Após escândalo do medicamento L-asparaginase, líder do governo não tem moral para “enquadrar” a Anvisa

 
Líder do governo na Câmara dos Deputados e ex-ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP-PR) afirmou que pressionará politicamente a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e disse estar decidido a “enquadrar” a diretoria do órgão regulador para que exigências no campo da aprovação de vacinas contra Covid-19 sejam eliminadas.

A afirmação foi dada ao jornal “O Estado de S. Paulo” e, segundo o parlamentar, o intuito dessa patacoada é agilizar o processo de autorização para uso emergencial dos imunizantes. Na quarta-feira (3), a Anvisa retirou a exigência da fase 3 de testes clínicos para a aprovação em caráter emergencial das vacinas.

O líder governista, cuja trajetória política dispensa maiores apresentações, afirmou que os diretores da Anvisa estão “fora da casinha” e “nem aí” para a pandemia do novo coronavírus.

“Estou trabalhando. Eu opero com formação de maioria. O que eu apresentar para enquadrar a Anvisa passa aqui (na Câmara) feito um rojão”, avisou Barros. “Eu vou tomar providências, vou agir contra a falta de percepção da Anvisa sobre o momento de emergência que nós vivemos. O problema não está na Saúde, está na Anvisa. Nós vamos enquadrar.”

“Eles tiraram a fase 3 e colocaram um monte de exigências. Eles não entenderam ainda. Estão fora da casinha, não sabem que estamos numa pandemia, que precisamos de coisas urgentes, que precisamos facilitar a vida das pessoas. É só exigência. Não é possível que tenha 11 vacinas aprovadas em agências no mundo inteiro e nós só temos duas, e eles não estão nem aí com o problema”, afirmou Barros. “A Anvisa precisa estabelecer normas compatíveis com a emergência. Normas de segurança, eficácia e agilidade. Ela está só na segurança e na eficácia e agilidade nenhuma, zero. Nem aí com o problema. Cada dia inventam mais exigência. Hoje mesmo tiraram a fase três e colocaram mais dez gravetos no lugar. Querem enganar quem? Estão achando que sou trouxa?”

Quem conhece com certa proximidade a atuação política de Ricardo Barros sabe que o deputado paranaense não é “trouxa”, pelo contrário, mas não significa que seja uma ode à moralidade.

 
As declarações de Barros caíram como “bomba” na Anvisa e o presidente da agência, Antônio Barra Torres, reagiu ao ataque irresponsável. “Que enquadramento é esse que o deputado se refere? Ele está no dever de formalizar uma denúncia no canal competente ou se retratar. Acho que para ele não tem mais outra saída: Ou ele denuncia ou se retrata”, retrucou Barra torres.

Há alguns pontos a serem considerados nesse episódio. Ricardo Barros não agiu de livre e espontânea vontade, mas orientado pelo Palácio do Planalto, pois nos bastidores o governo pressiona a Anvisa para agilizar a aprovação de vacinas. Bolsonaro, que até recentemente negava a pandemia e demonizava as vacinas, acionou Barros para que a pressão sobre a Anvisa se tornasse pública.

Com essa investida sórdida e rasteira, o presidente da República tenta colocar a população contra a agência, que vem agindo em conformidade com a ciência e os critérios técnicos. Faz-se necessário ressaltar que Bolsonaro afirmou, não faz muito tempo, que o brasileiro não poderia ser cobaia de laboratórios farmacêuticos, não sem antes dizer que vacinas podem transformar o cidadão em jacaré.

As rusgas de Ricardo Barros com a Anvisa remontam à época em que o líder governista foi ministro da Saúde e tentou aprovar a fórceps o uso do medicamento L-asparaginase, utilizado no tratamento de Leucemia Linfoblástica Aguda (LLA). Barros atuou para que a Anvisa liberasse o uso do medicamento fabricado por um laboratório paraguaio que não tem sede no Paraguai, que comprava o produto de uma empresa chinesa e funcionava (sic) no Brasil em escritório de contabilidade localizado na Grande São Paulo.

O UCHO.INFO denunciou com exclusividade o escândalo em 18 de janeiro de 2017, levando o então ministro Ricardo Barros (Saúde) a disparar, intramuros, ataques a este portal e a seu editor. A dona do escritório de contabilidade, onde em tese funcionava a representação do laboratório paraguaio, chegou a fazer ameaças ao jornalista responsável por este site de notícias. Confira abaixo a série de matérias sobre o escândalo envolvendo Ricardo Barros e o laboratório paraguaio.

Quando o UCHO.INFO afirma que Jair Bolsonaro é o que se conhece como “mais do mesmo”, não se trata de implicância ou divergência ideológica, mas de postura coerente e responsável de um veículo de imprensa que conhece não apenas a trajetória polícia do presidente da República, mas também a do deputado Ricardo Barros. Um governo que tem Bolsonaro na Presidência e Barros como líder não tem como dar certo.

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