(*) Ucho Haddad –
Muitos são aqueles que acreditam ser difícil para um corintiano cinquentão fazer críticas ao clube do coração. No meu caso, criticar o alvinegro paulistano é uma questão de coerência, algo que procuro preservar ao máximo, pois só assim a vida ganha sentido.
Cá não estou para pegar carona na derrota do Corinthians para o colombiano Tolima e desancar a equipe e seus dirigentes. Se mais uma vez teço críticas a um dos mais populares clubes de futebol do País, é porque consegui enxergar com a devida clareza a tênue linha que separa a paixão da razão, e vice-versa.
Para que esta minha incursão não seja interpretada como oportunismo barato, volto no tempo para resgatar uma rápida conversa que tive com Andrés Sanchez, presidente do Corinthians, em dezembro de 2007. No lobby de um hotel em Porto Alegre, Sanchez tentava aliviar a tensão que precedeu a partida contra o Grêmio, no Estádio Olímpico. Aquele duelo dava ao Corinthians a ínfima e remota possibilidade de permanecer na elite do futebol brasileiro.
Naquele sábado à noite, 1º de dezembro, sem que ao menos tivesse movimentado os olhos como sinal de indignação, Andrés Sanchez ouviu a minha franca e transparente opinião. Disse ao comandante alvinegro que o melhor para ele e para o clube seria o rebaixamento, pois só assim seria possível reedificar uma equipe com tantas “tradições e glórias mil”, como entoa o hino do clube. Fora isso, as compensações financeiras também seriam outras, pois no ano seguinte o Corinthians seria, como de fato foi, o único clube de ponta a disputar a Série B.
De volta à principal divisão do futebol brasileiro, o Corinthians tirou do armário o velho salto alto. O tempo passou e, mais uma vez, o popular Coringão foi dragado pela soberba que de norte a sul emoldura a cartolagem tupiniquim. A contratação de Ronaldo Nazário foi o tucho de pluma que faltava para fazer duo com os irresponsáveis paetês alvinegros.
A chegada de Ronaldo colocou o Corinthians nas principais manchetes esportivas, mas uma equipe de futebol não vive apenas de notícias, assim como não sobrevive a sua torcida. É preciso bola no pé e na rede. Do contrário, o paraíso sob medida transforma-se em inferno inesperado. É preciso reconhecer que Ronaldo viabilizou o ingresso de muito dinheiro nos cofres do Parque São Jorge, mas querer que um atleta com mais de 30 anos e um histórico de lesões complexas corra pelos gramados como um garoto de 20 é admitir a própria idiotice. Ronaldo foi uma bem esculpida ação de marketing, assim como é a estada de Ronaldinho Gaúcho no Flamengo. Quem quiser ver futebol que exija a presença da molecada em campo. Até porque, o Brasil continua reconhecido como um celeiro de talentos futebolísticos.
Quando, recentemente, o Corinthians conquistou a chance de disputar uma vaga na Copa Libertadores da América, confesso que em nenhum momento acreditei na possibilidade de triunfo. Amigos, torcedores fanáticos, questionaram-me sobre essa frieza com que encaro o time que escolhi como sendo o do coração. Ora, diante de fatos não há argumentos. Essa é uma máxima do Direito, mas facilmente aplicável a qualquer capítulo do cotidiano. E não seria diferente com o futebol e o clube da minha predileção.
Sem nenhuma grande contratação para a atual temporada, o Corinthians, nas primeiras partidas do Campeonato Paulista, deu mostras do que poderia ocorrer no certame continental. Participar de uma competição como a Libertadores exige planejamento antecipado. Dependo do nível dos adversários – a maioria é bem a cima da média – é preciso colocar à disposição do técnico uma equipe específica para o torneio. Quem pensou que o Corinthians poderia seguir adiante com o futebol que apresentou diante do Tolima, no Pacaembu e na Colômbia, é porque pouco ou nada entende sobre o esporte bretão. O joguinho desanimador do Corinthians não faz frente nem mesmo ao mais chulo time da várzea paulistana.
Há muito que o futebol deixou ser esporte para virar negócio. E em qualquer negócio o sucesso e o lucro, financeiro ou não, demandam tempo. Em 2010, o Corinthians passou em brancas nuvens, mas a diretoria do clube, que não entendeu o recado, decidiu manter a responsabilidade turbinada pelo centenário no dorso de Ronaldo Nazário. Ora, esse tipo de atitude mostra o amadorismo como o futebol ainda é encarado no Parque São Jorge. O camisa 9 do alvinegro é um capítulo importante e vivo da história do futebol mundial, com diversas premiações no currículo, mas nos dias atuais sua especialidade é marcar gols fora das quatro linhas. Ou seja, Ronaldo é, sim, uma dourada e eficiente cornucópia. E tem provado isso com a destreza de um craque.
Por outro lado, de nada adianta distribuir títulos pomposos aos diretores e deles exigir o balbuciar de palavras difíceis como forma de impressionar a mídia e os torcedores. A verdade, assim como a justiça, tarda, mas não falha. No momento em que o Corinthians é ejetado da Libertadores, os engalanados cartolas permitem que os nomes do competente Tite, o técnico, e Ronaldo caiam na vala da maledicência popular, com direito a pichações nos muros próximos à sede do clube. Covarde, a cartolagem do Timão se apequena para não ser banida do status quo.
Ser eliminado da Copa Libertadores da América pelo colombiano Tolima pode ter sido uma excelente sinalização para os dirigentes do Corinthians, que desde meados de 2010 têm frequentado o noticiário por conta de polêmicas interclubes e sandices disparadas para bajular o presidente da CBF, o sempre nefasto Ricardo Teixeira.
Nesta quinta-feira (3), o “day after” da derrota para o Tolima, rompi o dia longe da ressaca desportiva, livre daquele gosto amargo da derrota. Despertei com a alma leve e a consciência intacta. Pronto para encarar aqueles que comemoraram a eliminação do Corinthians como a conquista da Copa do Mundo, algo que também pouco me anima. Deixo claro que não torci pela derrota e eliminação do Corinthians, pois trata-se de mais um aperreio do meu clube do coração, mas não poderia fazer figas para que a irresponsabilidade dos dirigentes alvinegros fosse contemplada com coroa de louros.
De tal modo, aqui deixo uma mensagem ao comandante Andrés Sanchez. Presidente, sair da Libertadores pode não ser o melhor negócio, mas com certeza é o mais importante dos recados.