação de evitar uma crise social ainda maior. Bolsonaro teve longos meses para se preocupar com os mais vulneráveis, mas em inequívoca caça aos votos optou por agir fora da lei. Na esteira desse cenário, o Supremo deu a entender que concordava com o escárnio bolsonarista.
Quando um Poder constituído é impedido de exercer suas funções por conta de medidas ilegais adotadas por um terceiro, a democracia já foi pelos ares. Gostem ou não os ministros do STF, o recuo diante das duas citadas medidas foi marcado pela irresponsabilidade judicial. Não se trata de ignorar a crise social existente no País, mas de exigir o cumprimento da lei em sua inteireza, sem justificativas. Afinal, a partir de janeiro, com o fim do Auxílio Brasil majorado, o caos voltará à cena sem cerimônia e com a mesma força de antes.
No momento em que o STF sinalizou que não contestaria as medidas por razões sociais, Bolsonaro aproveitou o momento para impulsionar sua campanha. Alguns especialistas defenderam a tese de que barrar ambas as medidas seria dar combustível extra ao presidente da República em seu projeto de reeleição.
Ao Supremo não cabe decidir com base em situações cuja responsabilidade é de outros Poderes. É dever do Executivo buscar soluções para enfrentar a crise social com a qual convive o País, sem recorrer a manobras espúrias, como a decretação de emergência a poucos meses das eleições. É dever do STF o estrito cumprimento da lei, sob pena de alguns precedentes criarem um entendimento distorcido da legislação vigente.
Levar adiante a proposta de aumentar o número de ministros do Supremo é tarefa difícil, mas não impossível, principalmente porque o perfil do Congresso a partir de 2023 permite a Bolsonaro fomentar seus devaneios autoritários.
Considerando a possibilidade de a pretendida mudança no STF não prosperar, a mais alta instância do Judiciário será alvo fácil dos rompantes antidemocráticos de muitos apoiadores do presidente da República, caso conquiste a vitória nas urnas do segundo turno.
Juízes que são, os ministros do STF, em sua maioria, abusam da exposição na mídia, quando deveriam se pronunciar apenas nos autos. Explicações em demasia a cada decisão tomada só desgasta a imagem de um tribunal que, em tese, deveria se ater apenas a questões constitucionais. O problema maior é que no momento em que o Executivo ignora solenemente a Constituição, cabe ao Supremo, quando provocado, fazer cumprir a lei.
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