Penas mais duras não são respostas para a criminalidade

(*) Luiz Flávio Borges D´Urso –

O endurecimento das punições a criminosos, apesar de ter sido sugerido por uma enxurrada de manifestações de pessoas que já não toleram a impunidade à comissão de juristas escalada pelo Senado para reformar o Código Penal, está longe de ser a solução para a criminalidade que assola o Brasil.

Das mais de 2.500 sugestões encaminhadas à comissão, presidida pelo ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça, cerca de 90% delas, pediam punições mais duras para os criminosos. Houve quem sugerisse que a pena máxima de prisão, hoje de 30 anos, passasse a 40 ou 50 anos.

Felizmente, porém, a tendência é manter o período máximo de 30 anos de pena privativa de liberdade no anteprojeto de lei, que deverá ser entregue no dia 25 de maio ao Congresso Nacional. O objetivo é substituir o Código Penal atual, que já tem 72 anos e é uma verdadeira colcha de retalhos.

A população, de forma geral, acredita que o endurecimento das penas pode solucionar o problema crescente da criminalidade, quando na verdade isso depende da atuação conjunta das autoridades públicas que atuam na segurança pública. O crime se expande porque o sistema penal não se impõe, restando a sensação de impunidade certa.

De que adianta termos penas altas se não houver estrutura da polícia para coibir ou investigar crimes, do Ministério Público para denunciá-los, da Justiça para julgá-los de forma justa e célere, e de modo que todos esses personagens da administração da lei possam atuar com independência, agilidade e sem medo de represálias?

Contudo, os membros da comissão que formula o novo Código Penal preparam um texto mais extenso, mas sem aumentar as penas – e sim buscando uma tutela mais equilibrada dos bens jurídicos, com mais proporcionalidade entre as sanções aos diversos tipos penais.

Atualmente, nossa legislação carece de uma melhor hierarquia na tutela desses bens jurídicos. Um exemplo é a punição para crime de falsificação de produto de limpeza ou remédios, de dez anos de prisão, enquanto a punição mínima para homicídio é de seis anos. A lei, de forma estapafúrdia, valoriza mais um produto do que uma vida humana!

Agora, a intenção é tornar o Código Penal o centro do sistema penal brasileiro, que hoje já teve aprovadas 140 leis especiais ou extraordinárias na área, várias delas modificando o código atual. Essa imensa desordem contribui para debilitar a credibilidade do direito penal e da Justiça brasileira, deixando a população ainda mais insatisfeita com a criminalidade.

É preciso buscar a proporcionalidade na aplicação das penas, e não seu endurecimento, porque prisão também não é remédio para a criminalidade. As condições indignas da vida em muitas prisões, assim como o isolamento da sociedade, em nada contribuem para desestimular os apenados a cometerem crimes. Pelo contrário, já estamos cansados de saber que as prisões funcionam em boa parte das vezes como escolas do crime.

O anteprojeto do novo Código Penal segue um caminho polêmico, mas que acreditamos ser o melhor. Isso sem falar em propostas como a criminalização das violações das prerrogativas profissionais advocatícias, sugerida pela OAB, acolhendo ainda as leis dos crimes ambientais, de lavagem de dinheiro, a de organizações criminosas, de abuso de poder, as de crimes de trânsito e do aborto.

(*) Luiz Flávio Borges D´Urso, advogado criminalista, mestre e doutor em direito penal pela USP, professor “honoris causa” da FMU, é presidente licenciado da OAB SP (www.durso.com.br).