Bolsonaro diz que não há corrupção no governo, mas pastores do MEC pediram propina escondida em pneu

 
Candidato à reeleição, o presidente Jair Bolsonaro até recentemente insistia em afirmar que no seu governo não havia corrupção. Na sequência, o chefe do Executivo mudou o discurso e passou a dizer que no governo não há corrupção sistêmica. Entre o que Bolsonaro alega e a realidade dos fatos existe uma distância enorme, ou seja, a corrupção corre solta nos subterrâneos do governo.

Um dos escândalos de corrupção que caiu no esquecimento por causa dos desvarios autoritaristas de Bolsonaro, o do gabinete dos pastores do Ministério da Educação, está de volta ao noticiário nacional.

Matéria do jornal “O Estado de S. Paulo”, publicada nesta quinta-feira (22), revela que o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, autorizou que contratos de obras de escolas fossem negociados em troca de reformas de igrejas dos pastores Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura. A informação foi dada ao Estadão pelo empresário do setor da construção civil Ailson Souto da Trindade, candidato a deputado estadual pelo Progressista no Pará.

De acordo com Trindade, a propina deveria ser entregue em dinheiro vivo para ser escondida no pneu de uma caminhonete que levaria os valores de Belém (PA) até Goiânia (GO), onde está a sede da igreja dos pastores Gilmar e Arilton.

A denúncia traz novos elementos para o inquérito que tramita sob sigilo no Supremo Tribunal Federal (STF) por suposta interferência de Jair Bolsonaro (PL) na investigação contra o ex-ministro da Educação. Além disso, Milton Ribeiro disse durante reunião no ministério que atendia às demandas dos pastores a pedido de Bolsonaro.

Prefeitos que tentaram liberar recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) afirmaram que os pastores cobravam propina em dinheiro, em barras de ouro e por meio da compra de bíblias.

O empresário Ailson Souto da Trindade é a décima segunda pessoa a relatar esquema de corrupção na pasta. Em entrevista ao Estadão, o empresário afirmou ter ouvido do então ministro, no MEC, em 13 de janeiro de 2021, que obras públicas estariam garantidas a ele.

 
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Trindade destacou na entrevista que o então ministro da Educação teria dito que ele precisaria em troca “ajudar” a igreja dos pastores. O acerto, segundo Trindade, foi proposto na sequência pelo pastor Gilmar: repasse de R$ 5 milhões em dinheiro vivo.

“Funcionou assim: o ministro fez uma reunião com todos os prefeitos (no prédio do MEC, dia 13 de janeiro de 2021). Depois houve o coquetel, num andar mais acima. Lá, a gente conversou, teve essa conversa com o ministro. Eu não sabia nem quem era o ministro. Ele se apresentou: ‘Eu sou Milton, o ministro da Educação, e o Gilmar já me passou o que ele propôs para você e eu preciso colocar a tua empresa para ganhar licitações, para facilitar as licitações. Em troca você ajuda a igreja. O pastor Gilmar vai conversar com você em relação a tudo isso’”, relatou o empresário.

A propina seria camuflada por meio de um contrato fictício entre a igreja de Gilmar e a empresa de Trindade. “Eles falaram: ‘existe uma proposta para tu fazer isso (as obras)’. Aí eu disse: ‘que proposta?’. ‘Bom, a gente está precisando reformar umas igrejas e estamos precisando também construir alguns templos, no Maranhão, no Pará, e também outros lugares. Então estamos precisando de R$ 100 milhões para fazer isso’. Aí eu falei: ‘mas o que que eu vou ganhar em troca? Como é que vai acontecer? A igreja vai contratar minha empresa?’ ‘Não, a gente faz um contrato, entendeu? Faz o contrato com a empresa, a igreja contrata a tua empresa e eu consigo articular para tua empresa fazer as obras do governo federal’”, teria dito Ailton.

Como afirmou o UCHO.INFO em matérias anteriores, causa espécie o fato de Milton Ribeiro ter contratado o criminalista Daniel Bialski para defendê-lo. Coincidência ou não, Bialski, que se especializou em defender traficantes e policiais corruptos, representou Michelle Bolsonaro no caso em que a primeira-dama foi alvo de ataques nas redes sociais.

Após ser alvo de um ataque a faca na cidade mineira de Juiz de Fora, em 6 de setembro de 2018, Jair Bolsonaro quis saber quem custeava a defesa do seu agressor, Adélio Bispo. Repetindo o que já afirmamos, Milton Ribeiro precisa explicar como consegue custear os serviços do criminalista.

Em relação aos outros pastores envolvidos no esquema – são aproximadamente dez –, por ocasião de tentativa de contratação de um defensor foi oferecida uma quantia irrisória, se considerada a gravidade do caso, além de cargos nos ministérios da Educação e da Economia. A “operação abafa” deflagrada pelo Palácio do Planalto evitou uma delação premiada. Afinal, Milton Ribeiro e os “pastores-propineiros” cogitaram a possibilidade de soltar a voz.


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